Celebraremos, no próximo dia 12, o mártir S. Vítor, natural de Braga e órgão de uma das suas maiores paróquias. Quatro dias depois, segundo o Calendário Romano, ocorre a Memória Litúrgica de S. Frutuoso, que, contudo, só é celebrado, em Braga, no dia 19 de outubro e, em Portugal, no dia 5 de dezembro. Não terá nascido em Braga, mas a ela pertence, por ter sido seu bispo e aqui ter sido sepultado.
Vítor nasceu na segunda metade do século III, numa localidade à época chamada Paços, a este da cidade e não muito longe das suas muralhas. Era um jovem bem relacionado, de convicções cristãs e catecúmeno (estava a preparar-se para o batismo). Um dia, nos inícios de abril, encontrou-se com um grupo de pagãos que celebravam a Ambaruelia, uma festa em que se prestava culto a Ceres (deusa romana da agricultura), para que lhes concedesse um ano próspero. O referido culto consistia em dar muitas voltas pelos campos e tinha o seu ponto alto no sacrifício de um suíno (Suília). Convidado a participar no cortejo festivo, Vítor recusou quer a participação quer a coroa de flores que pretendiam colocar-lhe na cabeça, alegando que aquelas flores estavam profanadas por terem tocado o altar da deusa a quem foram oferecidas.
Perante tal recusa, o povo amotinou-se e ergueu a voz, clamando por vingança à deusa Ceres e pedindo justiça a Sérgio, governador romano da cidade de Braga. Quando este pediu a Vítor as razões do seu procedimento, a resposta foi pronta e destemida: Jesus Cristo – pessoa real e não uma ideia, como os ídolos – é o único digno de adoração. Acrescentou a isso a informação de que estava a preparar-se para o batismo.
Decorrendo, à época, em todo o Império Romano, as perseguições de Maximiano e Diocleciano contra os cristãos, a consequência dessa ousadia não se fez esperar: foi preso a uma árvore, açoitado, queimado com lâminas incandescentes e decapitado. Tal teria acontecido por volta do ano 300 (outros falam em 306), em cima de uma ponte sobre uma ribeira, no lugar de Goladas, muito perto de onde se encontra edificada a Capela de S. Vítor-o-Velho.
O seu exemplo de fé e o testemunho da sua vida ficou para a história e chegou até nós pela mão de D. Rodrigo da Cunha, arcebispo de Braga (1626-1634) e de Lisboa (1635-1642), que escreveu a Vida de S. Vítor, e também porque o seu nome foi dado à terra onde nasceu e morreu martirizado.
Frutuoso foi um monge e bispo do século VII, que terá nascido no ano 595, na região de Bierzo, diocese de Astorga (norte da Espanha). Estudou na Escola da Catedral de Palência, onde adquiriu formação em liturgia e humanidades. Fundou diversos mosteiros que tiveram um papel ativo na formação de muitos jovens e foi um apóstolo incansável na instrução do povo humilde, conforme refere S. Valério, seu discípulo, na Vita Sancti Fructuosi.
Entre 656 e 665, foi Bispo de Braga, onde veio a falecer, no dia 16 de abril de 665. Sepultado em Dume, as suas relíquias foram aí roubadas pelo arcebispo de Compostela Diego Gelmírez, no ano 1102, juntamente com as dos santos mártires Silvestre, Cucufate e Susana, que se veneravam na Igreja de S. Vítor. Enterradas solenemente na cripta da catedral de Santiago, as suas relíquias tornaram-se objeto de veneração e atração de peregrinos a Compostela, ao longo dos séculos. O que de S. Frutuoso foi devolvido encontra-se na Capela que ostenta o seu nome, em Real (Braga).
As pessoas que sofrem de fraturas e luxações recorrem a S. Frutuoso e, no passado, a devoção popular associou-o também à fertilidade. Não se sabendo ao certo o motivo, adianta-se como possibilidade o facto de o santo estar muito ligado às comunidades agrícolas da região e de lhe terem sido associados cultos de origem pagã.
Distanciados no tempo mais de trezentos anos e com histórias de vida bem diferentes, estes dois santos têm em comum a vivência fiel da fé e a firmeza das convicções. Ao seu modo e jeito, cada um deles apresenta-se como exemplo de vida e de fé, testemunhada nas mais diversas circunstâncias, com ousadia e sem receio. Porque Braga deve muito a um e a outro, aqui fica o nosso reconhecimento e a nossa gratidão a estes dois santos bracarenses.