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São Paulo VI: o Papa do diálogo e construtor de pontes

Paulo VI foi o papa que mais de perto acompanhei nos mais de 3 anos que estudei em Roma, naqueles tempos de pós-concílio, tão docemente desafiantes como marcados por conflitos na recepção do grande evento eclesial do século XX. A ele me ligam fortes laços de fiel adesão aos seus ensinamentos, que vi bem espelhados em meus tios sacerdotes, cuja fotografia tinham na sua mesa de trabalho e a cujo magistério dedicaram especial cuidado nas lides jornalísticas em que estavam envolvidos. Já em 1931, apenas com 34 anos, escreveu uma frase emblemática aos universitários católicos de que era assistente: «Amarei sempre e acima de tudo a verdade, sem hesitações, restrições, compromissos, como pura liberdade e cordial fortaleza de espírito». Em 1968, ele que era filho de jornalista, concebeu e quis o hoje assinalável jornal católico da conferência episcopal italiana: «Avvenire» para ser um lugar onde o laicado opera com plena responsabilidade e em comunhão com os pastores. 3 anos depois, recebendo os redactores do referido quotidiano, disse-lhes: «Avvenire, enquanto jornal, é e deve saber ser 'centro de diálogo'. Mas é e deve saber ser também um instrumento capaz de tornar os católicos pessoas verdadeiramente boas, sábias, livres, serenas e fortes». Porque é a bondade que conduz à sabedoria da verdadeira força, como o afirma também hoje o Papa Francisco, aquela força que constrói e não destrói, que aproxima e não contrapõe, que une e não divide. E isso nos faz e torna livres e serenos. 4 anos depois de beatificado, Paulo VI foi canonizado juntamente com Monsenhor Romero, Francisco Spinelli, Vicenzo Romano, Maria Caterina Kasper, Nazaria Ignacia de Santa Teresa de Jesus e o jovem napolitano Nunzio Sulprizio, o jovem corajoso e humilde que soube encontrar Jesus no sofrimento, no silêncio e na oferta de si mesmo. Na véspera, Papa Francisco foi visitar Bento XVI, criado cardeal por Paulo VI em 1977 e o único dos cardeais por ele criados que ainda está vivo. Há 4 anos, esteve presente na beatificação. Desta vez, não podia estar por motivo de debilidade de forças físicas. Daí o Papa ter tido com ele um gesto tão fraterno como significativo. Mas Francisco continua a evangelizar-nos com a sua vida. Aplicar o que propôs deve ser uma homilia. Tratando-se embora de uma celebração tão solene, não se afastou dos textos bíblicos da liturgia do dia. Comentou a atitude do jovem rico que pergunta a Jesus como poderia ter em herança a vida eterna. «Jesus muda a perspectiva: deve passar da observância dos preceitos para obter uma recompensa, ao amor gratuito e total. O jovem falava em termos de pergunta e oferta, Jesus propõe-lhe uma história de amor. Pede-lhe que passe da observância das leis ao dom de si, do fazer por si ao ser com Ele. E faz-lhe uma proposta de vida de cortar a respiração: «Vende o que tens, dá-o aos pobres... e vem! Segue-me». Também a cada um de nós Jesus diz: «vem, segue-me!». Vem: não estejas parado, porque não basta não fazer nada de mal para ser de Jesus. Segue-me: não vás atrás de Jesus apenas quando te apetece, mas procura-O cada dia. Não te contentes em observar preceitos, em dar uma pequena esmola e recitar alguma oração: encontra n'Ele o Deus que te ama sempre, o sentido da tua vida, a força de te dares. O Senhor não se perde em teorias sobre pobreza e riqueza. Vai directo à vida. Pede-te que deixes aquilo que torna pesado o teu coração, que te esvazies dos bens para lhe dares lugar a Ele, o único bem, porque não se pode seguir verdadeiramente a Jesus quando se está sobrecarregado pelas coisas. Porque se o coração estiver cheio de bens, não haverá lugar para o Senhor, que se tornará uma coisa entre as outras. Por isso é que a riqueza é perigosa e torna até difícil a salvação. Jesus é radical: pede-te tudo. Não se contenta com umas migalhas. O nosso coração é como um íman: deixa-se atrair pelo amor, mas só se pode agarrar a uma parte e deve escolher: ou amará a Deus ou amará as riquezas do mundo. Um coração liberto de bens e que livremente ama o Senhor sempre difunde alegria, aquela alegria de que o mundo de hoje tem tanta necessidade. E a propósito cita uma frase de Paulo VI: «É no coração das suas angústias que os nossos contemporâneos têm necessidade de conhecer a alegria, de sentir o seu canto». Jesus convida-nos a voltar às fontes da alegria que são: o encontro com Ele; a escolha corajosa de arriscar para O seguir; o prazer de deixar tudo para abraçar o seu caminho. Os santos percorreram este caminho, que é o caminho da santidade: a beleza e a alegria de seguir totalmente a Jesus.
Autor: Carlos Nuno Vaz
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20 outubro 2018