Não é gestão fácil gerir todas as tarefas que, no dia a dia, somos chamados a realizar. Há uma tendência, compreensiva mas, por vezes, preguiçosa, de cumprir os nossos deveres. As desculpas não são difíceis de imaginar e as pessoas, ou por hábito, ou por compreensão, aceitam com facilidade que o que devia ter sido feito não o foi.
Decerto que há quem seja mais compreensivo e quem seja mais exigente e rigoroso. No primeiro caso, goza-se de um certo descanso quando temos de apresentar alguma razão que nos ilibe de uma culpa óbvia e objectiva. Já no segundo, os resultados que se esperam podem chegar a tornar-se torturantes dos nossos nervos, porque as expectativas não facilitam em quem tem de se desculpar a espera de uma aceitação pacífica dos argumentos apresentados.
As maneiras de ser humanas são muito variáveis. Há quem se irrite por uma “coisinha de nada”, como costuma dizer-se e há quem mantenha a calma quando as tempestades se levantam de uma forma violenta. A experiência de cada um de nós nestes campos já pôde ter oportunidade de assistir, ou de se sentir envolvido, em situações complicadas, que sucedem sem previsão. Temos de nos adaptar a cada uma da melhor maneira, isto é, procurando dar a resposta mais adequada exigida por essas circunstâncias. Nem de mais nem de menos. Saber ter a calma suficiente para não nos precipitarmos, o que não quer dizer que estejamos a fugir de ser protagonistas reais, mas apenas de tentar acertar com uma resposta acertada, mesmo que possa parecer dura e agreste.
É diferente a pessoa “sonsa”, aquela que se priva de participar numa situação incómoda, aparentando uma calma serena. No fundo, não quer incomodar-se e prefere manter-se alheada da complicação, cobrindo as exigências da sua consciência com uma paz ilusória e pusilânime.
Efectivamente, há ocasiões em que não participar nos torna, simultaneamente, egoístas e cobardes. Outras, porém, em metediços e “complicativos”, quando ajudamos, mesmo com boa vontade, a que uma circunstância se torne ainda mais rubra em relação ao nervosismo dos seus intervenientes com a nossa intervenção.
É óbvio que podem ocorrer casos em que, o sentido de humanidade duma pessoa o leve a participar com toda a boa vontade numa cena eruptiva e que, aparentemente, o seu concurso nada resolva e até complique a questão.
Todas estas ocorrências nos recordam que a nossa actuação deve determinar-se sempre com a aplicação das virtudes apropriadas em relação a cada caso concreto. No entanto, para um cristão, não é possível deixar de ter presente que a caridade, como aliás S. Paulo o refere (1 Cor 13,13), é a maior ou a principal de todas as virtudes e aquela que deve moldar o grau da nossa actuação e a maneira de a realizar. Se não a vivo, sempre serei calculista ou imprudente, superficial ou impetuoso. Ou seja, não agirei com aquela conta, peso e medida que uma acção exige. Como é óbvio, os resultados da sua prática podem não ser notórios, profundos e, muito menos, sempre apreciados por quem nos observa. Mas ela é como que o condimento que dá resolução correcta às situações mais complexas, e também nos manifesta a sua verdadeira relevância.
Cristo ensinou-nos a vivê-la com perfeita evidência, quando, no Jardim das Oliveiras, perante a previsão objectiva de tudo o que vai sofrer, se enfrenta com Deus, Seu Pai, e Lhe manifesta a angústia tremenda que sente perante o que terá de enfrentar: “Pai, se é possível, afasta de Mim este cálice... Mas não se faça a minha vontade, mas a tua” (Lc 22, 42). As exigências de viver a caridade que o Pai pede atormentam-Lhe a mente e todo o seu ser, mas a vontade de Deus sempre deve ser acolhida e abraçada. E Jesus assim o fez.
Autor: Pe. Rui Rosas da Silva