Escrevi ainda há bem pouco tempo no DM que na política não há amigos. Esta é a minha plena e assumida convicção. Talvez agora mais inclinado para a certeza.
Basta estar um pouco atento ao que se passa neste país, para ver e sentir que todos os dias vão surgindo, já sem espanto, problemas sérios de relacionamento institucional, coisas dúbias e escândalos para todos os gostos.
Podemos ver traições e ingratidões de quem menos se esperava. Sentir desonras e vergonhas extemporâneas. Aperceber-se de cinismos e de irresponsabilidades. Conviver com golpadas, embustes e fingimentos.
E apesar destes enfeites descoloridos, a democracia, a democracia dos mesmos de sempre e para os mesmos de sempre, lá vai resistindo, com chama ténue e com pouco alento, a esta marcha sonolenta e atávica, diluindo-se a alma sonhadora que despontou na madrugada de Abril.
Ponto um – Sim, na política não há amigos, com certeza. O exemplo Sócrates/Costa é bem paradigmático desta triste realidade. Na política, na nossa política, há e desenvolvem-se interesses, conveniências e jogos de poder. Na nossa política, traficam-se influências, bajula-se o chefe e arranjam-se lugares a preceito. Nada é novidade.
Às vezes, vemos uns novatos, até valiosos, mas que tiveram a veleidade de desafinar da voz roufenha do chefe e ficam a saber o que lhes poderá acontecer: são inevitavelmente postos à margem dos órgãos do poder a favor daqueles que se vergam servilmente.
É isto que importa para os líderes: servir. Pois, claro, há muitos Galambas nos partidos. Os outros, os tais «barões» que estão no topo da hierarquia dos partidos não permitem que a «soldadesca» lhes retirem o seu pedestal e lhes chamusquem a ambição desmedida de estarem sempre na ribalta. É assim que funciona e vai funcionando a democracia lusa.
Ponto dois – Por tacticismo eleitoral, por falta de uma postura política equilibrada e por medo que o problema lhes caísse em cima da cabeça, a frente jacobina socialista (Costa, Galamba, César, Santos Silva e Catarina Mendes) esquartejaram a idoneidade do «Animal Feroz» com os gumes afiados da vergonha e da desonra.
Só agora, é que, essa gente viu a vergonha e a desonra a atingir a inocência do seu partido imaculado. Só agora, é que, essa gente entendeu que era a altura certa para sacudir do partido esta figura tão deprimente (?) que lhes garantiu em 2005 a única maioria absoluta. Não foi esse «renegado» que lhes estendeu a passadeira vermelha do poder?
Ainda estou a ver nas televisões, nos jornais e em todo o lado, o desfile ridículo de figuras insipientes que se colavam a Sócrates para se reposicionarem na fila dos bajuladores. E lá estavam eles sem críticas, sem vergonhas e sem desonras. Cordatos e risonhos. Mansos e muito mansos pavoneavam-se em comícios engalanados ou em palestras contratadas.
Esta ingratidão é típica dessa gente, que irradia solidariedade por todos os poros, mas que só conhece o caminho da sua própria ambição e dos seus próprios interesses.
Em momentos de aperto, atropelam tudo e todos e, quando se veem incomodados, não têm pejo em sentenciar com desonra e vergonha quem era considerado o melhor dos seus. E são estes os políticos da ética republicana e das grandes causas sociais. Por favor, não façam dos portugueses uns néscios e uns pacóvios!
Ponto três – Normalmente, na capital, dentro daquelas paredes, velhas e desbotadas, os ninhos políticos engendram as soluções miraculosas para salvar o país. Se é com gente de pouca valia e amorfa não interessa.
O que interessa é o servilismo ao partido e ao chefe. Nas alturas adequadas lá aparecem eles, altivos e defensores das causas públicas, nos lugares de eleição, sempre ao arrepio dos reais interesses da transparência, da ética e da verdadeira representatividade popular.
Não é aceitável que, por exemplo, os cabeças de listas partidários sejam indigitados por livre-arbítrio do líder para nos representar na Assembleia da Republica, contrariando o razoável e as necessidades de ser o próprio distrito a ter esta função de escolher os seus melhores.
Os arranjinhos das cúpulas levam a fazer recrutamentos estratégicos no círculo dos amigos ou dos apaniguados. Não será este um dos factores vitais que faz disparar a abstenção eleitoral para números colossais?
Autor: Armindo Oliveira