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Um Filho de Deus Não Deve Ser Triste

Acordei hoje com este pensamento, talvez por me encontrar preocupada com vários assuntos. Dei um salto da cama. Pensei interiormente, que a tristeza é aliada do inimigo. Logo, o melhor mesmo é enfrentar as diferentes frentes de preocupação com paz, serenidade e perseverança. Um dos pensamentos que me assola, e de algum modo me perturba, é recordar o 75º Aniversário da Libertação do Campo de Concentração de Auschwitz – Birkenau, ocorrido em 27 de Janeiro de 1945, enquanto símbolo do Holocausto. O Papa Francisco, criticando todas as formas de antissemitismo, racismo e ódio de minorias, referiu: “O aniversário da crueldade indiscritível que a humanidade descobriu há 75 anos, é um chamamento a parar, a calar e a lembrar. Precisamos disso para não nos tornarmos indiferentes”. Fazem-se apelos ao mundo moderno pela reconciliação e pela paz, pelo direito ao respeito de em toda a nação existir a liberdade, a independência e a manutenção da sua própria cultura. A História recorda-nos que a violência nunca leva à paz. Contudo continuamos a assistir a diferentes formas de fanatismo, genocídios, guerras, miséria, fome entre muitos outros. Há uns anos atrás, tive oportunidade de visitar um campo de concentração. Esta memória ficará registada no meu coração até aos últimos dias da vida. Irmãos nossos, pereceram um sofrimento sem fim, em silêncio, numa angústia atroz, sem dignidade, sem histórias de vida, algum dia partilhadas. Foram certamente mártires, com vidas escondidas, que ninguém vai recordar, que ficaram por narrar. Ficou pesente na minha memória, durante a visita, a boneca de uma criança. Também recordo que visualizei de passagem uma lápide, com o nome de uma família, de origem alemã. Mas felizmente, existem pessoas boas que nos ajudam a seguir em frente, também com a força suave do Amor. Não queria relatar um episódio algo triste. Mas este veio-me à memória. Uma senhora culta, licenciada, que esteve a servir até adoecer com uma doença terminal. Sem família foi-lhe difícil. Tanto sofrimento. Há alturas em que somos chamados a ser a família alargada de alguém. E assim foi. Com apoio de amigos e de uma instituição fez-se o funeral, tão longe da família e do seu país natal. De certeza que se encontra no céu a velar por todos. Agora descansa em paz, quisera que tivesse sido diferente. Foi o possível. As fronteiras e os entraves ainda existem. Quão necessário se torna unirmo-nos em prol da promoção da paz, da dignidade da vida humana, da melhoria das condições de vida e do bem-estar. Também me vem à memória outra situação, unicamente por ser muito diferente, já que a pessoa em causa tinha algumas posses. A sua mágoa era grande face ao sofrimento vivenciado na guerra. Tendo conseguido refugiar-se em Portugal, permaneceu exilada até ao seu falecimento. Era oriunda da Áustria, mais precisamente da cidade de Viena onde exercia um lugar de relevo ligado à arte e à cultura. Esta austríaca tinha uma amiga que foi visitar Viena, e ao regressar trouxe-lhe o famoso bolo de chocolate comprado numa pastelaria famosa. Não aceitou o bolo. Com mágoa, olhou e referiu que não sabia que mãos o tinham feito. A dor, as memórias encontravam-se ainda latentes.

Estes pensamentos fizeram-me recordar que se aproxima o dia 24 do mês de Maio, em que se celebra o 54º Dia Mundial das Comunicações Sociais com o lema: ”Para Que Possas Contar e Fixar na Memória (Ex 10,2). A Vida Faz-se História”. Respirar a verdade das histórias boas, dedicando este dia à narrativa. “Na confusão das vozes e mensagens que nos rodeiam, temos necessidade duma narração humana, que fale de nós mesmos e da beleza que nos habita”. Segundo o Papa, “o homem é um ente narrador. As narrativas marcam-nos, plasmam as nossas convicções e comportamentos… O homem é um ente narrador porque descobre-se e enriquece-se com as tramas dos seus dias… Uma história boa é capaz de transpor os confins do espaço e do tempo… Histórias que tragam à luz a verdade daquilo que somos, mesmo na heroicidade oculta do dia-a-dia… Cada história humana tem uma dignidade incansável. Por isso, a humanidade merece narrações que estejam à sua altura, àquela altura vertiginosa e fascinante a que Jesus a elevou. Cada um de nós conhece várias histórias que (…) testemunham o Amor que transforma a vida”.

Fico feliz por o Papa Francisco dedicar este aniversário ao tema da narrativa. Que chame a atenção para a sua riqueza sob diferentes perspetivas, tão enriquecedoras na maioria das vezes. A História e o conhecimento perpetuam-se e conhecem-se, também através da narrativa. Bem, volto à realidade presente. A presença da minha neta que tenho de ir buscar ao estabelecimento de ensino. Recordo ainda a Virgem Maria, causa da nossa alegria, que a humanidade de Deus no seu seio. Peçamos a Sua intercessão para que se alcance a paz, a unidade de todos, a alegria, que nos ajude a desatar os nós que vão surgindo na nossa vida.


Autor: Maria Helena Paes
DM

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30 maio 2020