Esta semana, a edição digital do Diário do Minho publicava nas redes sociais a seguinte notícia: “Málaga acredita que vai ser indemnizado pelo SC Braga no "caso" Ricardo Horta”. O texto começava assim: “Kike Pérez, diretor-geral do emblema da Andaluzia, diz que queixa na FIFA avançará em breve.”. Prontamente, assomaram comentários maioritariamente oriundos de adeptos arsenalistas, indignados pelo facto deste centenário quotidiano dar eco a tal informação. Entre a meia centena de críticas publicadas, a maioria dos intervenientes entendia que um jornal da cidade não deve publicar algo que possa eventualmente melindrar ou apresentar uma versão menos favorável de uma instituição local de renome. Alguns exemplos:
- “Ainda bem que o Diário do Minho é de Braga… o jornalista é que não deve ser… ainda não perceberam que esta novela vem desde janeiro e é para desestabilizar?”
- “O jornal vai receber algum? Então porquê a publicação desta notícia…?”
- “Só querem vender jornais à custa do Braga.”
- “O Diário do Minho devia noticiar factos!!! E factos são os 5 mísseis que o Nacional levou!!!”
- “Notícias fabricadas pelo JORNALIXO português.”
- “O Diário do Minho presta-se a cada uma? Será que é para esconder outras?
- “Sem comentários!!! Não entendo porque o Diário do Minho entra nisso…”
- “O Diário do Minho pretende é vender jornais ao periodicamente vir à baila com a notícia.”
- “Voltam à carga quando a performance desportiva do clube bracarense começa a incomodar em demasia. Admira-me que o Diário do Minho alinhe pelo mesmo diapasão.”
Não tenho cartão de sócio do SC Braga, nem carteira de jornalista – embora tenha sido detentor de ambos os documentos há três décadas. Nunca ou muito raramente o faço, mas como uma das minhas últimas aulas teve precisamente a ver com o conteúdo das caixas de comentários dos jornais portugueses, resolvi partilhar a minha opinião. Ressalvo que nutro um carinho especial pelos profissionais que trabalham na comunicação do SCB e que são hoje uma referência nacional na área. A minha reação não é sobre o clube, mas sobre uma certa forma de bairrismo que caracteriza alguns adeptos, seja qual for a agremiação. Acrescento ainda que não me suscita particular interesse o desfecho que venha a ter este caso. Gosto de futebol, mas considero que os montantes envolvidos em transferências, comissões e afins são demasiado pornográficos em sociedades com escandalosas desigualdades sociais. É-me totalmente indiferente saber quem vai ou não receber 5,5 milhões de euros por uma transferência que “não” aconteceu. Dito isto, e consciente de que iria gerar alguma celeuma, escrevi:
“Pelos comentários, tantas pessoas gostariam que o Diário do Minho só noticiasse o que lhes agrada. Quando a notícia não nos agrada, há sempre um obscuro objetivo, má-fé ou algo pior. (…) É me perfeitamente indiferente quem vai ganhar este caso. O que me interessa é que os jornais locais não estejam amordaçados...”
Não me desabou um enxame de ódio, porque um certo número de contendores – com posição diferente da minha – eram pessoas educadas e outros eventualmente não terão enveredado pelo insulto por estarem devidamente identificados, sendo Braga um espaço público de reduzidas dimensões. Embora não me tenha livrado de alguns cognomes menos abonatórios, houve alguma elevação. Todavia, as caixas de comentário estão cada vez mais repletas de uma autopropaganda que nos doutrina com as nossas próprias ideias. Trata-se do fenómeno da bolha (Pariser, 2012). Quando eu era jornalista nos anos 1990, em Braga, a liberdade de imprensa devia fazer face às mais diversas pressões locais. Hoje, são os seguidores (políticos, desportivos, religiosos, ideológicos, etc.) os primeiros a insurgirem-se contra a imprensa – e a indignação é um direito e um dever democrático –, mas infelizmente menos para apontar falhas deontológicas, do que para defender a “sua” visão, a única que consideram válida e quem não tolera qualquer argumento contrário. Para a imprensa regional, a proximidade com os seus públicos tornam estas tensões ainda mais complexas a gerir.