Num destes dias, após acirrado debate parlamentar, disse um dos intervenientes: o partido ‘A’ não suporta o partido ’B’!
Por entre surpresa e ironia – ainda no ato – foram surgindo as reações… mais ou menos questionáveis e/ou aceitáveis. Que quer dizer ‘suportar’ num contexto destes? Será de exclusão e corte de relações ou de não-aceitação de acordos e concordância? Poderá ser ainda entendido ‘suportar’ como articulação entre os intervenientes ou pelo não-suporte ver nisso algo que rejeita colaboração e participação nas iniciativas alheias?
= Se consultarmos os vários dicionários veremos como definição – nos diversos âmbitos e circunstâncias – de ‘suportar’: ter sobre si, aguentar, ser a base ou o suporte, suster o peso, permitir, tolerar, sofrer, estar à prova… resistir, ter capacidade, arcar com…
Misturando as diferentes vertentes poderemos encontrar em ‘suportar’ aspetos do foro físico, na dimensão psicológica e mesmo na referência moral e espiritual.
É diante desta multiplicidade de recursos da palavra ‘suportar’ que desejamos fazer esta breve reflexão.
= Na convivência das pessoas umas com as outras – seja qual for o alcance ou mesmo o interesse – podemos ir descobrindo que nem sempre é fácil essa articulação, dado que muitos/as dos intervenientes atuam de forma preconceituosa, defeituosa ou mesmo insidiosa; explicando: quantas vezes as pessoas se toleram mais do que se aceitam como cada um é e não como se desejaria que fosse; quantas vezes corremos o risco de olhar, avaliar e julgar os outros a partir do nosso ‘eu’ marcado por experiências negativas e/ou traumatizantes… há mais ou menos tempo; quantas vezes nos podemos servir dos outros para deles tirarmos proveito, seja de promoção e de oportunismo, seja de alguma forma de egoísmo mais ou menos explícito…
Diante destes aspetos ‘suportar’ poderá parecer mais um jeito de enganar do que de conviver, de usar os outros do que com eles confraternizar, de torná-los mais descartáveis do que possíveis ‘amigos’…
= Na caraterização dos nossos dias – que não são piores nem melhores do que os do passado – podemos ainda encontrar situações e circunstâncias, pessoas e associações que tentam servir de suporte aos mais fragilizados, não só cuidando deles como ajudando a que outros possam fazer esse serviço de cuidadores – quantas vezes sem reconhecimento merecido – nas oportunidades de fragilização. As pontas da vida humana – infância e velhice – são dos momentos mais necessitados de suporte, desde a família até às dificuldades mais ou menos percetíveis. Certas afetações – mesmo económicas – não conseguem colmatar as debilidades nem as agruras de tantos dos ‘nossos’ grandes-idosos carentes de atenção, de carinho e de presença… Isso é, positiva e ativamente, suportar, semeando hoje para poder vir a colher amanhã.
= Por último, uma abordagem sucinta sobre alguns conceitos bíblicos onde o conceito ‘suportar’ e as atitudes dele decorrente estão presentes.
Na abordagem que São Paulo faz ao tema da caridade, na 1.ª carta aos Coríntios, capítulo 13, diz-se no versículo 7: ‘tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta’… numa profunda e simples declaração a que a caridade tudo suporta dos outros para consigo e de si para com os outros… sendo a referência com que todos podem contar, sem nunca se esquivar ao compromisso e à confiança. Noutro texto Paulo, na linha de viver a unidade entre os discípulos de Jesus, refere: ‘exorto-vos a que procedais de um modo digno do chamamento que recebestes; com toda a humildade e mansidão, com paciência: suportai-vos uns aos outros no amor, esforçando-vos por manter a unidade do Espírito, mediante o vínculo da paz? (Ef 4, 1-3). Por seu turno, na carta aos Colossenses 3,13 diz-se: ‘suportando-vos uns aos outros e perdoando-vos mutuamente, se alguém tiver razão de queixa contra outro’.
Quer dizer, então, que ‘suportar’ implica amor, perdão e unidade para com os outros e mutuamente. De quantas e tão variadas formas poderemos suportar mais do que ser suportados…
DESTAQUES
Certas afetações – mesmo económicas – não conseguem colmatar as debilidades nem as agruras de tantos dos ‘nossos’ grandes-idosos carentes de atenção, de carinho e de presença…
Autor: António Sílvio Couto