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Deixem os trabalhadores em paz!

A frase é singular e, ao mesmo tempo, demolidora. Foi pronunciada pelo CEO do grupo DST a respeito do pacote laboral que, por estes dias, tem sido objecto de muita oposição (dos trabalhadores, centrais sindicais e da maioria dos partidos) e de uma greve geral que o Governo, indecentemente, procurou apoucar e desvalorizar.

Na verdade, a legislação que o Executivo pôs à discussão, mas com prévia convicção de que ia aprovar, contra tudo e todos, que procurava dourar com promessas de enorme aumento de salários a prazo, não passa de uma prenda manhosa de Natal para os trabalhadores. Num país com uma grande precariedade relativa, transformar os contratos de trabalho numa quase absoluta e interminável precariedade seria desequilibrar completamente as relações laborais para o lado dos empresários. Se há empregadores que não têm medo da legislação vigente, como o que aludi acima e que determinou este tom de prosa, há muitos que não estão satisfeitos e desejam contar com as garantias todas do seu lado e poder ter, a todo o tempo, os trabalhadores nas suas mãos. Acho que posso dizer que estes são fracos empresários que não só não estão seguros das suas qualidades de liderança (possivelmente por falta de moral e formação adequada), como manifestam a sua insaciedade pelos lucros das suas empresas, pouco se importando que a actividade empresarial seja destituída de humanismo e justiça social. 

Foi por causa dos perigos da legislação que o Executivo se propõe implementar e dá cobertura a estes interesses retrógrados que os trabalhadores incentivaram as suas organizações sindicais a acertarem-se no que respeita à greve geral da última quinta-feira. Os resultados gerais foram evidentes, ainda que os responsáveis governamentais se tenham apresentado, com ar de gozo e cinismo, ao jeito de Sócrates e Costa, a desvalorizar as taxas de adesão. É verdade que o país não parou – não era preciso e ainda bem que foi assim! –, mas o sinal dado ao Governo foi claro e indesmentível: muitas portas fechadas, outras meio fechadas/meio abertas; impactos consideráveis na Saúde, na Administração Pública no geral, nos transportes, nas Escolas e também nas empresas privadas, um pouco por todo o país. Foi assim no dia de greve geral. Acredito que não seja preciso fazer uma revolução para que o Governo emende a mão, afine o sentido de justiça e se deixe de ameaçar a paz social. Que deixe "os trabalhadores em paz".

O Governo continua a achar que tem razão. E alguns dos que têm estado com o Governo também. Nem um nem outros percebem ou nem querem perceber, o porquê da greve, mas apenas o objectivo estreito do que designam de reforma laboral. Extasiados com a propaganda eleitoralista, achavam que os trabalhadores lhes iam agradecer. Se o confessarem, ficaram desconsolados com as reacções. As medidas não iam prejudicar nenhum trabalhador, antes pelo contrário, diziam e continuam a repetir até à medula os governantes! Convencidos do seu falacioso objectivo, não conseguiram ver o que os atingidos viram de longe: que não podiam deixar de olhar pela vida e esta não está nada fácil. O verdadeiro resultado é que agora os muitos milhares de trabalhadores precários sabem que o Governo os abandonou. A teimosia da anunciada reforma laboral não podia dar senão no que deu. Os trabalhadores não podiam deixar passar aquilo que lhes ia tornar a vida ainda mais errante. Os que defendem o Governo bem procuraram responder às perguntas que os próprios formularam – uma estratégia para responsabilizar os grevistas e dizer-lhes que não tem sentido a paralisação – mas não fizeram nem fazem todas as perguntas que era importante que fizessem, para além de que as respostas que dão não estão completamente certas, são vagas ou estão mesmo erradas.

A prenda que o Governo tinha para os trabalhadores nunca será aceite por estes. O melhor que aquele pode fazer é deixá-los em paz.

Luís Martins

Luís Martins

16 dezembro 2025