Nesta altura do ano, habitualmente, já a escola secundária de Vila Verde (ESVV) tinha os seus finalistas em ebulição prontos a caminhar para Santiago. Este ano, ao invés, todos se mantêm prudentemente em casa, a ter aulas via internet e a acreditar que ainda haverá oportunidade de realizar O Caminho antes do ano findar.
No entanto, este período de quarentena forçada pode servir de aprendizagem semelhante a algumas que iríamos (ou iremos) ter n’O Caminho. Isto porque, sempre foi pedido que cada um levasse apenas aquilo que considerasse essencial e imprescindível para o dia a dia; era apanágio também que os alunos mais disponíveis e com mais capacidade apoiassem e ajudassem aqueles que sentiam mais dificuldade; também existiu sempre entre todos a partilha de dores e “sentimentos” quando os km começavam a fazer mossa; muitas vezes o ritmo diferenciado de cada um levava-os a caminharem com alguns metros/km de diferença, aquilo a que agora, unanimemente, chamamos de… distanciamento social. O Caminho permite-nos, também, vivências interiores que este tempo de recolhimento nos está a forçar a ter. Aquilo que tínhamos como modelo de vida e de que pensávamos ser impossível dissociarmo-nos, afinal, não integra nem engloba as coisas imprescindíveis da nossa vida. Conseguimos viver sem cinema, Mac Donalds, futebol, concertos musicais, viagens de avião, comboio, praias, etc., coisas que sempre percebemos ao realizar O Caminho. Outra das semelhanças do que acontece no decurso do Caminho, com estes dias, é lidarmos praticamente sempre as mesmas caras. Aqueles que connosco O fazem, findos alguns dias, passam a ser a nossa família porque são quem está lá nos momentos bons e menos bons e com quem partilhamos alegrias e tristezas.
E porque estes tempos de reclusão, para mim, são também tempos de aprendizagem, estou entretido com diferentes e distintas leituras que vão desde a “Arte da Guerra” de Sun Tzu, ao “Silêncio na era do ruído” de Erling Kagge, cujos títulos nos remetem para aquilo em que o mundo se transformou por estes dias. Sun Tzu afirma que “o auge da excelência, é viver sem combater”, enquanto Erling Kagge, um dos grandes aventureiros e exploradores do nosso tempo, diz que “há um certo desconforto de estarmos sós, limitando-nos simplesmente a ser”. Um e outro parecem falar de tempos que ninguém esperava voltar a viver neste mundo em constante evolução em que - até hoje - parecia que “quem ficava parado…andava para trás”. Agora, quem fica parado, parece ter mais possibilidade de andar… para a frente, sobrevivendo.
Parafaseando Sun Tzu “conhecendo o local e hora da batalha podemos concentrar as nossas forças para o combate a partir de maiores distâncias” – em casa, digo eu - aguardando serenamente, a derrota do COVID 19, desportivamente falando, por falta de comparência nossa, e acreditando que todos poderemos voltar a ter oportunidade de dar - o que é tradição também na chegada a Santiago – um grande abraço conjunto e sentido.
Autor: Carlos Mangas