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Associação de empresas florestais diz que estratégia contra incêndios deve ser repensada

Associação de empresas florestais diz que estratégia contra incêndios deve ser repensada
Fotografia DR

Agência Lusa

Agência noticiosa

Publicado em 27 de abril de 2024, às 14:37

A ANEFA questiona a limpeza anual.

A gestão de faixas de combustível em terrenos florestais visa prevenir fogos rurais, mas a ANEFA – Associação Nacional de Empresas Florestais, Agrícolas e do Ambiente questiona a limpeza anual e defende que a estratégia deve ser repensada.

“Não entendemos muito a necessidade de repetir anualmente, para os padrões que estão a ser exigidos, ou seja, a altura da erva e esse tipo de situações”, afirmou o presidente da direção da ANEFA, Pedro Serra Ramos, em declarações à Lusa.

O engenheiro florestal acrescentou que as limpezas anuais, para a associação, “têm uma preocupação acrescida”: em muitos casos as pessoas focam-se em limpar as áreas em que é obrigatório, “mas depois deixam para trás a gestão das áreas florestais em si”. “Ou seja, como o dinheiro não chega para tudo, aquilo que acaba por se notar é que há uma preocupação - o pouco dinheiro que há serve para limpar, para não serem sujeitos a coima -, mas depois fica a gestão florestal por fazer, porque já não há dinheiro”, explicou, admitindo que isso possa não ser “assim tão positivo do ponto de vista da prevenção” dos fogos rurais.

Para o dirigente, estará na altura de “voltar a sentar os diferentes atores que participam nisto à volta da mesa”, para discutir “se vale a pena continuar com esta estratégia”, porque muitas vezes é limpa a faixa dos 50 metros ao redor de um edifício “e depois o resto é uma desgraça”.

Segundo o mais recente relatório anual do Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais, de 2022 – o documento de 2023 será entregue ao Governo em breve –, foi reportada a “execução global de 73.248 hectares (menos 14.210 hectares face a 2021, uma diminuição de 17%), não se atingindo o valor acumulado estabelecido pelas entidades”. O documento reporta, em termos de gestão de combustível, 65.693 hectares (ha) em 2019, 70.387 ha em 2020 e 88.058 ha em 2021.

Estes números não incorporam, “por falta de mecanismos adequados de reporte, a maioria das entidades privadas (proprietários florestais e agrícolas, individuais ou coletivos) e autarquias”, que têm um peso bastante relevante, refere-se no relatório. Em relação ao Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF), o decréscimo deveu-se à diminuição de 50% da área executada com recurso ao fogo controlado e queimadas (1.829 ha) e diminuição de 10% da área executada em mosaicos (14.523 ha), face ao ano anterior.

O documento regista ainda o ligeiro aumento na execução de rede primária (7.871 ha) e na proteção de áreas de elevado valor através de 18 projetos-piloto (1.901 ha). O relatório de 2022 sublinha ser “cada vez mais urgente o reforço de medidas que estimulem o envolvimento privado e o consequente investimento em medidas de silvicultura, boa gestão após exploração florestal”, entre outras.

A limpeza de terrenos agrícolas e florestais, a concretizar até 30 de abril, padece, no entanto, da escassez de mão-de-obra por todo o país. “Há zonas mais afetadas que outras, todas as empresas estão a sofrer um bocadinho com falta de pessoal qualificado para fazer os trabalhos”, referiu Pedro Serra Ramos, salientando que as empresas, como perceberam que a situação “vai ter continuidade”, foram investindo na mecanização.

A realidade é também conhecida da Federação Nacional de Associações de Proprietários Florestais (FNAPF). “Já há robôs também de limpeza. Já há outros sistemas mais avançados, mecanizou-se muito”, disse o presidente, Luís Damas, reconhecendo que haverá sempre dependência de mão-de-obra, para trabalhos manuais ou trabalhadores especializados na operação das máquinas.

Em zonas como Abrantes, distrito de Santarém, ainda é possível encontrar trabalhadores portugueses, enquanto outras empresas “têm já equipas constituídas por imigrantes”, em zonas como Viseu ou Oliveira do Hospital, onde há muita indústria. O dirigente avançou que “as regiões do litoral têm alguma dificuldade de mão-de-obra”, até por no interior alguns trabalhos poderem ser complemento à atividade local.

Pedro Serra Ramos frisou que, “na maior parte dos casos”, os imigrantes também “não estão preparados para a realização destes trabalhos”. “A tendência será cada vez mais procurarem soluções de mecanização que, de alguma forma, colmatam esta falta de mão-de-obra, porque é diferente” conseguir-se “atrair os jovens para trabalhar, por exemplo, com robôs e desmatação, do que para agarrar numa motorroçadora e andarem a cortar mato”, vincou.

Para Serra Ramos, a prevenção deveria ser feita a partir da gestão do espaço florestal, o que não tem acontecido, e “a prova está no nível de arborização”, que “é praticamente nula”. “Os proprietários muitas vezes não têm receita disponível para pagar uma gestão profissional florestal e, portanto, deveria ser aí que o Estado devia investir muito mais do que na limpeza pura e dura de pequenas áreas, apenas para proteção junto aos espaços urbanos”, defendeu.

Passados sete anos dos trágicos incêndios de 2017, vincou, “já se deveria ter apontado a estratégia para uma gestão profissional da floresta”, em vez de “apostar apenas na sensibilização das pessoas”, e de preparar o futuro da prevenção da floresta em relação às alterações climáticas e fogos rurais. “Está na altura de nos sentarmos à mesa e fazer aquilo que […] pode ser chamado de um plano de sustentabilidade da floresta portuguesa”, propôs o responsável da ANEFA, quando, a mais de metade do prazo e só com 870.000 árvores plantadas, se está longe da meta da União Europeia da plantação de 3.000 milhões de árvores no espaço europeu.