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Por uma rússia próspera, fraterna e pacífica

Nos últimos trezentos anos, para não recuarmos mais na sua história, a Rússia viveu em permanente de estado de guerra, excetuados alguns, poucos, períodos de paz. Descontadas as suas intervenções contra o expansionismo otomano, napoleónico e nazi, tudo o resto é um nunca mais acabar de anexações, partilhas, genocídios, repressões, pogroms, invasões, campos de reeducação, coletivizações, deportações, purgas, fuzilamentos, pilhagens, ocupações, etnocídios, violações, ameaças… No período acima referido, são conhecidas ações militares da Rússia na Estónia, Letónia, Polónia, Crimeia (1783), Finlândia, Geórgia, Arménia (o primeiro país cristão do mundo), Azerbaijão, Manchúria (China), Hungria, Ucrânia (1917-1921), Lituânia, Chechénia, Roménia, Alemanha Oriental, Checoslováquia, Afeganistão, Daguestão, Inguchétia, Ossétia do Sul, Abecásia… A sua mais recente invasão recaiu de novo sobre a Ucrânia, cujos prolegómenos se iniciaram em 2014 com a anexação unilateral da Crimeia e com as intervenções ilegítimas em Donetsk e Lugansk. Este belicismo secular é uma consequência direta dos regimes autocráticos de S. Petersburgo e Moscovo, que, guiados por uma histórica compulsão imperial, sempre se acharam no direito de impor a «ordem russa» a todo o mundo eslavófilo, e não só. É nesta ordem de ideias que se enquadra o sinistro plano de Putin de querer eliminar a Ucrânia, pelo facto deste país eslavo ter consagrado na sua constituição posições políticas alinhadas com o Ocidente. Contrariamente a este bloco geopolítico, a Rússia nunca viveu em democracia, já que do czarismo passou ao comunismo de estado, e do comunismo de estado a um totalitarismo mitigado, onde o todo-poderoso partido do poder permite que gravitem à sua volta uns quantos «partidos» controlados por forças submissas e antiocidentais. Os verdadeiros opositores do regime, esses, são perseguidos, presos, mortos, torturados, envenenados… Porém, o controlo das ordens interna e externa, sempre exigiu de S. Petersburgo e de Moscovo a manutenção de um exército colossal – chegou a ter cinco milhões de soldados –, de uma gigantesca máquina de propaganda ideológica, cuja influência se estende a todo o mundo, inclusive à África pobre e à América do Sul não menos pobre, e de uma complexa rede de espionagem, igualmente disseminada nos cinco continentes. Este gigantesco esforço na capacitação da sua máquina de guerra, bem como na sustentação do numeroso comissariado político-económico, tem vindo a absorver, cada vez mais, o grosso da riqueza produzida pelo país. Apesar de ser fabulosamente rica em matérias-primas, a Rússia tem um PIB semelhante ao de Espanha, que é três vezes menor em população, e tem um salário mínimo equivalente a 200 euros, quando o português é de 705 euros. A Rússia dispõe de condições excecionais para proporcionar a melhoria da qualidade de vida a todo o seu povo, desde que invista menos em guerra e mais em economia, ciência, cultura, educação... Todavia, os vários setores da atividade económica precisam de liberdade, de justiça social, de confiança nas instituições e de repartição equitativa da riqueza nacional, pois é incompreensível que, no dealbar do século XXI, a Federação Russa ocupe uma modesta 52.ª posição no índice de desenvolvimento humano. Num país onde todos os dias entram somas fabulosas de capitais estrangeiros, é chocante saber que, enquanto muitos dos seus cidadãos não têm água canalisada, energia elétrica, saneamento, assistência na saúde… uma minoria de altos quadros do aparelho de estado, uma oligarquia corrupta e escandalosamente rica e umas quantas corporações ligadas ao crime organizado vegetem no luxo, na avareza e no desprezo pelo próximo. Em suma, com uma política de guerra, com uma economia de guerra e com uma cultura de guerra, a Rússia não se modernizará, nem emergirá das sombras da morte para de novo encantar o mundo com os seus bailados, as suas óperas, as suas sinfonias, os seus feitos atléticos, os seus romances... Da Rússia, não queremos mísseis de alta precisão, bombas de fragmentação, ogivas nucleares, matanças de inocentes, ameaças de juízo final, ódio assassino; da Rússia queremos outro Diaghilev, outro Pushkin, outro Tchaikovsky, outra Anna Pavlova, outro Lev Yashin, outro Tchekhov, outro Tolstoi, outro Dostoievski… Sim, venha um novo «Eugene Onegin», um novo «Quebra-Nozes», uma nova «Morte do Cisne», um novo «Tio Vânia», um novo «Guerra e Paz», um novo «Os Irmãos Karamazov»… Venha tudo isso, a bem do povo russo e da humanidade.
Autor: Fernando Pinheiro
DM

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26 julho 2022