Consta que, no estertor da sua vida, o escritor W. H. Goethe terá dito a icónica frase, “Mehr Licht!”, Mais Luz!. Certamente que toda a obra literária que o autor produzira era já a garantia de que levaria muita luz e discernimento a todos os seus leitores, mesmo depois de perecido. É esse o maravilhoso lastro intemporal do livro, a boa literatura resistirá às placagens temporais das ditaduras ou modas do cancelamento, cravando o conhecimento no córtex dos que anseiam entendimento maior do que o vão vislumbre da caverna de Platão.
Decorre por estes dias, entre 2 e 12 de Novembro, a primeira edição do Festival Literário de Braga, o Utopia. Organizado por uma entidade privada, com o apoio da CM de Braga, temos finalmente um acontecimento de uma magnitude digna da nossa cidade. Há vários anos que eventos destes ocorrem em cidades pequenas e médias com impacto cultural substancial envolvendo as populações, o Festival FOLIO em Óbidos, o LeV em Matosinhos, o Escritaria em Penafiel ou o enorme Correntes D’Escritas na Póvoa de Varzim, que têm descentralizado de forma sustentada os eventos literários.
Para disseminar os efeitos do novo dinamismo cultural que finalmente esventrará o amorfismo vigente, deve ser envolvida a população estudantil, porque em primeira linha serão os futuros leitores, mas também envolver toda a população esquecida da importância da leitura. Em Penafiel distribuíram há uns anos sacos reutilizáveis de pão com aforismos marcantes de poetas e romancistas portugueses. Nunca se deve desperdiçar uma oportunidade para aliar conhecimento e sustentabilidade, lutando contra a estupidez que se quer massificada.
Teremos já percorrido um longo caminho desde que as famosas bibliotecas ambulantes, as Citroën Y da Fundação Calouste Gulbenkian, calcorreavam todo o nosso Portugal levando um enorme acervo de livros aos cantos mais recônditos do país, procurando que a “luz de Goethe” chegasse finalmente a muitos cérebros em desenvolvimento. A par dos famosos vendedores ambulantes que nos brindavam mensalmente com novas edições [], tivemos um aumento da rede de bibliotecas públicas, um Plano Nacional de Leitura, livrarias e ofertas editoriais tão diversas quantas os gostos que existem. Mas teremos mudado os nossos hábitos de leitura, deixando para trás décadas de atraso na formação e de iliteracia? Desses números falaremos no artigo da próxima semana.
Temos muitas vezes a sensação que a aprendizagem termina no fim do ciclo de estudos e que aí se finda a nossa busca de conhecimento e formação contínua. Seja por gosto ou por necessidade de evolução profissional, hábitos de leitura refundam ciclicamente os nossos pilares alterando a visão do mundo a cada livro terminado. É uma das formas mais eficazes de desenvolvimento da empatia e de nos colocarmos no lugar do outro, uma vez que a literatura nos inunda de experiências e relatos na terceira pessoa.
Felicite-se de forma efusiva quem, em boa hora, se aventurou na organização de tão importante evento literário, desejando o maior sucesso, a bem da cultura da nossa cidade.