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Viver democraticamente

1. A democracia «nasceu no dia em que o homem foi chamado a assumir, na sua vida temporal, a dignidade do ser humano, a liberdade individual, o respeito pelos direitos de cada um, a prática do amor fraterno, a igualdade entre todos. Nunca, antes de Cristo, se tinham formulado ideias similares. (…) O cristianismo ensinou a igualdade natural de todos os homens, filhos de um mesmo Deus, irmanados por um mesmo Cristo, sem distinção de raça, cor, classe ou profissão. Fez que se reconhecesse a dignidade do trabalho e a obrigação que todos têm de a reconhecer. Proclamou a primazia dos valores interiores que enobrecem o homem. A lei universal do amor e da caridade fez de cada homem um semelhante nosso e é nela que desde então se baseiam as relações sociais dentro do mundo cristão. Esta doutrina e as suas consequências práticas mudaram o mundo». «A democracia, ou será cristã, ou não existirá».

2. Lembro estas afirmações de Robert Schuman na Semana da Democracia que está a decorrer em Braga.

O grande objetivo desta iniciativa, que teve a origem em Paulo Sousa, é a motivação dos cidadãos para que participem no ato eleitoral do próximo dia 26. Em minha opinião, porém, é necessário ir mais longe: sensibilizar as pessoas para que vivam democraticamente. Isto todos os dias.

A democracia constrói-se com democratas e não com ditadorzinhos travestidos de democratas. A democracia deve levar a um estilo de vida condizente com o ideal democrático e não ser uma oportunidade para que as pessoas se sirvam a pretexto de servirem.

3. Não há democracia sem o reconhecimento da dignidade de cada ser humano; pessoa dotada de vontade livre. Onde o outro não é tratado como irmão.

Não há democracia onde o ser humano não é respeitado na sua dignidade e nos seus direitos.

Não há democracia onde o ser humano é coisificado; onde a pessoa é mais usada do que servida.

Não há democracia onde não existe uma verdadeira justiça social. Onde se alarga cada vez mais o fosso que separa os muito ricos dos muito pobres. Onde não há uma justa distribuição da riqueza. Onde uns auferem de pensões de reformas milionárias e outros têm de vegetar com pensões de reforma escandalosamente baixas. Onde, ao lado do cidadão comum, há classes privilegiadas e castas de intocáveis. Onde há pessoas a viverem em condições indignas.

Não há democracia onde o poder não é exercido como serviço à comunidade mas vive ligado a benesses e mordomias em vez de dar exemplo de contenção de despesas.

Não há democracia onde se não prestam, com transparência, contas da gestão dos bens da comunidade e se não trava decidido combate à corrupção.

Não há democracia onde a liberdade se defende como monopólio de alguns e não como direito de todos e nem sempre anda ligada ao sentido da responsabilidade.

Não há democracia onde se fazem leis à medida em vez de, com elas, se pretender fazer justiça e defender o bem comum.

Não há democracia onde a justiça não funciona ou vem tão tarde que não chega a fazer justiça.

Não há democracia onde os detentores do poder mentem aos cidadãos. Onde se não defendem os órfãos e as viúvas. Onde há muita propaganda e pouco trabalho efetivo.

Não há democracia onde o ensino volta as costas à educação e se destrói a família.

4. A vivência democrática – sem isso democracia é uma palavra vã – exige a formação das pessoas. Formação que vem do berço e deve ter reflexo em toda a parte.

Comecei por citar Schuman, o homem que, ministro dos negócios estrangeiros da França, dormiu uma noite à porta de casa para não perturbar o descanso da empregada. Um dos pais da Comunidade Europeia. Mostrou como a democracia se constrói vivendo o Evangelho.


Autor:
DM

DM

9 setembro 2021