O discurso do Papa Francisco em 16 de Março aos membros da Confederação das Cooperativas Italianas é a base deste texto. Citá-lo-emos livremente, mas sendo-lhe fiéis.
A Igreja não tem apenas necessidade de dizer em voz alta a Verdade. Precisa de homens e mulheres que transformem em bens concretos aquilo que os pastores pregam e os teólogos ensinam.
As cooperativas têm como finalidade primária a equilibrada e proporcionada satisfação das necessidades sociais. Devem certamente ser eficazes e eficientes na sua actividade económica, mas sem perder de vista a recíproca solidariedade. As cooperativas conjugam a lógica da empresa e a da solidariedade: solidariedade interna para com os próprios associados, e solidariedade externa para com as pessoas destinatárias. E isto exercerá uma certa influência sobre as empresas, pois as levará a descobrirem o impacto da responsabilidade social. Isso faz com que o trabalho cooperativo desempenhe uma função profética e de testemunho social à luz do Evangelho.
A aposta no trabalho cooperativo só vencerá se descobrirmos que a nossa verdadeira riqueza não são os bens materiais, mas as relações humanas e humanizadoras. Além de que o trabalho cooperativo ajuda a vencer a solidão que transforma a vida num inferno.
«Quando o homem se sente só, experimenta o inferno. Quando, pelo contrário, se dá conta de que não está abandonado, é capaz de enfrentar qualquer dificuldade ou cansaço.» «Caminhando e trabalhando em conjunto experimenta-se o grande milagre da esperança, pois tudo nos parece novamente possível. Neste sentido, a cooperação é um modo para tornar concreta a esperança na vida das pessoas».
A cooperação é uma outra maneira de declinar a proximidade que Jesus nos ensinou no Evangelho. Não podemos ficar indiferentes face ao drama do desespero provocado pela solidão. Cada um de nós deve empenhar-se em aliviar um pouco a solidão dos outros, com empenho concreto, amor, competência, e acrescentando-lhe o insubstituível valor que é a presença pessoal, feita de proximidade e ternura. Esta palavra corre o risco de desaparecer do dicionário, porque a sociedade actual a usa muito pouco. E só quando nos comprometemos em primeira pessoa podemos fazer a diferença, tornando a cooperação um estilo de vida.
Servindo-se do evangelho que narra a cena dos amigos que carregam a cama do paralítico às costas para entrar pelo telhado da casa e o colocar diante de Jesus a fim de o curar, o Papa afirma que a cooperação «é um modo de descobrir o tecto de uma economia que se arrisca a produzir bens, mas à custa da injustiça social. Cooperar é vencer a inércia da indiferença e do individualismo, fazendo algo de alternativo e não se limitando apenas a lamentar quão mal as coisas estão».
Quem funda uma cooperativa, acredita num modo diferente de produzir, de trabalhar e de estar na sociedade, porque não se pode actuar verdadeiramente como pessoas quando não se avalia o valor fundamental das relações, quando se está doente de indiferença e egoísmo. E o verdadeiro paralítico, hoje, é a sociedade que impede a plena felicidade, porque exclui o outro do horizonte. «Quando permaneço cego diante do sofrimento e o cansaço dos outros, na realidade estou cego diante daquilo que verdadeiramente me podia fazer feliz, poisnão se pode ser feliz sozinhos».
O nosso mundo está aprisionado pelo frenesim do possuir, e tem muita dificuldade em caminhar como comunidade. O egoísmo é sempre forte. Embora a cooperação possa ser economicamente mais lenta, é, todavia, mais eficaz e segura, porque chega sempre mais longe.
Cita João Paulo II naCentesimus annus (n.º 32): «se houve tempo em que o factor decisivo era a terra e mais tarde o capital, entendido como conjunto de maquinarias e bens instrumentais, hoje, o factor decisivo é cada vez mais ... o próprio homem, a sua capacidade de organização solidária, a sua capacidade de intuir e satisfazer as necessidades do outro». Daqui deriva também a importância da formação profissional, sobretudo para as pessoas que vivem nas margens da sociedade e as categorias profissionais mais desfavorecidas.
São sobretudo as mulheres que mais carregam com o fardo da pobreza material, exclusão social e marginalização cultural. O pensamento das mulheres tem de ser privilegiado, pois ninguém como elas nos pode ajudar a tornar a cooperação, não apenas estratégica, mas humana. «A mulher vê melhor o que é o amor e concretiza-o». Na base de tudo isto, está o Evangelho. Deve ser ele a fonte, nos gestos e escolhas de Jesus, que inspira o nosso trabalho na sociedade.
Autor: Carlos Nuno Vaz