Não me diga que é daqueles que se deixa governar por um qualquer! Não me diga que é capaz de comer qualquer prato que lhe apresentem; não me diga que perdeu a noção de quanto é importante para a democracia o seu voto. Saiba que todos contamos; cada voto pode ser decisivo. Se até os acamados, os doentes, os alarados, os que não podem estar presentes no dia 30 deste mês tiveram a sua oportunidade, por que razão você que nem é doente, nem está hospitalizado, goza de perfeita saúde não vai votar? Não se esqueça que a abstenção é uma maneira de votar a favor do que ganha e dá a impressão que anda aí muito encolher de ombros como fazem os derrotados da vida. Mas não me diga que eles são todos iguais porque não é verdade e a maior vergonha de um ser é mentir a si mesmo arranjando desculpas para a abstenção. Temos por onde optar: temos vermelhos, laranjas, verdes, azuis e branco; estas tonalidades ainda estão subdivididas em meios tons. É uma sinfonia de cores sem a embriaguez duma bela primavera. Mas não deixa de haver algumas pétalas no meio de tantos cardos. É uma questão de as saber ver e saber escolher. São tantas as cores que compõem o ramalhete do nosso vaso político que, na verdade, só a má vontade ou abolia pessoal pode justificar a ausência do seu voto no dia 30 de Janeiro. Escolher dá trabalho? Claro que dá, dá trabalho e responsabilidade, como todas as opções que tenhamos de fazer na vida: escolher um curso, um trabalho, um automóvel, etc. etc.. No dia de votar vou escolher um tipo de sociedade em que me admito viver e não apenas um putativo primeiro-ministro. Não quero que outros escolham por mim e , se derrotado na minha escolha, e se me impuserem um tipo de sociedade com que não concorde, por respeito à democracia, vou suportar viver nela com a esperança de um dia vir a ganhar a sociedade que almejo para nela viver na plenitude da minha satisfação. A democracia é isto mesmo: nunca nada está ganho para sempre, nem perdida sem retorno. O voto deveria ser obrigatório? Não. O voto é uma obrigação cívica? Não. O voto é uma arma? É uma das armas da democracia. Mas é, acima de tudo, uma convicção intrínseca que entronca na certeza de que alguém só governa se deixarmos que seja governo. Quando não há esta assunção, o voto não passa duma habituação formalizada pela rotina de ir à urna, com um valor meramente estatístico. O voto só é isto se abdicar de si, substabelecendo outrem para escolher em seu lugar. O indivíduo que deixa a cor do partido fazer ninho, e fecha a porta à sua reflexão pessoal, perdeu a cátedra da individualidade e ganhou a mesquinhez do refúgio furtivo. Quando se pertence a alguém, do outro se torna refém. Não vale a pena pregar estas razões para aqueles que são a voz do seu dono, mas talvez, esses mesmos, construam um pensamento introspetivo sobre esta questão e, quem sabe, despertem da letargia que o hábito lhes criou; talvez saibam ser eles na assunção da sua dignidade como pessoa e indivíduo. Ser pessoa é ser tu e os outros. Ser indivíduo é ser somente tu. Logo, quando votas não és pessoa, és indivíduo.
Autor: Paulo Fafe