Falar ou dissertar sobre o futebol é, para muita gente, simplesmente inebriante e ao mesmo tempo motivo de grande insatisfação. Há quem se sinta desconfortável com esta situação dúbia e danosa que se passa, particularmente, na casa dos três grandes clubes nacionais.
Viver o clubismo é uma transcendência que catapulta o adepto fervoroso para zonas de alienação inexplicáveis à luz da razão. Como resultado deste exagero clubista e desta deriva do futebol marcada pela impunidade e pela falta de transparência nos actos futebolísticos, temos um cenário cada vez mais crispado e mais nebuloso com violência e enxovalho à mistura que vai retirando do futebol todo o élan positivo que este desporto encerra.
Ponto um – Em contraponto, os outros, os marginais da bola, os que não entram nesta verborreia discursiva ou nesta doença crónica, limitam-se a desligar a rede comunicativa e a questionar como é possível perder-se tanto tempo em discutir arranjos e desarranjos de resultados e gastar-se tanto latim em assuntos viciados e cheios de mazelas putrefactas.
No futebol não há verdade desportiva, é a versão já normalizada, porque os interesses (poder, influência, dinheiro) são demasiados e incontornáveis. Portugal, é um dos países que vive capturado pela “incultura” do futebol. É pena, porque o futebol tem potencial social, económico e de lazer para se tornar um pólo activo de progresso, de bem-estar e de socialização.
Ponto dois – O futebol tem, de facto, adeptos fervorosos que respiram, comem, pensam, adormecem e vivem unicamente em função da bola. Bola, só bola e nada mais interessa. O futebol parece ser a razão da sua existência, das suas necessidades e das suas preocupações.
De segunda a segunda, sempre as mesmas discussões, o mesmo contraditório, o mesmo fanatismo, baseado num argumentário pobre e repetitivo. A defesa do nosso clube custe o que custar, doa a quem doer, está sempre em primeiro lugar. Não importa como o defendamos. Sempre o nosso clube a vencer, nem que seja por linhas travessas e obtusas.
Ponto três – Todos os dias, surgem novos casos para lamentar. Casos sempre duvidosos, com laivos de opacidade significativos e com incursões perigosas para a verdade desportiva e para o bom nome desta poderosa “indústria”, que gera negócios na ordem dos biliões de euros. Agora, em cima da mesa da escandaleira futebolística, está a bronca do “Pagar para Perder”. Esta história não é nova. Sempre se falou disto. Nos bastidores e abertamente. Em toda a parte.
Toda a gente sabe o que se passa. Negócios envolvendo compra de jogadores como mercadoria se tratasse, encomenda de árbitros, manipulação de dirigentes associativos e tudo isto feito numa lógica perceptível e que se espalha pelo universo do futebol, atingindo todos os campeonatos a nível nacional e mesmo regional.
Ponto quatro – No caso mediático é vergonhoso “Pagar para Perder”, a diferença em relação a outros badalados e não investigados suficientemente, reside na sua denúncia. São os próprios protagonistas (atletas) a colocar a boca no trombone. Um pouco tarde, é verdade, mas ainda a tempo de se fazer uma investigação rigorosa para se apurarem responsabilidades e punir severamente os prevaricadores.
Vai ser difícil de se arranjar provas directas. Era virtuoso, contudo, conseguir-se essas provas até para se extirpar o mal pela raiz e limpar a podridão que grassa nesta modalidade desportiva que é paixão de muita boa gente.
Ponto cinco – Para finalizar, recordo o célebre” Apito Dourado”. Dizia a procuradora adjunta, Maria José Morgado, no tempo, que a resolução deste caso poria em questão a eficácia e a idoneidade da Justiça. O que aconteceu foi justamente a absolvição dos acusados, o que contraria em absoluto o resultado esperado. A Justiça falhou clamorosamente para aqueles que queriam o futebol limpo.
Por aqui se vêem as fragilidades de um sistema judiciário que não foi capaz de provar os crimes com celeridade e clareza para poder condenar o que parecia “óbvio”. O gigante do futebol tudo domina de mãos dadas com a famosa impunidade lusa.
Autor: Armindo Oliveira