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Pela igualdade e democracia

Nos últimos tempos, temos assistido a um aumento progressivo de crispação na opinião pública, sobretudo depois do bárbaro assassinato do cidadão afro-americano George Floyd, ocorrido em Minneapolis nos EUA, no passado dia 25 de maio e cometido pelo polícia branco Derek Chauvin. Este trágico homicídio, documentado em imagens que correram o mundo, constituiu o rastilho para a proliferação de manifestações pela igualdade e contra o racismo não só em diversas cidades americanas, como também em muitas outras de diferentes continentes. O que inicialmente parecia ser um ato de repúdio contra as desigualdades e de fundada revolta contra o modus operandi da polícia americana, rapidamente se transformou em autênticas batalhas de violência e de ódio, onde o vandalismo e a destruição estavam quase sempre presentes. Este cenário estendeu-se a inúmeras latitudes e rapidamente se transformou num aparente ajuste de contas com a História, levando multidões à profanação de símbolos do passado, como a destruição de estátuas, sem a racional preocupação de os contextualizar no tempo e no espaço. Foi assim que com estupefação vimos maltratar as figuras de Winston Churchill, notável estadista e defensor acérrimo da liberdade e da democracia, de Abraham Lincoln, 16.º presidente americano que aboliu a escravatura e, entre nós, o Padre António Vieira, missionário, filósofo e escritor português defensor dos direitos dos povos indígenas do Brasil. A violência sempre esteve presente na história da Humanidade. Ao longo dos séculos, as carnificinas e as diferentes formas de servidão, a pretexto da conquista ou da manutenção do poder, revelaram constantemente uma profunda indiferença pelo valor da vida humana. Foi assim em diversos momentos da História da Humanidade e, em pleno século XX, tivemos a ascensão e queda de regimes como o nazi, o fascista e o comunista que espalharam a tortura, o medo e a morte e foram responsáveis pelos maiores morticínios alguma vez conhecidos. Em defesa da nossa civilização, da democracia e da paz, não podemos esquecer os ensinamentos do passado. Quando testemunhamos uma crescente crispação da sociedade inspirada em várias intolerâncias, é preciso que cada cidadão, em comunhão com todas as forças que têm na sua génese os valores humanistas, não se alheie do que se passa à sua volta. É urgente estar vigilante e não se deixar capturar nem pela demagogia, nem pelo oportunismo. É essencial cultivar o bom senso e não pactuar com todos aqueles que mais não pretendem senão inverter o sentido da história. Exige-se que se continue a dar uma resposta firme à pobreza e se pugne por uma igualdade de oportunidades para todos, independentemente da raça, religião ou condição social de cada um. A crise multifacetada, resultante da pandemia que ainda há pouco nos bateu à porta e para a qual ainda nem todos acordaram, é mais um grande desafio que temos de ultrapassar. As suas consequências, mais visíveis ou mais ocultas, depressa se vêm manifestando. A nível económico os seus efeitos não se fizeram esperar. O desemprego e a perda de rendimentos de milhares de cidadãos atiraram muitos deles para a privação dos bens mais elementares como a alimentação. O confinamento a que fomos obrigados, principalmente a quem não possui satisfatórias condições de habitação, deixou em muitos sequelas na saúde mental, difíceis de superar sem um apoio especializado. As crianças em idade escolar, sobretudo as mais vulneráveis, arriscam-se a perder o comboio das chances que a Escola proporciona e é bom não esquecer que cerca de 15% desta população não possui nem computador, nem acesso a internet. Neste último aspeto, é bom lembrar que há algumas instituições de ensino, maioritariamente privadas, que se preparam para no próximo mês de setembro proporcionarem aos seus alunos programas de recuperação das matérias ministradas à distância. Há muitos estudantes, nomeadamente os dos primeiros anos do ensino primário, que não estão convenientemente preparados para transitarem de ano. Se nos lembrarmos que a Educação é a maior arma de combate às desigualdades, será fundamental que o ministério que a tutela não se esqueça dos milhares de alunos que, se nada for feito, se arriscam a perder definitivamente a única oportunidade de escalarem o elevador social.
Autor: J. M. Gonçalves de Oliveira
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23 junho 2020