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As vítimas ocultas da Violência Doméstica

As crianças e jovens que testemunham em suas casas cenas de brutalidade, física ou verbal, são as vítimas muitas vezes esquecidas deste verdadeiro flagelo social conhecido por Violência Doméstica.

Os últimos dados do Relatório Anual de Segurança Interna indicam 22 599 casos reportados às forças de segurança. São números terríveis que abrangem crimes muito graves que não podem deixar ninguém indiferente, sobretudo, sabendo-se que as crianças e jovens são aquelas que são atingidas em primeiro lugar, sem muitas vezes figurarem explicitamente nas estatísticas.

De facto, é sabido que os menores que convivem com situações em que, regra geral, a mãe é a agredida são afetados na sua saúde global, com repercussões graves no seu desenvolvimento, na socialização e no desempenho escolar e, na maior parte das vezes, omitidas na sinalização às Comissões de Proteção de Crianças e Jovens pelas agredidas, por receio infundado que lhes sejam retiradas.

Estas conclusões foram cientificamente comprovadas na tese de doutoramento, apresentada em dezembro de 2017, intitulada “Violência doméstica e envolvimento parental na escola: perspetivas de mães e filhos” de Miguel Oliveira Rodrigues, agente da PSP e investigador no Centro de Estudos Interdisciplinares em Educação e Desenvolvimento da Universidade Lusófona, que entre 2015 e 2016 examinou a forma como o percurso escolar das crianças e jovens entre os 11 e os 18 anos é influenciado pelo crime que mais vitimiza as mulheres em Portugal.

A esta cruel realidade, que vitimiza quase clandestinamente muitas das nossas crianças e jovens, podemos juntar outra bem diferente que resulta da onda de divórcios e desuniões que assola a nossa sociedade. De facto, por mais civilizadas e amigáveis que sejam as separações, os filhos, em quaisquer idades, sofrem sempre e manifestam constantemente alguma perturbação.

Fernando Correia, jornalista e escritor, ao dar à estampa recentemente o seu novo livro “ são lágrimas, senhor, são lágrimas”, baseado em histórias reais que cuidadosamente ficcionou e que são transversais a todas as classes sociais, dá um contributo inestimável para combater este flagelo da nossa sociedade. Ao denunciar e responsabilizar a sociedade civil para o drama da violência doméstica, o autor não deixa de fazer uma homenagem às vítimas que tiveram a coragem de narrar os casos em que estiveram envolvidas e de lançar um alerta para um tema que não pode nem deve ser esquecido.

Este livro, de leitura fácil mas por vezes agreste, é para toda a gente. Contudo, o seu conhecimento será muito útil a professores, educadores, psicólogos, advogados, agentes de segurança, magistrados, médicos, enfermeiros e outros técnicos de saúde para que mais empenhadamente se possam manter atentos e vigilantes, de forma a se poderem prevenir e evitar situações de violência doméstica, que muitas vezes podem acontecer bem perto de cada um de nós.

O escritor deste livro de histórias verdadeiras, Fernando Correia, estará na próxima quinta-feira, dia 24 de janeiro, às 18 horas, no Museu Bernardino Machado, em Vila nova de Famalicão, para apresentar publicamente a obra e analisar e discutir todos os contornos desta calamidade que assola a nossa sociedade.

Enquanto não for definitivamente erradicada, todas as ações que possam contribuir para a sua eliminação não serão demais. É o que refere o primeiro relatório de avaliação a Portugal após a ratificação em 2013 da Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência Contra as Mulheres e a Violência Doméstica, conhecida como Convenção de Istambul, divulgado ainda ontem.

Apesar dos progressos que refere, não deixa de aludir à baixa taxa de condenações e à necessidade de melhorar a coordenação no combate a este verdadeiro martírio social.


Autor: J. M. Gonçalves de Oliveira
DM

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22 janeiro 2019