Infelizmente, o título escolhido para esta crónica reflete um incidente triste e perturbador que ocorreu recentemente no Aeroporto do Porto, em Portugal. Uma passageira brasileira de 35 anos, que reside na Europa há sete anos e três meses, foi alvo de ataques xenofóbicos por uma passageira portuguesa.
Este incidente não apenas chocou a vítima, mas também levanta preocupações sobre a crescente incidência de xenofobia em Portugal. A vítima, que optou por não ser identificada, descreveu a situação como algo sem precedentes nas suas experiências de viagem pela Europa. Enquanto aguardava o seu voo de volta para Barcelona, onde reside e trabalha, ela foi confrontada com palavras cruéis e discriminatórias.
O incidente foi capturado em vídeo, no qual a mulher portuguesa é vista provocando a brasileira, chamando-a de "porca" e ordenando-a a regressar ao seu país. A situação piorou depois que a brasileira acionou a segurança do aeroporto.
O episódio resultou de um pequeno incidente, quando a mala de uma amiga da mulher portuguesa caiu no pé da brasileira, que apenas disse "aí, doeu." A resposta agressiva e xenofóbica da portuguesa é alarmante. A pergunta que surge é por que esses atos de xenofobia estão a ocorrer em Portugal ou se eles sempre existiram, mas agora estão sendo filmados e divulgados. A professora Benalva Vitório da Universidade Católica de Santos, que nos deixou no ano passado, já tinha observado essas tensões entre Portugal e Brasil e a analisado a retórica de "volta para a tua terra". Segundo a autora, para reduzir essas incertezas e conflitos, a educação desempenha um papel crucial, desde o ensino formal até à aprendizagem informal.
Ambos os países têm experimentado fluxos de migrações significativos, sendo vital que haja esforços para promover a compreensão mútua e o respeito. Na última terça-feira durante a apresentação do livro "Língua Portuguesa Global” na Casa do Conhecimento da UMinho, o presidente da Câmara Municipal de Braga, Ricardo Rio, mencionou o grande número de estrangeiros (129 nacionalidades), na sua maioria brasileiros, que vivem na cidade. No entanto, ele também reconheceu a existência de comentários negativos em relação à comunidade brasileira, como se o espaço para a migração já estivesse esgotado. Isso é lamentável e mostra a necessidade de novos modelos de diálogo e integração. O pesquisador Pedro Góis, da Universidade de Coimbra, alertou no ano passado que se Portugal não receber um número significativo de migrantes nas próximas décadas, o país e sua economia podem enfrentar desafios insustentáveis. Portanto, é essencial buscar novos modelos de diálogo e integração, desde a formação e educação nas instituições de ensino até às políticas públicas das autarquias. Nesse processo a comunicação desempenha um papel fundamental, promovendo o (re)conhecimento das comunidades que utilizam a língua portuguesa, um património compartilhado, mas também uma língua que se adapta e evolui com as diferentes culturas que a abraçam.
O ministro da justiça do Brasil, Flávio Dino, disse que "Bom, se for isso, nós temos direito por reciprocidade, né. Porque em 1500 eles invadiram o Brasil, nós estamos tudo de acordo. E concordo até que eles repatriem todos os imigrantes que lá estão (em Portugal) devolvendo o ouro de Ouro Preto. E aí fica tudo certo, a gente fica quite”.
A resposta do Ministro da Justiça Flávio Dino levanta uma questão importante sobre reciprocidade e histórias compartilhadas. Importa reconhecer que a história de Portugal e Brasil é complexa e é marcada por eventos significativos, incluindo a colonização e exploração do Brasil. No entanto, é importante abordar os desafios atuais, como a xenofobia, com um espírito de reconciliação e cooperação, em vez de alimentar o ódio e o ressentimento. A reciprocidade pode ser uma abordagem válida para abordar questões relacionadas com a imigração e a integração, desde que seja implementada de maneira justa e equitativa. Em vez de se buscar vingança ou confronto, é fundamental promover o entendimento e a harmonia entre as nações. O regresso do ouro de Ouro Preto, embora simbolicamente significativo, pode não ser a solução para os problemas atuais de xenofobia. A história não pode ser alterada, mas o futuro pode ser moldado por meio de ações positivas e políticas que promovam a inclusão e a diversidade. Em vez de se procurar a retaliação, é mais construtivo trabalhar em conjunto para construir sociedades mais tolerantes e acolhedoras, onde todos, independentemente da sua origem, possam coexistir em paz e prosperidade. Nesse processo a educação, o diálogo e a conscientização desempenham um papel vital, com o intuito de combater a xenofobia e promover uma convivência harmoniosa entre as pessoas de diferentes origens e nacionalidades.