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Cidadãos transformados em vigilantes de riscos naturais

Fotografia DR

Luísa Teresa Ribeiro

Chefe de Redação

Publicado em 11 de outubro de 2025, às 19:26

Projeto liderado por Portugal é finalista de prémio da Comissão Europeia.

Transformar os cidadãos em agentes ativos de monitorização e prevenção de riscos naturais foi um dos principais legados do projeto AGEO – Plataforma Atlântica para a Gestão do Risco Geológico, finalista dos Prémios RegioStars, galardões anuais atribuídos pela Comissão Europeia para distinguir os projetos mais inovadores e impactantes financiados pela política de coesão, na categoria “Uma Europa Verde”.

Este é o único projeto finalista da edição de 2025 dos “óscares” dos fundos europeus liderado por uma academia nacional – o Instituto Superior Técnico – e financiado pelo Interreg Atlantic Area, o único programa europeu de cooperação gerido por Portugal, estando a Autoridade de Gestão sediada na Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N), no Porto, desde o ciclo comunitário 2007-2013.

Envolvendo Portugal, Espanha, França, Irlanda e Reino Unido, o AGEO reuniu cientistas, comunidades locais e autoridades para abordar os riscos geológicos na região do Atlântico através da ciência cidadã, da observação da terra com recurso a infraestruturas europeias como o Copernicus e de ferramentas inovadoras de gestão de riscos.

O coordenador do projeto, Rui Carrilho Gomes, revela que a proposta foi estruturada em apenas um mês e submetida a financiamento europeu, juntando 13 parceiros dos cinco países, tais como universidades, centros de investigação ou organismos de proteção civil. O orçamento foi de 3,2 milhões de euros, com apoio comunitário de 2,4 milhões de euros.
 

Cinco Observatórios de Cidadãos

Em entrevista ao Diário do Minho, o professor do Instituto Superior Técnico, com sede em Lisboa, adianta que, desde o início, a intenção foi criar uma ligação direta entre os produtores de ciência e os cidadãos. Assim, de 2019 a 2023, enfrentando a pandemia, o projeto criou cinco Observatórios de Cidadãos na região do Atlântico, capacitando as comunidades locais para se envolverem em sistemas de alerta precoce de riscos naturais.

O projeto foi implementado em Lisboa, Funchal, Ilhas Canárias, Bretanha Francesa e Irlanda do Norte. Cada região enfrenta riscos naturais como sismos, cheias, erosão costeira, incêndios, deslizamentos, procurando-se envolver as populações nos processos de prevenção. «Conseguimos criar um grupo que chegava a ser de 40 pessoas, oriundas de instituições que produzem ciência, a trabalhar diretamente com os cidadãos», refere.

O AGEO desenvolveu uma plataforma e uma aplicação móvel que permite que qualquer cidadão possa reportar questões como fissuras em edifícios, derrocadas, sinais de erosão ou outras situações de perigo.

A plataforma digital regista os alertas enviados pela população e faz o seu encaminhamento para as entidades competentes, que atuam no imediato e ficam com a informação registada para tratamento futuro, por exemplo em termos estatísticos.

Apesar da criação de uma plataforma em software livre, cada parceiro teve a liberdade para melhorar as ferramentas locais de que dispunha, adaptando-as aos princípios do projeto. «O fator-chave foi fator humano. Encontrar pessoas que dentro das instituições que quisessem estabelecer a ligação com os cidadãos», afirma.
 

Capacitar as comunidades locais

O projeto apostou na formação dos cidadãos, capacitando dessa forma as comunidades locais para se envolverem em sistemas de alerta e para enfrentarem os desafios climáticos. «Queríamos capacitar os cidadãos, especialmente os mais jovens. Quanto mais informados estiverem, maior será a sua capacidade de reagir e colaborar», diz.

No âmbito deste projeto, a Câmara Municipal de Lisboa liderou o Observatório Multirriscos. Este projeto-piloto aborda os temas do risco sísmico, das inundações, dos deslizamentos de massa em vertentes e do risco geotécnico, tendo a particularidade de ser desenvolvido em contexto urbano.

Na ilha da Madeira, o Observatório de Cidadãos centrou-se na monitorização da instabilidade de vertentes; nas Ilhas Canárias, Espanha, e na Irlanda do Norte na queda de rochas; e na Bretanha, França, na vulnerabilidade dos riscos costeiros.

Do projeto resultou o livro digital “Citizens’Observatories on Geohazards”, publicação que mostra como «a monitorização ambiental apoiada pelo cidadão, quando integrada nos esforços institucionais, desempenha um papel crucial no aprimoramento das estratégias de gestão de riscos e na sua eficiência».
O projeto não teve continuidade, mas foi de tal forma «transformador na forma de atuar» que as instituições envolvidas continuam a utilizar as suas metodologias. A aplicação continua funcional e gratuita, com o compromisso de se manter ativa durante cinco anos após o fim oficial do projeto. «O AGEO ainda está vivo», sustenta o académico.

Este projeto foi aprovado pelo Programa INTERREG V B – Área Atlântica 2014-2020, financiado pelo Fundo europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) e enquadra-se no eixo prioritário 3 – fortalecimento da resiliência do território aos riscos de origem natural, climática e humana. Esta prioridade promove uma melhor gestão do ambiente, permitindo que as autoridades regionais e os diversos agentes estejam preparados para se adaptarem às alterações climáticas e a potenciais riscos que venham a ocorrer na área atlântica.

Em relação à nomeação como finalista da competição, o professor universitário destaca que «o projecto AGEO foi escolhido entre 266 projetos europeus para estar a concurso nos Prémios RegioStars, pela qualidade e impacto nas populações e transformação das instituições que contactam diretamente com os cidadãos».

Os Prémios RegioStars incluem a categoria “Escolha do Público”, na qual este projeto está a concurso, sendo que a votação decorre até às 11h00 da próxima quarta-feira, na página dos Prémios RegioStars. Os vencedores vão ser divulgados nesse dia, numa cerimónia integrada na Semana Europeia das Regiões e Municípios, que se vai realizar em Bruxelas.