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Princípio Constitucional da Legalidade Criminal II

A somar ao artigo de 17/9/21. Sem Princípio da Legalidade Criminal, não há Estado de Direito Democrático. Aliás, o Direito e Processo Penal é Direito Constitucional, no qual se entranha a diferença entre democracias e ditaduras. Nestas é comum aplicar medidas de segurança a imputáveis, ao contrário das democracias. Aqui, são só dirigidas a inimputáveis. E isso porque, nas ditaduras, interessa torturar por delito de opinião, mormente política ou pela cor de pele (racismo). Não desfazendo as críticas úteis de, v.g. Maria João Antunes, quanto ao tratamento contra-Constitucional pelo Estado de pessoas com anomalia psíquica. Muitas delas “condenadas a prisões perpétuas”. Recorde-se que as medidas de segurança para inimputáveis podem ser infinitamente renovadas. E ninguém está livre. A saúde mental foi descurada durante muitos séculos e as pessoas são mais frágeis do que parece. Se o Direito penal, de modo original, é monopólio do Estado, como refere P. Albuquerque, não é menos verdade que o Direito penal internacional tem ajudado à erosão deste princípio. Note-se no Tribunal Penal Internacional do Tratado de Roma (não assinado de modo completo p.e. pelos EUA ou pela China ditatorial…) ou v.g. dos casos específicos da criação de Tribunais Penais Internacionais para os crimes contra a Humanidade na ex-Jugoslávia ou Ruanda. Ainda hoje, importante doutrina alemã, como um dos m/orientadores alemães, neste caso já falecido com 94 anos, Hans-Heinrich Jescheck – um dos três magníficos penalistas teutónicos, paladinos do direito e processo penal garantistas –, consideram (inúmeros discípulos) que, por muito que nos custe, os Julgamentos de Nuremberga dos nazis foram, citamos, “uma violação do princípio da legalidade criminal, pois foi criado um Tribunal Penal com efeitos retroactivos sancionatórios, incluindo a pena de morte”. Compreendemos a observação técnica – recordando de novo que H.-H. Jescheck era um ex-capitão do exército nazi totalmente convertido todavia ao Estado de Direito Democrático e Humanista da Alemanha pós-II Guerra Mundial (não se conhecendo, diga-se, qualquer crime contra a Humanidade no seu passado… Ao contrário de São Paulo face a Saulo…) -, mas também não somos ingénuos até ao ponto de pensar que quem ganha a guerra não faz as regras da sua própria paz. Ai dos vencidos! E, Graças a Deus e/ou à “Ciência da Guerra”, que os derrotados foram os nazis. Mas não terão sido também praticados crimes contra a Humanidade por parte dos Aliados? É impossível que não tenham sido, embora em menor quantidade e, que se saiba, sem genocídios étnicos, como a escabrosa, e inventada por alguns doentes, “questão judaica”. Tudo isto para dizermos que o Direito penal internacional, rectius através de Tribunais Penais Internacionais Ad hoc, está sempre a produzir excepções ao Princípio Constitucional da Legalidade Criminal. Sem prejuízo da Declaração Universal dos Direitos Humanos poder ser internacionalmente invocada desde 10 de Dezembro de 1948. Mas já antes podia ser invocada a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, fruto da Revolução Francesa de 14 de Julho, art. 8º: A lei apenas deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias e ninguém pode ser punido senão por força de uma lei estabelecida e promulgada antes do delito e legalmente aplicada”. Além do mais, o Constitucionalismo moderno também tem origem na Magna Carta de João Sem Terra, 1215, Inglaterra. Refere o seu art. 39º em tradução livre: "Nenhum ser humano livre será preso, aprisionado ou privado de propriedade, ou tornado delituoso, ou exilado, ou de modo algum destruído, nem agiremos contra ele ou mandaremos alguém contra ele, salvo por julgamento legal dos seus pares, ou pela lei da terra." O Rei teria agora que julgar as pessoas conforme a lei. Teria que seguir um processo legal prévio e não só a sua vontade até ali absoluta. Mas podemos ir mais longe: Bíblia; Homero; clássicos Gregos como Eurípedes ou Ésquilo, Árabes, Persas, Antigo Egipto, Suméria, Vale do Indo, etc..


Autor: Gonçalo S. de Mello Bandeira
DM

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1 outubro 2021