Art. 29º/1 da Constituição, “Aplicação da lei criminal”: “Ninguém pode ser sentenciado criminalmente senão em virtude de lei anterior que declare punível a acção ou a omissão, nem sofrer medida de segurança cujos pressupostos não estejam fixados em lei anterior”. V. Canotilho/Moreira, só a lei é competente para defnir crimes, assim como os fundamentos das medidas de segurança e respectivas penas, assim como as próprias medidas de segurança. Esta é a premissa básica. Existe uma reserva de lei da Assembleia da República no que diz respeito aos crimes, penas, medidas de segurança e fundamentos. O Governo só pode legislar sobre essas matérias através de autorização da Assembleia da República: DL – art. 165º/a c) CRP. Por outro lado, há uma proibição de intervenção normativa de regulamentos, estando impedida a lei de lhes outorgar tal competência, i.e., há uma proibição de regulamentos penais delegados. Podendo se afirmar ainda que o Direito consuetudinário (fundado nos usos ou costumes), está excluído como fonte da definição de crimes ou da punição penal. Podemos também invocar o art. 29º/3 da Constituição: “Não podem ser aplicadas penas ou medidas de segurança que não estejam expressamente cominadas em lei anterior”. Problemático é saber se o princípio da legalidade (e da tipicidade), se aplica às normas jurídicas estabelecidas por integração de lacunas. Pode ser estabelecida a seguinte ideia jurídico-normativa: apenas quando a integração de lacunas represente uma espécie de “criação normativa” com a essencialidade de “legislação” do género dos antigos Assentos - art. 2º do Código Civil, “Nos casos declarados na lei, podem os tribunais fixar, por meio de assentos, doutrina com força obrigatória geral”; redacção dada pelo seguinte diploma: DL nº 47344/66, de 25/11: ora, o Ac. do Tribunal Constitucional 743/96, Diário da República nº 165/1996, Série I-A de 18/7/96, veio precisamente declarar “a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do artigo 2.º do Código Civil, na parte em que atribui aos tribunais competência para fixar doutrina com força obrigatória geral, por violação do disposto no artigo 115.º, n.º 5, da Constituição”; aliás, o art. 2º do Código Civil seria Revogado pelo DL nº 329-A/95, de 12/12 -, do género dos antigos Assentos, dizíamos, se poderá aceitar existir uma norma jurídica (e não uma interpretação jurisdicional) para resultados de controlo da constitucionalidade. Para lá da lei interna, ainda pode ser fonte da legalidade penal, com naturalidade, o chamado Direito internacional - ou seja, costume internacional e convenções internacionais -, mas também o Direito comunitário europeu, na perspectiva que a União Europeia tenha poderes penais no círculo do “espaço europeu de justiça”. Aliás, o art. 8º (“Direito internacional”) é claro – e porventura, segundo um certo prisma, até violador do art. 18º da Constituição em si mesmo, em termos de proporcionalidade, adequação e necessidade: norma jurídica constitucional que constitui o coração da diferença com a Constituição ditatorial lusa de 1933 -, claro e, de certa forma, implacável quanto ao poder democrático interno em Portugal: “1. As normas e os princípios de direito internacional geral ou comum fazem parte integrante do direito português. / 2. As normas constantes de convenções internacionais regularmente ratificadas ou aprovadas vigoram na ordem interna após a sua publicação oficial e enquanto vincularem internacionalmente o Estado Português. / 3. As normas emanadas dos órgãos competentes das organizações internacionais de que Portugal seja parte vigoram directamente na ordem interna, desde que tal se encontre estabelecido nos respectivos tratados constitutivos. / 4. As disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático”.
Autor: Gonçalo S. de Mello Bandeira