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Só há confiança com os pés bem assentes no chão

Toda a gente concordará que, se vivêssemos num mundo ideal o edifício da fábrica Confiança seria pertença da Câmara Municipal. No entanto, quem pensa no mundo real mas também tem uma cidade para gerir, com recursos financeiros escassos e muito para fazer, tem de ter sonhos mas sonhos com os pés bem assentes no chão para não se transformarem mais tarde em pesadelos. Os “amanhãs que cantam” só servem mesmo para cantar. Nem é a cantar duas ou três grândolas que se resolve alguma coisa. Quem tem de pagar contas todos os dias, numa delicada situação financeira, tem de fazer opções em função do que é mais importante para o bem-estar coletivo. É sobre essa ótica que tem de ser visto a atual proposta do executivo municipal para o edifício da fábrica Confiança e não sobre qualquer outra. É preciso não esquecer que mesmo a compra pelo executivo socialista do edifício em 2012, em colaboração com o então vereador da oposição – mas já futuro presidenciável – Ricardo Rio pressupunha, à partida, a possibilidade da obtenção mais tarde dos necessários fundos comunitários para a requalificação do edifício. Trata-se de uma área de 6323 m2 sendo 79% coberta, num estado de degradação muito grande, onde os custos de obra e de manutenção e funcionamento futura do edifício são consideráveis. Serão necessários 7 ou mais milhões de euros (considerando o valor de compra e das obras necessárias) para recuperar um edifício e afetá-lo a fins nada prioritários na vida da nossa cidade. Fins sem dúvida importantes, mas realizáveis de outra forma. E quanto custará ao erário público a manutenção diária de um edifício com essa dimensão versus a sua taxa média de visita diária pela população? Quem critica a opção de venda fez contas ou prefere a habitual atitude do passado de realizar despesa e “depois vê-se e quem vier que feche a porta”, como na desgraça financeira que representa para a nossa cidade o estádio municipal de futebol ? E não se venha com o argumento de que assim, nem terá valido a pena a compra do edifício por parte da nossa Câmara Municipal. Valeu sim, uma vez que, com a compra da imóvel em 2012, é assegurada, apesar da atual venda, a sua história, a sua memória industrial, a sua arquitetura e a sua fruição pública, conseguida através quer do PDM, quer do cadernos de encargos, quer do projeto concreto futuro a licenciar. Se o edifício não tivesse sido comprado, tal não seria possível. O Museu da Indústria de Braga, por outro lado, não precisa de ser obrigatoriamente criado nas instalações da antiga fábrica. É importante realçar que o presidente da Câmara de Braga, há cerca de 3 anos, já alertava para a possibilidade de alienação do edifício tendo essa mesma possibilidade feito parte do seu programa eleitoral no atual mandado e portanto estar totalmente legitimada. Note-se a ausência de qualquer proposta alternativa devidamente assente num plano financeiro equilibrado e duradouro, depois do presidente ter alertado para a impossibilidade da inclusão do edifício nos atuais e futuros fundos comunitários e colocar a possibilidade da sua venda há cerca de 3 anos, repito. No entanto, a Junta de Freguesia de S Victor, poderá em diálogo e colaboração com o executivo municipal, em sede de análise, aprovação e licenciamento do projeto, contribuir para a preservação da memória industrial e preservação e salvaguarda do seu valor arquitetónico. Que dizer da oposição socialista? São os politicamente responsáveis pela danificação, desaparecimento ou destruição de tantos bens arqueológicos, culturais e memorais da nossa cidade que até sofre o autor ao enumerá-los: a soterramento quase completo da bimilenária Bracara Augusta por imóveis construídos na década de 1980, a destruição da igreja de S Lázaro para a construção do Centro Comercial dos Granjinhos, a aprovação da construção na Quinta das Sete Fontes, a destruição da Fábrica Social Bracarense, situada antigamente em frente ao edifício da Confiança e substituída por um autêntico escarro urbanístico, a passagem para o domínio privado de partes da Avenida Central e do Campo da Vinha, a mudança do fontenário da Arcada, as arcadas do edifício demolido na Rua dos Chãos onde funcionava o BNU, etc, etc.. E que dizer de outros cidadãos que lutaram também contra a destruição de grande parte do nosso património e agora estão oportunisticamente de mão dada com quem tem tão graves responsabilidades? Hoje em dia, pelo contrário, do que se trata é a de conseguir a melhor forma de assegurar o interesse público no edifício da Confiança, mas conjugado com a saúde das nossas finanças municipais. Só há confiança na gestão pública com os pés bem assentes no chão.
Autor: Joaquim Barbosa
DM

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3 outubro 2018