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Solidão dos idosos: um grave problema social

E esta conclusão é tanto mais preocupante quanto é certo que o fenómeno do envelhecimento, em Portugal e no mundo, se tem vindo a acentuar desde a década de 1970, numa espantosa progressão que, em menos de cinquenta anos, duplicou o número de pessoas com mais de 65 anos e quintuplicou o número de idosos com mais de 80 anos!

No ranking dos países mais envelhecidos da Europa, Portugal ocupa um dos primeiros lugares, com mais de dois milhões de cidadãos com idade superior a 65 anos, com a agravante de, entre as pessoas com mais de 80 anos, cerca de 34.000 viverem isoladas, segundo números avalizados pelo “Census Sénior 2014”, uma operação nacional conduzida pela GNR.

Mas o pior é que, de acordo com estimativas credíveis de várias organizações nacionais e internacionais especializadas nesta matéria, até 2050, o número de idosos irá triplicar, fazendo disparar, consequentemente, o número daqueles que passarão a viver sozinhos.

Esta evolução exponencial do envelhecimento não é propriamente um dado que possa considerar-se imprevisível, pois que já antes do final do século passado foram sendo conhecidos vários estudos que apuraram as causas ou os factores que se conjugaram para torná-la real: a transformação do paradigma social da família, que deixou de ter o tradicional carácter patriarcal, para dar lugar ao da família unicelular; a acentuada diminuição da natalidade, que não assegura sequer a manutenção da população; o substancial aumento da expectativa de vida, sobretudo em consequência dos avanços técnicos e científicos da medicina; o crescimento da emigração; e o fim do ciclo do pleno emprego.

Mas se é neste enquadramento que hão-de ser equacionadas as políticas públicas para atalhar aos complexos problemas que sumariamente enunciei e há-de buscar-se também o empenho da sociedade civil (da vizinhança às instituições particulares de solidariedade social), é sobre o papel insubstituível da família no combate à chaga do isolamento dos idosos – ou dos “novos desvalidos”, como alguém já lhes chamou –, que hoje quero discorrer.

Afinal, o resultado das investigações a que comecei por aludir não é assim tão surpreendente: no fundo, o senso comum, a inteligência e a experiência de vida de cada um de nós fazem-nos compreender a necessidade que têm os idosos do convívio familiar e das visitas, carinho e atenção dos filhos e dos familiares próximos. E de perceber que, quanto mais companhia e amor lhes pudermos dar, mais e melhor vida eles terão.

Porém, infelizmente, são cada vez menos os idosos que recebem dos filhos, dos netos e doutros membros chegados da família a proximidade e a presença amorosa regular. Sob os estafados argumentos da falta de tempo ou da distância da separação geográfica ou, simplesmente, por puro egoísmo, há quem se demita do dever de honrar pai e mãe e a família, negando-lhes o apoio que merecem, muitas vezes sabendo da angústia, do stress e do pânico em que deixam mergulhados quem com eles julgava poder contar.

Há deveres que se não podem delegar. E, entre estes, os da gratidão e da honra familiar são decerto dos mais importantes. Por isso, é que julgo pertinente apelar à cooperação e solidariedade das famílias no apoio aos seus idosos. Mesmo (e sobretudo) àqueles que se encontram institucionalizados, pois apesar de imprescindíveis e apropriados para pessoas idosas e incapacitadas, os lares e outras casas de cuidados continuados não são “creches de idosos” nem tampouco locais de negócio de afectos e de obrigações. 

Há que arranjar tempo para fazer companhia aos mais velhos, visitá-los, falar com eles, saber das maleitas e dos problemas que os preocupam e compartilhar os bons e os maus momentos da vida em família. E transmitir esse exemplo aos mais novos. Até porque, um dia, se lá chegarmos, também iremos passar pela mesma necessidade e, como diz um velho ditado, “filho és, pai serás; assim como fizeres, assim o terás”. 

Está nas mãos das famílias curar o “síndroma da solidão” de que tantos padecem e afastar de vez o anátema de “órfãos de filhos vivos” que amargura tantos dos nossos idosos. É tempo de acabar definitivamente com esta vergonha!

 

Autor: António Brochado Pedras
DM

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2 junho 2017