A defesa da Política de Coesão definida e executada em articulação com os territórios foi a grande mensagem da 22.ª Semana Europeia das Regiões e Municípios, que decorreu em Bruxelas. O evento também ficou marcado pelo aplauso a Elisa Ferreira, que está a terminar o mandato como comissária para a Coesão e Reformas.
A Política de Coesão continua a desempenhar um papel crucial na construção da União Europeia (UE), precisando de ser reforçada e aperfeiçoada para responder aos desafios exigentes que o projeto europeu enfrenta, especialmente quando se equaciona o alargamento a mais países.
Esta foi a ideia central defendida na 22.ª Semana Europeia das Regiões e dos Municípios, que decorreu em Bruxelas, de 7 a 10 de outubro, organizada conjuntamente pela Comissão Europeia e pelo Comité das Regiões Europeu.
Deste encontro, que reuniu cerca de 5.000 representantes de toda a UE, saiu como principal mensagem a veemente rejeição da possibilidade de centralização da gestão da Política de Coesão em Bruxelas e nos governos nacionais, deixando de fora as autoridades regionais e locais.
Na sessão de abertura, reagindo a notícias que dão conta que o primeiro esboço da forma de gestão das verbas aponta no sentido da centralização do quadro financeiro plurianual, a partir de 2028, o presidente da Comité das Regiões, Vasco Cordeiro, desafiou as regiões e os municípios a «erguerem-se e tomarem posição» contra um modelo que, a ser verdade, exclui a participação do poder regional e local.
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Dando voz a 1,2 milhões de eleitos locais e regionais, o responsável pelo órgão consultivo transmitiu uma «clara e forte mensagem» de «inequívoca rejeição» de um modelo de gestão do orçamento europeu a longo prazo que exclua a participação das regiões e dos municípios, considerando que tal é «inconcebível» e põe em causa «o futuro do projeto europeu», tal como referiu em conferência de imprensa.
Vasco Cordeiro recordou que o Comité das Regiões tem defendido com veemência a importância que a Política de Coesão tem para a Europa. «A Política de Coesão não é uma questão apenas para regiões e cidades. É algo importante para a UE, para o projeto europeu. Às vezes, a impressão que temos é que a Política de Coesão é entendida como algo que é sobre regiões e cidades e, pior ainda, é sobre as regiões e cidades menos desenvolvidas. Não, a Política de Coesão não é uma política de caridade. Ela ajuda, e deve ajudar, todas as regiões», declarou aos jornalistas.
Por seu turno, a comissária para a Coesão e Reformas, Elisa Ferreira assegurou à comunicação social que não há qualquer texto com uma proposta da Comissão Europeia que vá no sentido da centralização, mas referiu que as notícias fizeram com que as regiões «se pronunciassem num sentido que é importante»: preservar a Política de Coesão, sendo que esta política «faz-se de baixo para cima, porque os territórios são todos diferentes».
Em seu entender, é preciso que a Política de Coesão mantenha a sua identidade. «O ADN da política é muito claro. É uma política que se faz em parceria com os Estados-Membros, mas trabalhando com as regiões, trabalhando com os municípios, em diálogo com o nível regional e com o nível local. Estas caraterísticas têm mantido a Europa unida, apesar de todas as vicissitudes, e isso justifica que se mantenham», declarou.
Em relação ao modelo de gestão, lembrou o compromisso assumido por Ursula von der Leyen, no Parlamento Europeu, relativamente à existência de uma «Política de Coesão forte, concebida em conjunto com as regiões e as autoridades locais».
«A Política de Coesão não é perfeita, nada é perfeito na vida, mas o essencial da Política de Coesão, penso eu, vai ser mantido, confio nisso, porque confio nos compromissos políticos a que assisti e que foram feitos com os cidadãos da Europa», acrescentou.
Já o presidente da Câmara Municipal de Braga e membro do Comité das Regiões, Ricardo Rio, considerou que a UE precisa da Política de Coesão e do financiamento direto para o poder local.
