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Tenho medo de cães

Os animais, hoje ditos domésticos, sempre foram domesticados para viver de perto com as pessoas mas, se tal conseguem, é porque contrariam os seus instintos. Os animais foram criados para viver em liberdade. Quando vejo um pássaro numa gaiola sempre me lembro do melro de Guerra Junqueiro, o que preferiu matar os filhotes do que vê-los presos na gaiola. Sempre que vejo um leão ou um tigre presos nas gaiolas dos circos, sempre me lembro dos presos inocentes mas que estão atrás das grades.

Assim como me mete pena ver um elefante, enorme e nobre em seu porte, fazer de bobo subindo e descendo os trampolins dos domadores. E focas batendo as barbatanas e aí por diante. É verdade que estes animais domesticados às vezes fartam-se deste destino de domésticos e têm os seus repentes de mau humor, matando ou agredindo os que se julgam seus donos. Mas o seu instinto é de obedecer aos seus impulsos e não de  controlá-los. Até o homem que venceu estes instintos tornando-se racional, por vezes, deixa-se dominar por eles e aleija ou mata os seus semelhantes.

Por isso não é de estranhar que os cães mordam meninos e adultos, ou que os elefantes espezinhem os seus domadores. Nos últimos dois episódios de cães que morderam crianças ouvi aventar a hipótese de os abater. Penso que esta ideia só se explica se entendermos que os cães envolvidos tem capacidades de distinguir o bem do mal, isto é, que são capazes de processar sentimentos humanos e não apenas e só instintos animais. Se me provarem que sim, que são humanos, que  controlam os seus instintos, então devem ir a “tribunal”, serem julgados pelos seus atos delituosos e condenados. Mas nunca a pena de morte. E os donos destes animais?

Se entendermos que os animais não processam sentimentos e têm apenas reações instintivas animalescas, então os donos devem responsabilizar-se por todos os seus atos e condenados à face da lei, se existe, ou à face da lei que terá de vir a existir. Uma coisa é certa: os animais não têm culpa de ser animais. A cada passo as notícias dão-nos conta de acidentes com cães. E depois nada acontece. Que será preciso acontecer para que se façam leis exigentes para os donos destes cães, para se evitar este contínuo rosário de casos de agressões?

As crianças têm uma grande identificação com os cães, pedem aos pais para terem um. Brincam com eles desde pequeninos, beijam-nos, rebolam, carregam-nos ao colo, às vezes põem-se às cavalitas neles e as mamãs chamam-lhes filhos e tratam-nos como filhos únicos! E estes cães, mesmo assim, mesmo depois desta intimidade, às vezes, mordem estas crianças, atacam estas “mães” num ato de instinto que é o seu caráter e a sua marca distintiva.

Confesso, mesmo vestidinhos à maruja, com coleira ou açaime, eu continuo a pensar que animal é sempre animal e, por isso, tenho medo que me aconteça o que aconteceu a esse meu primo. Mas não concebo vê-los tratar mal. Quem trata mal um indefeso tem maus fígados se é que o fígado produz maus sentimentos como elabora o fel.


Autor: Paulo Fafe
DM

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8 maio 2017