Regresso a estas páginas num momento importante para o futuro coletivo da cidade, motivado pelo debate de urgência da decisão pública e a sua compatibilidade com a valorização da memória coletiva.
Como não acredito na irreversibilidade da decisão autárquica de venda da Confiança, colocam-se duas questões: o que fazer e como fazer ressurgir o interesse público pelo futuro da fábrica Confiança depois da decisão da sua alienação, sem demérito para as iniciativas junto do Parlamento e de entidades internacionais.
A Confiança é um símbolo da “resistência industrial”. Fez o seu percurso decadente, sem desaparecer, contudo, do quotidiano urbano e da esperança de muitos, apesar da ausência de soluções pragmáticas e viáveis que lhe forjassem, no passado um destino superior. Ao contrário de Braga, há bons exemplos em Famalicão e Guimarães.
Por cá, cruzamo-nos, neste percurso, com um “equívoco” dos partidos políticos, que se comprometeram com uma solução para usufruto comum, a partir do debate de ideias que se seguiu à sua aquisição e com o silêncio da Universidade do Minho.
Face aos hábitos desta em ocupar espaços públicos, de que são exemplo o edifício do Alado, o do Castelo e a sede da reitoria no Largo do Paço, é justo lançar a questão: Porque te calas Universidade quando a cidade te tem dado tanto? A interrogação, não desobriga a Câmara Municipal, o ministério da Cultura e o setor privado, mas questiona uma Universidade que virou costas ao centro de Braga, abandonando dois edifícios que foram fundamentais ao seu crescimento.
Aqui chegados, a pergunta que se exige: como pode a UM, “valorizando” o caos por inação, num espaço como a rua Nova de Santra Cruz, assobiar para o lado, fazendo de conta que o assunto não lhe diz respeito, quando contribuiu direta e indiretamente para a degradação da qualidade de vida, na área envolvente ao Campus?
Nunca se propôs a ser parceira numa visão integrada para a área envolvente e quando se esperava, dos seus responsáveis, uma palavra sobre o futuro da Fábrica Confiança, falharam. E falharam com o edifício do Alado e depois com o edifício da antiga Escola Comercial e Industrial (hoje nas mãos de um investidor privado) e salvaguardado que está o edifício da reitoria, seria bom que assumisse com frontalidade que lhe é devida e exigida, o reparo urbano e histórico que ladeia a Confiança.
Com mais um problema em mãos ( a degradação acelerada do Museu Nogueira da Silva) em pleno centro histórico, a Universidade do Minho não pode ficar calada, já que há muito tempo, que na surdina dos seus gabinetes, se discutiram várias propostas para viabilizar a Fábrica Confiança e desenvolver um projeto que projetasse o Conhecimento e a Cidade.
Está na hora de dar a cara, mesmo que na agitação dos dias de acalorada discussão, não se vislumbre mais do que o silêncio confrangedor que se estende, pelos vistos, à Associação Académica. A viabilidade económica não pode ser descurada e sabemos bem como é difícil encontrar soluções financeiras para desenvolver projetos de grande dimensão.
Mas, tal como foi possível encontrar uma solução alternativa para o S. Geraldo, a partir do debate de ideias, mau seria para a credibilidade universitária que não se encontrasse uma solução a contento das partes. A atual reitoria, com pouco tempo de mandato, tem a tentação de se refugiar no silêncio, mas é esse mesmo silêncio e as suas consequências que perdurarão na memória dos homens e mulheres.
Uma instituição, que é hoje uma Fundação, perseguindo nos seus objetos, a valorização do saber e da história comum, tem a obrigação de levantar a discussão no meio académico e de forma pública. Não o fazendo, demonstra total “insensibilidade” e ingratidão na viabilidade do património e saberes comuns que ajudaram a Universidade desde 1973 a ser o que ela é hoje.
Ironia do destino, quis a verdade que se recordasse há dias, que pelo local passa a via romana que ligava Braga a Astorga e que a Câmara decidiu candidatar o município á Rede de Cidades Romanas do Atlântico.
É suficientemente lúcido de que lado está a bola e a vontade. Obrigado a Sande Lemos e aos restantes arqueólogos que teimosamente nos elucidam e combatem a iliteracia estratégica da valorização do bem comum..
Autor: Paulo Sousa