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Apesar do «risco claro de diminuição substancial do peso das Políticas de Coesão a nível europeu», o autarca alerta que «a verdade é que a Europa está ainda longe de poder ser considerada um espaço coeso social e economicamente, prevalecem e agravam-se até muitas das assimetrias e emergem novos desafios à preservação do ideal europeu».
«Há ainda um enorme campo de intervenção para as políticas de coesão e Portugal tem de estar na linha da frente da defesa de tais políticas e prioridades», afirma.
Elisa Ferreira propõe linha para catástrofes naturais na Política de Coesão
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Elisa Ferreira faz um balanço positivo do mandato como comissária europeia para a Coesão e Reformas, em cinco anos marcados por desafios trazidos por acontecimentos como a pandemia ou a invasão da Ucrânia. «Apesar de todas estas vicissitudes, o resultado é bom», afirmou aos jornalistas.
Esta responsável adiantou que os fundos estruturais do anterior quadro de financiamento, entre 2014 e 2020, estão executados. «O novo período de financiamento [2021-2027] está em velocidade de cruzeiro neste momento. Já temos taxas de execução bastante elevadas. Mais de um quarto do volume financeiro está comprometido», revelou, dizendo que «a execução está um bocadinho mais atrasada, mas está a andar», adiantou.
Como novidade, anunciou que está a trabalhar «intensamente» numa proposta para que, dentro da Política de Coesão, exista uma linha especial para financiar a recuperação em situações de catástrofes naturais, como incêndios, inundações, vulcões ou tremores de terra, com uma comparticipação a 100%.
Elisa Ferreira explicou que se trata de «uma linha para onde os países podem transferir dinheiro de outros programas que têm nos seus envelopes», com uma comparticipação europeia de 100%, sendo assim dispensada a verba nacional que é obrigatória nos fundos de coesão.
A proposta surge porque o Fundo de Solidariedade, que «ajuda os países ou as regiões, a pagar a reconstrução quando os acidentes extravasam a sua capacidade financeira», está esgotado.
Política de Coesão assegura bem-estar dos cidadãos
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Em relação aos resultados obtidos, Elisa Ferreira referiu que os dados mostram que a Política de Coesão continua a ser uma «máquina de convergência», como foi apelidada pelo Banco Mundial, sendo decisiva para a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, com a retirada de muitos países da União Europeia de «uma situação de atraso».
No ano 2000, 25% da população europeia vivia em países menos desenvolvidos, enquanto, neste momento, só 5% é que vive em países nessas condições. Acrescentou que o PIB médio per capita dos últimos dez Estados-Membros a entrarem na UE, há 20 anos, aumentou de 52% para quase 80% da média europeia.
A comissária salientou que a Política de Coesão «contribuiu para o bem-estar dos cidadãos»: 7,8 milhões de casas melhoraram a sua ligação por banda larga; 63 milhões de pessoas têm agora acesso a uma saúde melhor; foi crida uma capacidade de energia renovável de 6 mil megawatts; e 550 mil lares beneficiaram de uma melhoria em termos de performance energética.
Elisa Ferreira apontou para «iniciativas emblemáticas», como a criação do Fundo para uma Transição Justa, para apoiar as regiões no processo de transição para uma economia com impacto neutro no clima até 2050, que contempla uma linha de 19,7 mil milhões de euros, que está a trabalhar com 96 territórios, sendo 70 destes projetos liderados por jovens.
A comissária referiu o apoio para responder às sucessivas crises, medidas que deram «provas que a política funcionou e que a política aguentou as regiões e a Europa em períodos que a teriam destruído se não fosse esta resposta imediata».
Lembrou também a criação de instrumentos para responder «aos novos desafios», como as regiões estagnadas e a fuga de cérebros. No período de 2021 a 2027, está previsto um montante de 16 mil milhões de euros de investimento nesta área, de forma a assegurar às pessoas o direito de ficarem nas suas terras, defendido por Enrico Letta, antigo primeiro-ministro italiano autor do Relatório de Alto Nível Sobre o Futuro do Mercado Único.
Entre outras medidas, referiu o lançamento da Plataforma de Tecnologias Estratégicas para a Europa (STEP), destinada a atrair empresas em setores estratégicos para a transição energética e a competitividade europeia. Estão em curso projetos em 15 regiões de seis países, num total de 6 mil milhões de euros de apoio.
