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Velha Europa ou Europa velha?

Na passada semana, alguém me perguntou: “Devemos continuar a falar da “Velha Europa” ou da “Europa Velha”? E acrescentava que o continente de que Deus se serviu, dum modo especial, para levar o Cristianismo a todas as partes do mundo parecia cansado, como uma reformada idosa, que baralha ideias, confunde perspectivas e, de uma ou de outra forma, pede a todo o instante uma cadeira de rodas para se instalar, aguardando o fim sem outro ideal além de estar “quietinha” e “deixem-me em paz”. Pede também que não baixem o quantitativo em euros da sua aposentação, reclamando que já trabalhou muito, já fez o que tinha a fazer, e agora merece a compensação devida. Não sei se a imagem ou a opinião dessa pessoa é absolutamente certa. Apesar dos desvios, dos ideais apagados, do hedonismo crescente, do relativismo inevitável quando trata todas as ideias e atitudes como se tivessem o mesmo valor, da natalidade baixa, etc., a Europa continua a ter, no seu ideário, fundamentos cristãos. A igualdade perante a lei, a atenção aos mais desfavorecidos, a ajuda a quem necessita, o exercício da justiça equitativa e tantos outros aspectos nós podemos e devemos relacionar com o que todo o homem é para Deus. E encontrar esta realidade não exige percorrer um caminho duro e difícil, ao recordarmos que Cristo, quando os apóstolos Lhe pedem para os ensinar a rezar, recita o Pai-nosso. De facto, todo o ser humano, que Deus criou, é por Ele amado como um filho e não como um estranho, ou como uma mera criatura mais importante do que as outras, por ser racional e livre. Deus não descura estas nossas características, que nos tornam Sua imagem e semelhança. Pelo contrário, dignifica-as e tem para com elas um enfrentamento verdadeiramente paterno, que se reflecte num amor incondicional e perdoador até ao extremo. Se recordarmos a parábola do filho pródigo, temos aí a concretização de uma relação enternecedora de um pai que, ao recuperar o filho rebelde, esquece as suas injúrias, os seus desprezos e a sua má conduta. É um filho que perdera e volta a sua casa. Uma única atitude é possível: perdão e regozijo festivo. Só um pai que ama realmente pode tomar uma decisão destas, sem hesitar e se arrepender. Da mesma maneira, lembremos que quando perguntam a Jesus qual é o primeiro mandamento, responde: “Amarás o Senhor teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma, com todo o teu entendimento” (Mt. 22, 37). E acrescenta – “Este é o maior e o primeiro mandamento. O segundo é semelhante a este: amarás o próximo como a ti mesmo” (Mt 24, 38-39). Nem sempre é fácil descobrir no outro o nosso próximo. Como me dizia a mesma pessoa da “Velha Europa” ou da “Europa Velha”, noutra ocasião: “Há para aí cada próximo!...” Seja como for, o próximo é filho de Deus como nós e, por isso, nosso irmão. Merece um tratamento sempre fraterno e não indiferente ou repulsivo. O Cristianismo funciona em termos de filiação divina e fraternidade. Não é que desrespeite os propósitos de igualdade de direitos e de deveres que caracterizam todo o cidadão europeu ou do mundo. Não só os aceita como até os louva. Mas exige muito mais, porque quem é filho de Deus deve descobrir nos outros não apenas cidadãos, mas irmãos. E foi esta mensagem que a Europa levou a todos os recantos do mundo, mau grado muitos erros e injustiças que possa ter cometido. Se ela a esquece, o nosso continente torna-se uma sociedade fria, burocrática e de ideais de conforto burguês muito pouco edificantes. Deixa de ser a “Velha Europa” para se tornar, de verdade, numa” Europa Velha”.
Autor: Pe. Rui Rosas da Silva
DM

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5 novembro 2017