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As criaturas de Prometeu

Todos nós somos criaturas de Deus, tal como nos foi revelado por Jesus Cristo. Mas a mitologia sempre foi fonte inspiradora da arte e nessa medida tem o seu interesse. Numa viagem de automóvel em que me dirigia a um encontro com empresários, passava na Antena 2 a obra de Beethoven “As criaturas de Prometeu”, baseada no mito grego de Prometeu, o rebelde que roubou o fogo a Zeus para o entregar à humanidade e a libertar da ignorância, abrindo-lhe as portas da ciência e da arte. A narrativa era cara ao compositor, conhecido apoiante dos ideais iluministas. A mesma lenda serviu a Liszt para um dos seus poemas sinfónicos, explorando magistralmente as emoções associadas à coragem do protagonista e à crueza do seu destino, ao contrário do compositor alemão Richard Wagner” ao criar a história do “anel de Nibelungo”, fundindo elementos de diversas histórias das mitologias germânica e escandinava, retratando outro tipo de sede: a do poder desmesurado, gerando toda a magnífica saga que termina com a ópera O Crepúsculo dos Deuses.

O mito de Prometeu apareceu na Teogonia, obra do poeta épico grego do fim do século VIII a.C., Hesíodo, como um defensor da humanidade, conhecido pela sua astuta inteligência, responsável por roubar o fogo de Héstia e dá-lo aos mortais. Zeus, que temia que os mortais ficassem tão poderosos quanto os próprios deuses, puniu-o deixando-o amarrado a uma rocha por toda a eternidade, enquanto uma grande águia comia todos os dias o seu fígado — que se regenerava no dia seguinte, até que o herói grego Héracles / Hércules romano o libertou dos seus grilhões.

Tenho muito admiração pelos empresários. Não são Prometeu, nem semi-deuses, mas sempre me impressionou quem é capaz de investir o seu tempo e dinheiro, arrecadando riqueza para o país, para os seus trabalhadores e para si próprios. Arriscar não é a maioria das vezes compensador. E são incompreendidos pela sociedade, pelas instituições do Estado e pelos meios laborais, por vezes perseguidos por uma sanha ideológica que os vê como exploradores dos trabalhadores e da sociedade em geral. Recupero o texto irónico no “Expresso” de março de 2018 de Isabel Stilwell  : “… empresário é basicamente um alvo colocado à mercê dos milhares de institutos, direções, autoridades, departamentos e repartições… Se fossem pessoas inteligentes e bons chefes de família, tinham-se ficado pelo trabalho por conta de outrem, como a maioria de nós. De facto, se andam a brincar às empresas é seguramente porque preparam alguma - é penalizá-los por conta, já!”.

Desengane-se quem ache que querem a exploração do trabalhador. Se os ouço falar em redução de impostos ou taxas contributivas é para que o respetivo valor reverta a favor de aumentos dos trabalhadores. Já se sabe que a extrema-esquerda subverte este desígnio, insistindo que os empresários deviam melhorar o rendimento dos trabalhadores à custa dos lucros e não do Estado. O argumento é falacioso, pois era preciso que todas as empresas dessem lucros e que houvesse no mundo alguém interessado em investir sem retorno, o que não sucede.

Os empresários querem o bem dos trabalhadores. Estes não serão as criaturas de Prometeu, mas também admiro os trabalhadores que respeitam a seu posto de trabalho e contribuem para o bem da empresa, atividade pela qual têm necessariamente de ser bem retribuídos. No oposto estão os “patrões” de curta duração e os que fingem que trabalham. O problema é que o sistema não é apto a premiar o empresário e o trabalhador nem a castigar o “patrão” e o fingidor, a velha “vexata quaestio” que resulta da incompreensão do que é a igualdade.

As próximas eleições europeias são muitos relevantes para os portugueses. O problema é que a campanha vem-se centrando nas questões nacionais, ou melhor, de situações comuns a muitos países europeus, como o da migração e da habitação e não sobre a construção europeia. Quando os países aderem à UE, o que as populações perspetivam é uma melhoria direta nas suas condições de vida, na aproximação dos rendimentos aos dos países mais ricos da Europa. Como isso acaba por não acontecer tal como esperado, os nacionais desinteressam-se do aprofundamento da federação da Europa. Mas é no núcleo da frutífera relação empresário-trabalhador que está a aproximação salarial, que permitirá dar o salto para a valorização duma Europa verdadeiramente unida e solidária.


 

Carlos Vilas Boas

Carlos Vilas Boas

30 maio 2024