O orçamento da Política de Coesão para 2021-2027 ascende a 392 mil milhões de euros, enquanto entre 2014-2020 o valor foi de 352 mil milhões. Representando cerca de um terço do orçamento da UE, a política é implementada através de fundos específicos: Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), Fundo de Coesão (FC), Fundo Social Europeu+ (FSE+) e Fundo para uma Transição Junta (FTJ).
Regiões querem Europa mais próxima, forte, coesa e ambiciosa
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O programa incluiu o lançamento do relatório de 2024 sobre o “Estado das regiões e dos municípios da UE”, no qual o Comité das Regiões defende uma UE mais próxima dos cidadãos, mais forte, mais coesa e mais ambiciosa.
O relatório destaca que «a confiança dos cidadãos nos órgãos de poder local e regional aumentou substancialmente nos últimos 10 anos, tendo atingido o seu ponto mais alto em maio de 2024, com 60%, o mais elevado de todos os níveis de governo».
O documento indica também que as regiões e municípios são responsáveis pela implementação de cerca de três quartos da legislação da UE. Realizam 50% do investimento público e são responsáveis por 30% da despesa pública.
Relativamente ao alargamento da UE, o presidente do Comité das Regiões, Vasco Cordeiro, considera que a entrada de mais países «não deve ser um motivo de receio» para Portugal, porque «beneficia toda a gente».
Em seu entender, a entrada de novos Estados-Membros, «para além de ser um dever moral, é uma necessidade geopolítica e é um investimento estratégico no nosso futuro, e todos beneficiam com o alargamento».
Albânia, Bósnia-Herzegovina, Geórgia, Macedónia do Norte, Moldávia, Montenegro, Sérvia, Turquia e Ucrânia manifestaram a vontade de se juntarem aos 27 Estados-Membros que atualmente constituem e UE.
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No tocante ao valor do orçamento comunitário, a comissária Elisa Ferreira considera que é preciso «abordar seriamente» este «assunto central». Na sua opinião, «é preciso aumentar o orçamento», uma vez que o atual se cifra em «1% do PIB da União». «Temos, neste momento, um orçamento artificialmente aumentado através de uma emissão de dívida, que financiou os Planos de Recuperação e Resiliência, mas isso é transitório, é um anticíclico. A economia ia afundar e emitimos historicamente este montante de dívida e distribuímos para os países, para relançar a economia, conseguimos evitar essa crise», lembrou.
A responsável recordou também que, «a cada alargamento anterior, houve um reforço dos fundos estruturais», o que fez com que as entradas de novos países tenham sido um sucesso.
Elisa Ferreira recebeu diversas ovações pelo desempenho como comissária europeia.
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Vasco Cordeiro elogiou o seu trabalho à frente da pasta da Coesão e Reformas, defendendo que «a história vai fazer justiça» ao papel que a desempenhou, em cinco anos nos quais foi preciso «enfrentar enormes desafios». «Foi também por causa da liderança da comissária Elisa Ferreira e do seu trabalho à frente da pasta da Coesão e Reformas na Comissão Europeia que a Europa foi capaz não somente de enfrentar esses desafios, mas também de manter a coesão como um objetivo principal», enfatizou.
O comissário indigitado para esta área é o italiano Raffaele Fitto, que a presidente da Comissão Europeia apontou como vice-presidente executivo para a Coesão e Reformas, sendo a sua pasta a da Política de Coesão, Desenvolvimento Regional e Cidades.
Na carta de missão, Ursula von der Leyen diz que o comissário deve trabalhar na conceção de uma «Política de Coesão e crescimento reforçada e modernizada», «trabalhando em parceria com as autoridades nacionais, regionais e locais». «Como parte do próximo orçamento de longo prazo da UE, a Política de Coesão deve estar alinhada com as prioridades mais amplas da UE, ser mais focada, mais simples e ter maior impacto e ajudar a mobilizar reformas e investimentos», acrescenta.
