O exemplo veio das terras frias e, calculo, seja extensível ao resto do país: em Bragança, o aumento de casos de Covid fez esgotar os testes. Nada de novo. Acontece. O facto que merece ser realçado é que a falha ficou a dever-se ao sentido de responsabilidade dos jovens universitários que, mercê da época que vivem- as festas académicas- e ao aparecimento de casos entre os colegas, foram solícitos, o suficiente, para despertar a preocupação generalizada na academia. Não se barraram as festas nem ninguém foi proibido de circular ou de entrar num bar. Foi apenas uma atitude responsável que chegou, em alguns casos, ao extremo, de alguns resfriarem o seu ímpeto e diminuírem a frequência em espaços fechados. São estes exemplos que me fazem ter a esperança de que nem tudo o que se diz ou se escreve pode ser generalizado, pese, embora, alguns exemplos escravizados pela televisão, tenham degenerado na sensação de que a malta nova é irresponsável. Nada disso: a malta, o que precisa é que acreditemos nela, no seu potencial e na sua capacidade de exercer, em pleno, a soberania do tempo e do espaço que lhes cabe. Mais: precisa que lhe falemos numa linguagem nova, entendível, esclarecedora e informada factualmente. Ela precisa que nós, mais experientes e mais velhos, façamos um ato de contrição, para perceber de vez que o enorme potencial desta geração não pode continuar a ser o espelho das nossas más práticas, do nosso (des)interesse pelos obstáculos que todos os dias encontram para (sobre)viver no não mundo que vamos construindo. Pode-se perguntar por analogia ou simetria por que razão a Malta, que demonstrou um sentido de responsabilidade quando foi chamada a vacinar-se, se escapa a sete pés da participação cívica política. Por que razão não comparecem em massa nas urnas para escolherem os que definem e delimitam o seu raio de ação. Por que razão comparecem em massa nas manifestações pelo clima e são tão dados à “preguiça”? – Há muitas razões e uma delas começa em casa como tive a oportunidade de escrever na semana passada. Mas não chega atirar para a família o peso desta responsabilidade. É a sociedade, no seu todo e, em particular a classe dos gestores políticos que se devem interrogar sobre o modelo que seguem religiosamente e que, já se percebeu, dá para ganhar eleições, mas não alimenta, nem o sentido de responsabilidade que todos elogiamos na crise pandémica, nem sustenta um futuro airoso para a Malta. Olhe-se para a disparidade do poder de compra no país. Os números divulgados esta semana pelo INE-Instituto Nacional de Estatística são claros. Lisboa continua o seu caminho com mais do dobro do poder de compra da maioria dos municípios e, em alguns casos, chega a ser o triplo. Olhe-se para esta realidade e questione-se, vezes sem conta, se é por aqui que queremos continuar a calcorrear a esperança dos que deviam e merecem ter uma oportunidade. Nada é fácil neste acerto de contas; nada parece ser tão (in)conveniente para a balança da responsabilidade cívica do que esta sensação de impotência. Contudo, discutimos um país quando temos vários países, quase impotentes por ver que uns aproveitam e rapam o tacho sem cuidar de ver se os outros já se serviram. A líder do Banco Central Europeu, Christine Lagarde, que esta semana esteve em Lisboa, participando, no Conselho de Estado, foi muito clara ao elogiar a atitude dos portugueses após o terramoto de 1755, com a sua capacidade enorme de reconstrução da região de Lisboa. É verdade! Conseguimos. Mas a que custo? – É bom de ver que o resto do país assistiu, impotente, ao esvaziar dos cofres do reino para voltar a pôr a capital de pé. Tem sido assim e assim se foram criando as raízes que ajudam a explicar a espécie de submundo em que vivem os restantes oito milhões de portugueses. Olhos atónitos, com a juventude a reclamar a mesma quantidade de pão. Exercer uma Cidadania ativa com olhos postos na mesa, à espera da refeição, não é uma receita que se aconselhe nem um remédio. E, no entanto, esta Malta vai dando de si, inclusivamente em Lisboa, onde tudo jorra com facilidade, perpetuando a ideia malfadada de que a oportunidade está lá, não está aqui. Mentira. A oportunidade pode-se construir em todo o lado, de Norte a Sul. Não faltam bons exemplos, poucos ainda, de que assim é. Sejamos tolerantes com as suas falhas. E faça-se o que nunca devia ter sido permitido acontecer: unir o país e talvez, aí, sim, talvez, (re)nasça na Malta a vontade de mostrar que tem uma palavra a dizer.
Autor: Paulo Sousa