twitter

Os primeiros cristãos rejeitaram o Deus do Antigo Testamento

É estranhíssimo o mito que vos trago hoje. Estranhíssimo. E isto, mesmo que não poucas vezes tenha ouvido e lido crentes cristãos – alguns deles com sérias responsabilidades sérias na Igreja – a dizerem coisas como: «isso é fruto do Deus do Antigo Testamento»; «Jesus trouxe-nos um Deus distinto do Deus Antigo Testamento; não mais um Deus furioso, mas um Deus bondoso»; e outras afirmações similares.

As ideias erradas são difíceis de serem retiradas das mentes e, mais ainda, dos corações. Por mais que queiramos dizer a verdade às pessoas, elas agarram-se a esses genuínos mitos como algo de precioso; algo que se lhes for tirado, poderá provocar um “desabar” das estruturas crentes (baseadas em ideias desacertadas e não num contacto pessoal tu a Tu com Deus).

Seja. Esta é a realidade com que vivemos, muitas das vezes fruto dos nossos processos psicológicos de diferenciação, característicos do amadurecimento, mas que, no que a pessoas adultas diz respeito, deveriam ter ficado para trás. Mas não alimentemos tal realidade. Tenhamos, sim, cuidado com o modo como falamos, pois nunca os cristãos da Grande Igreja rejeitaram o Deus do Antigo Testamento: YHWH (quatro consoantes passíveis de, com o anexar das vogais certas, serem transliteradas pelo vocábulo “Iahvéh”, mas nunca pelo sinceramente grosseiro “Jeová”).

De facto, YHWH é a Trindade (Deus-Pai e Deus-Filho e Deus-Espírito Santo). E se, ao longo do Antigo Testamento, temos passagens em que Deus parece muito distante do Deus do Novo Testamento, isso não se deve ao facto do Deus de cada uma das duas grandes partes da Bíblia Cristã ser diferente (isso vê-se no uso de textos do Antigo Testamento como citações aplicadas às Pessoas da Trindade no Novo Testamento), mas do ser humano que com Ele Se relacionava ter crescido (e, às vezes, decrescido) na sua transparência face a Deus; do ser humano se ter desapegado de si mesmo.

Ora os cristãos, afora alguns grupos fundamentalistas (que creem que os textos bíblicos foram ditados letra a letra – quase como no islão, em que Maomé terá sido apenas uma espécie de boneco de um ventríloquo –), sabem que tais textos são 100% divinos e 100% humanos, e, de facto, a mentalidade dos autores do Antigo Testamento passou por um longo e lento processo de libertação do que eram as existentes ideias opacas sobre Deus no Oriente Médio Antigo.

Nada do que eram as personalidades de tais autores foi descartado por Deus, mas aceite por Este numa profunda humildade pedagógica que foi, quando Lhe deixavam, encetando a aludida libertação das conceções erradas sobre Si. Até se pode dizer que Deus, o Deus-Amor vivo e verdadeiro, que morreu historicamente crucificado na Pessoa de Deus-Filho incarnado, já estava mental e literariamente a ser crucificado por tais equívocas conceções ao longo das centenas de anos em que o Antigo Testamento foi sendo escrito.

Note-se, inclusive, que o dito acerca de uma “dupla” vertente da crucificação de Deus-Amor, aponta para se tratar do mesmo Deus, embora a ser percecionado pelos autores humanos a partir de realces distintos. Em suma: nunca os cristãos rejeitaram YHWH. Bem pelo contrário: tudo fizeram para mostrar que Ele era o Deus revelado por e em Jesus.

Alexandre Freire Duarte

Alexandre Freire Duarte

7 agosto 2024