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O luto na infância é tão doloroso como noutras fases da vida

A morte é um tema delicado e nem sempre sabemos como lidar com as consequências da perda, pois é uma das experiências mais desafiadoras da vida. Trata-se de um assunto bastante complexo e intenso, e se, encarar a morte não é um trabalho fácil para os adultos, torna-se ainda mais complicado, confuso e doloroso quando envolve falar do tema com as crianças.

Importa frisar que a perda nem sempre se relaciona apenas à morte e muitas reações que as crianças têm ao perder alguém, também podem ser replicadas quando os pais passam por um divórcio ou por uma mudança de cidade/país, por exemplo.

Quando falamos de luto, falamos sobre um tempo que é necessário para quem sofre uma perda, poder reorganizar-se e seguir a sua vida, sem a pessoa perdida. Este processo varia em duração e intensidade, de pessoa para pessoa e provoca sintomas físicos, emocionais, cognitivos, comportamentais, sociais e espirituais.

O luto infantil assume características singulares, uma vez que as crianças ainda estão em processo de compreensão do mundo e das suas emoções. Se os adultos, muitas vezes, têm dificuldade em expressar-se, também as crianças se sentem incapazes de verbalizar os sentimentos. O período de luto na infância é tão doloroso quanto noutras fases da vida. A dor da criança não pode nem deve ser subestimada: é necessário dizer a verdade, de forma clara, respeitando sempre o nível intelectual da criança, claro! É necessário esclarecer a realidade da finitude, explicar o que esse sentimento de vazio no peito é de facto. Cada criança, tal como os adultos, irá vivenciar a sua experiência do luto de forma particular.

Existem pequenas atitudes que podem ser tomadas pelos adultos para colaborar com o processo de compreensão da criança:

 


 - Não ignorar o seu próprio luto: a criança aprende observando a vida e reproduz o comportamento das pessoas mais próximas. Demonstre as próprias emoções para a criança perceber que é normal sentir-se triste. O ponto a ter em atenção é evitar demonstrar descontrole emocional e comportamentos agressivos, de forma a que não leve a criança a agir de maneira explosiva.

 


 - Tirar as dúvidas da criança: evitar eufemismos, deixando para trás os discursos fantasiados, como por exemplo “Foi morar para o Céu”; “Está com Jesus”; “É uma estrelinha”; “Foi viajar”; “Dormiu para sempre”. As crianças interpretam estas frases de forma literal. Expressões como “dormiu para sempre” pode causar medo de dormir à noite e nunca mais acordar. Outras como “viajar” ou “estar no Céu com Jesus” pode criar a expetativa de que ainda irá voltar e como não volta, pode criar sentimentos de abandono: Se foi, porque não volta?

 


 - Manter uma rotina: ajuda a criança a entender que, apesar do luto, a vida continua.

 


 - Incentivar a criança a expressar os seus sentimentos: oferecendo atividades lúdicas, como ler um livro juntos, desenhar, pintar ou fazer um álbum de recordações, podem ajudar a iniciar um diálogo com a criança e compreender o que ela sente.

 


Os pais sentem-se, muitas vezes, perdidos, sem saber como compreender as reações da criança e amenizar os seus sentimentos. Por isso, esconder, fantasiar ou mascarar a morte torna-se o caminho mais fácil. Afinal, nem os adultos sabem lidar com estas questões… A sociedade precisa envolver a família, os professores, educadores e profissionais do luto e da saúde para que a criança consiga trabalhar as suas dores, sem causar dano nem traumas, de forma a que o processo de luto seja compreendido e o tempo seja respeitado.

Clarisse Queirós

Clarisse Queirós

20 março 2024