Pode parecer estranho o título, mas creio ser oportuno, por esta altura, proporcionar uma espécie de glossário para o mês dos defuntos ou das almas, como é tradicionalmente conhecido o mês de novembro. A razão é que há muitas palavras e expressões que, a propósito, usamos com frequência, mas das quais nem sempre sabemos o motivo ou o significado. Não podendo apresentá-las todas, cingimo-nos às mais frequentes.
A palavra cemitério vem do termo latino tardio coemeterium que, por sua vez, deriva do vocábulo grego koimetérion, com o significado de “lugar onde se jaz/repousa”, “lugar para dormir/dormitório”. Tem a ver com isso o facto de os epitáfios (inscrições tumulares) mais antigos começarem com “Aqui jaz ... (hic jacet)”. Não sendo de todo certa a etimologia, do verbo jazer parece derivar o substantivo jazigo, ainda em uso para designar o lugar onde se é sepultado. Hoje, é sepultura a palavra que está em voga e quase caíram em desuso outras, noutros tempos muito usadas: necrópole (cidade dos mortos), sepulcrário (lugar onde há sepulcros), campo santo.
A palavra cadáver, usada para designar o corpo antes de ser sepultado, deriva do termo latino cadaver, eris (corpo morto, cadáver e, em sentido figurado, pessoa esquelética). Na sua raiz, está o verbo cado (cair), evocando o corpo morto que cai. Segundo a etimologia popular, a palavra teria origem na inscrição latina caro data vermibus (carne dada aos vermes), que supostamente aparecia inscrita nos túmulos. A verdade é que não se encontrou, até ao momento, nenhuma inscrição romana deste género, o que faz cair por terra essa etimologia.
A palavra condolências, muito usada nos velórios, deriva do latim condoleo (condoer-se, sofrer com) e, segundo os melhores dicionários da língua portuguesa, parece sofrer a influência do étimo francês condoléance. Sinónimos são os termos sentimentos e pêsames, este último derivado de “pesa-me”, manifestando o sentimento de pesar por uma perda ou infelicidade.
Usamos o termo exéquias para falar dos ritos de sepultamento e até o livro que contém as orações que os acompanham se chama Ritual das Exéquias. De origem latina, parece derivar de ex + sequor que significa “seguir para fora” ou “seguir até ao fim”. Tal sentido pressupõe que, pela morte, se sai desta vida, mas segue-se para uma outra (implícita estará certamente a fé na vida para além da morte).
O acrónimo RIP, por tantos usado até nas redes sociais, aquando da notícia de algum falecimento, é constituído pela primeira letra de cada uma das palavras da expressão requiescat in pace (descanse em paz). Por sinal, o mesmo acrónimo serve, na perfeição, para a língua inglesa: rest in peace.
Ainda há quem use a expressão Dia de finados para falar do Dia dos Fiéis Defuntos (2 de novembro). Na raiz o termo finados está o termo latino finis (fim), por sinal ainda presente no pórtico de alguns cemitérios. Se parece não exprimir a fé na vida para além da morte, não deixa de dizer uma suprema verdade: a morte é o fim da vida terrena.
O Intróito da Missa dos Defuntos, em latim, começa com a palavra requiem, uma das formas (acusativo) da palavra latina requies (descanso). A antífona Requiem aeternam dona eis, Domine é retirada de 4 Esdras 2, 34-35, um livro apócrifo que, sem ter entrado no cânon bíblico, foi citado pelo Novo Testamento e serviu de fonte para a liturgia e para a piedade popular.
Às melodias gregorianas, juntaram-se as polifonias e orquestrações de quase todos os compositores da música clássica. São famosas e adequadas para serem executadas e escutadas, neste mês de novembro, as missas de Requiem de Wolfgang Amadeus Mozart, de Giuseppe Verdi, de Gabriel Fauré, de Hector Berlioz e do português Domingos Bomtempo, entre tantos outros.
Saber do que se fala, quando se usa estes termos, honra os vivos, ajuda a melhor sufragar os mortos e pode abrir clareiras à fé e à esperança na vida para além da morte.
Autor: P. João Alberto Correia