Esta responsável revela que a nova Comissão ter «uma nova abordagem», assegurando que estará mais presente no terreno, mais vezes e em mais regiões. Assim, encoraja o comissário a visitar com regularidade os Estados-Membros para ir ao encontro dos europeus, desde cidades a áreas rurais e de baixa densidade populacional.
Raffaele Fitto já foi ministro, presidente da região italiana de Apúlia e eurodeputado. É formado em Direito. A sua audição do Parlamento Europeu vai decorrer a 12 de novembro.
Por seu turno, o grego Apostolos Tzitzikostas, antigo presidente do Comité das Regiões, foi indigitado como comissário europeu para o Turismo e Transportes Sustentáveis. A audição no Parlamento Europeu está marcada para 4 de novembro.
Human Power Hub finalista dos prémios RegioStars
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O Human Power Hub foi finalista dos prémios RegioStars 2024, galardões anuais atribuídos pela Comissão Europeia para distinguir os projetos mais inovadores e impactantes financiados pela Política de Coesão da UE.
Finalista na categoria “Europa mais próxima dos cidadãos”, o centro de inovação social de Braga destaca-se pela sua «abordagem inovadora e pelo impacto positivo na comunidade local».
Embora não tenha vencido, o balanço da presença na Semana das Regiões é positivo, uma vez que aumentou a visibilidade do projeto e permitiu estabelecer contactos para a participação em redes europeias de inovação social.
Por seu turno, o presidente da Câmara de Braga destaca relevância da presença do Human Power Hub na final dos prémios RegioStars. Ricardo Rio considera que a «presença recorrente» do concelho «enquanto finalista ou semifinalista de diversos títulos a nível europeu e mundial, e de forma transversal a quase todas as áreas da gestão municipal», posiciona a cidade como «uma referência do ponto de vista da qualidade e inovação das políticas públicas».
Para além do Human Power Hub, Portugal contou com mais dois projetos portugueses entre os 25 finalistas dos prémios RegioStars.
Concorrendo na categoria “Europa mais social e inclusiva”, o projeto “Realiza.te: uma Jornada Colaborativa” visa reduzir o insucesso e o abandono escolar precoce na área de abrangência da Comunidade Intermunicipal da Região de Coimbra.
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Por seu turno, o “Ecogrés 4.0 – Economia Circular, Inovação e Cerâmica 4.0” competiu na categoria “Europa mais verde”. Este projeto, desenvolvido em Ílhavo, distrito de Aveiro, trabalha numa «revolução verde» na cerâmica, com pastas cerâmicas sustentáveis, protagonizando uma filosofia de economia circular.
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A Comissária da Coesão e Reformas defende que os projetos finalistas dos prémios RegioStars «mostram como os fundos estruturais podem mudar a vida das populações num sentido positivo e de criar melhor qualidade de vida».
Jovem de Cerveira ganha prémio
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Na competição para o prémio Megalizzi-Niedzielski, atribuído pela Comissão Europeia para distinguir jovens jornalistas, uma das vencedoras é Magna Araújo Amorim, de Vila Nova de Cerveira.
A estudante de Ciências da Comunicação na vertente de Comunicação Estratégica na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, de 20 anos, concorreu na área de fotojornalismo, tendo conquistado o galardão com o voto do público numa fotografia selecionada a partir do portfólio que apresentou sobre as obras da Linha Rosa do Metro do Porto.
Ainda em matéria de destaques, o relatório de 2024 sobre o estado das regiões e dos municípios europeus aponta o Município da Lousã como um caso de sucesso de desenvolvimento sustentável e empreendedorismo rural.
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O documento refere que «o Município da Lousã é um revitalizador de aldeias e territórios anteriormente abandonados, combinando desenvolvimento rural, atividade económica turística e proteção e valorização florestal».
Em declarações aos jornalistas, o presidente da Câmara, Luís Antunes, considerou «muito positivo e estimulante» e «um encorajamento» obter esta menção. «Temos procurado, naquela que é a nossa atuação no território, ter sempre a sustentabilidade como elemento nuclear da estratégia de desenvolvimento», afirmou.
*Em Bruxelas, a convite da Comissão Europeia e do Comité das Regiões.