17/9, 1/10, 15/10 e 29/10: prossiga-se aqui a importância do Princípio Constitucional da Legalidade Criminal. Está em causa o Estado de Direito (e de Dever) democrático, social, livre e verdadeiro. O princípio da legalidade criminal ou penal também se aplica às contraordenações como princípio da legalidade contraordenacional. Não só por causa do art. 32º/10 da Constituição – e art. 29º/1 -; não só por causa do art. 32º do Regime Geral das Contraordenações; mas também por causa do art. 41º do RGCO. É portanto disparatado dizer, porque insustentável do ponto de vista axiológico-constitucional, mas desde logo também normativo, que as sanções contraordenacionais são alheias a finalidades de prevenção geral, ou prevenção especial, positivas. Repare-se no montante das coimas no direito da concorrência ou no direito da protecção geral de dados! Podem atingir milhares de milhões de € no seio p.e. da União Europeia. O que, claro está, é muito mais elevado do que as multas penais. Não por acaso se usa a expressão “burla de etiquetas” ou “fraude de etiquetas”, quando o legislador pretende fazer passar por “ilícito de mera ordenação social”, aquilo que, na realidade, é direito penal, ou direito criminal, puros. Note-se no art. 89º/A do RGCO: “Prestação de trabalho a favor da comunidade”: “1 - A lei pode prever que, a requerimento do condenado, possa o tribunal competente para a execução ordenar que a coima aplicada seja total ou parcialmente substituída por dias de trabalho em estabelecimentos, oficinas ou obras do Estado ou de outras pessoas colectivas de direito público, ou de instituições particulares de solidariedade social, quando concluir que esta forma de cumprimento se adequa à gravidade da contra-ordenação e às circunstâncias do caso. / 2 - A correspondência entre o montante da coima aplicada e a duração da prestação de trabalho, bem como as formas da sua execução, são reguladas por legislação especial.”. Norma que foi introduzida pela reforma do D.L. nº 244/95, de 14/9. Esta reforma como se sabe foi alvo de profundas críticas pelo nosso orientador académico, Jorge de Figueiredo Dias, e também Padrinho na Imposição de Insígnias pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em 27/5/2018, Constituinte em 1976 e considerado um dos pais do direito e processo penal portugueses juntamente com Eduardo Correia, seu Mestre. Não cremos todavia que tenha existido uma “contra-revolução contraordenacional”, pois estava também apenas a ser cumprido o art. 32º/10 da Constituição. Igualmente a sanção disciplinar sofre de finalidades de prevenção geral e prevenção especial positivas. Como é óbvio. Além do mais, o princípio da culpa e da perigosidade diz respeito, quer ao direito e processo penal, quer ao direito contraordenacional, quer ao direito disciplinar. Na senda de P. Albuquerque, viola o princípio constitucional da culpa a identificação de todos os acompanhantes dos autores materiais, como instigadores e/ou autores morais. Assim como seria inadmissível transferir para os herdeiros a responsabilidade criminal de um crime de fraude fiscal cometido por outrem. Outra discussão é a questão da criminalização do enriquecimento ilícito ou injustificado. Já ao contrário do que nos quer fazer crer P. Albuquerque, ou o próprio Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, não são admissíveis presunções de culpa, de dolo e/ou negligência. Como não seriam aceitáveis presunções de imputabilidade ou exigibilidade. E nada disso colide com o facto dos crimes de perigo abstracto não violarem em efectivo o princípio da culpa. Já Eduardo Correia na Comissão Revisora do CP, 1963/1964, afirmava aliás: “ao direito penal cabe, não organizar a violência, mas sim organizar a não-violência. E esta só pode ser organizada na base de uma ideia optimista do delinquente e do homem. E note-se que a ideia optimista da responsabilidade é também ideia optimista na readaptação”. Em caso algum deve ficar prejudicado o princípio da reparação de danos. Assim, sempre que possível deve haver reparação: 129º CP ou 82º/A do CPP.
Autor: Gonçalo S. de Mello Bandeira