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Rui Osório: Sacerdote e Jornalista In Memoriam

Depois daquele encontro de Fevereiro passado numa aula da 'Teologia Revisitada' com o tema geral: «Comunicar a Igreja e comunicar na Igreja», apesar de ele mesmo afirmar que tinha muitas complicações de saúde, sobretudo cardíacas, não imaginava que o fim estivesse tão próximo.

Um texto na «Voz Portucalense» de 16 de Maio deu-me a entender que ele mesmo sentia que o fim de vida estava muito próximo. Um telefonema ao Padre Manuel Correia Fernandes, director daquele Semanário, informou-me que ele estava em recuperação e que se esperava que as complicações fossem ultrapassadas.

Tal não se verificou e, num dos dias mais queridos dos cristãos: o Dia do Corpo de Deus (31 de Maio) e também dia da festa litúrgica da Visitação de Maria a sua prima Isabel, o que também era pároco de São João da Foz do Douro, como ele mesmo tinha escrito no que seria o seu último e profético texto no Semanário que ajudou a fundar e dirigiu durante anos: abandonou-se «ao carinho do Pai, com a ajuda possível da Mãe de seu Filho e nossa Mãe que me recebe no seu colo maternal e me aquieta o coração».

No seu desvelo por manter a chama acesa no «Jornal de Notícias», onde chegou a ser Chefe de Redacção, escreveu a que seria a sua última crónica semanal, publicada na edição de domingo, dia 27 de Maio, a que deu o título : «Eutanásia supõe direito e também ética».

Na celebração exequial na Sé do Porto, o bispo dom Manuel Linda realçou que ele era um «profissional da palavra enquanto sacerdote e jornalista, um homem que soube ler a vida e as suas carências a partir de outros olhos, outro espírito».

E isso é sem dúvida o que um sacerdote tem de melhor para oferecer ao mundo. Agradeceu ainda tudo o que ele fez pela promoção da Igreja do Porto e sublinhou que a Diocese lhe estava grata.

De gratidão foram inúmeros os testemunhos de colegas sacerdotes e jornalistas, leitores, bem como paroquianos de São João da Foz, como se pôde constatar percorrendo algumas das páginas do facebook.

Eu quero registar palavras do seu texto na VP já referido, pois são o melhor testemunho que ele dá de si mesmo, além de constituírem uma forte interpelação ao compromisso sério de cada um de nós com a vida, utilizando as capacidades próprias e nas circunstâncias proporcionadas.

Transcrevo algumas das mais emblemáticas palavras desse texto, intitulado: 'Eloquência do silêncio'. «A oração é uma lenta e serena aprendizagem do silêncio, na aproximação possível do profundo e insondável mistério de Deus, em comunhão fraterna com todas as suas criaturas.

Nunca rezei tanto como em graves momentos de sofrimento, com um único objectivo: estar na intimidade de Deus na vida presente como na futura, no tempo como na eternidade, e ter a alegria da companhia de todos os eleitos, os santos, meus irmãos, para interpretarmos em coro a celestial sinfonia divina.

Contemplativo na acção e activo na contemplação, sei distinguir, no possível, a súplica, da acção de graças, e o louvor, da adoração. Limito-me a balbuciar palavras doces de amor até à eloquência do silêncio.

Calado, o mais calado possível, sei que Deus me conhece até ao íntimo e abandono-me ao seu carinho de Pai, com a ajuda possível da Mãe de seu Filho e nossa Mãe que me recebe no seu colo maternal e me aquieta o coração. …Não há desculpa possível para ser egoísta na dor.

A dor é para pôr em comum com quem sofre no corpo ou no espírito. Quem não sabe partilhar com sabedoria e delicadeza a dor perde uma boa ocasião para os outros serem mais felizes...

…No resto e é tudo, seja a vontade de Deus, o único que nos leva a cantar o hino da vida para além das agruras da morte. Sou homem de palavra, oral ou escrita. Pouco mais sei do que comunicar e ouvir as respostas possíveis às mensagens. Quem me dera voltar ao normal.

Mas ainda não me é possível nem sei quando. Até lá, garanto-vos, estou na eloquência do silêncio, aprendendo o essencial para mim e para vós, queridos leitores, e, como só desejo, para Deus, até que Ele seja tudo em todos.

Até breve!».

Foi uma bênção e uma dádiva muito especial ter tido aquele encontro de 2 horas. Aqui registo e sublinho a minha gratidão e amizade. E sobretudo a minha oração de louvor pelo dom que o cónego Rui Osório foi para a Igreja do Porto e para Portugal.


Autor: Carlos Nuno Vaz
DM

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9 junho 2018