A associação Conquistas da Revolução, através do seu presidente, Manuel Begonha, propôs, na última reunião pública da Câmara de Lisboa, erguer um monumento em homenagem ao general Vasco Gonçalves para assinalar o centenário do seu nascimento.
Ao que parece, fruto de distração ou momentâneo esquecimento do que foi o PREC (Processo Revolucionário em Curso), o presidente do executivo da capital, Carlos Moedas, num primeiro tempo anuiu sem hesitações, vindo posteriormente a negar tal intenção. Este intento mereceu não só protestos da oposição, como também da coligação “Novos tempos” (PSD, CDS, Aliança, MPT e PPM) que dirige o concelho lisboeta.
Se nos lembrarmos do que foram os II, III, IV e V Governos Provisórios, liderados por Vasco Gonçalves fortemente conotado com o Partido Comunista, que governaram Portugal entre 18 de julho de 1974 e 19 de setembro de 1975, esta reação tão espontânea e maioritária não é de admirar, nem sequer merece um aplauso especial.
Durante este período conturbadíssimo que colocou o país à beira da guerra civil, assistiu-se a prisões arbitrárias, a saneamentos discricionários, à nacionalização da banca, dos seguros e de outras grandes empresas, à implementação da Reforma Agrária com ocupação selvagem de terras e outras propriedades que quase feriu de morte uma economia já de si depauperada, levando a um marcado retrocesso civilizacional.
Em paralelo, iniciou-se o processo de descolonização apressado e desorganizado que fez regressar ao país milhares de portugueses das colónias de África, muitos deles deixando para trás pecúlios de uma vida e sonhos desfeitos.
A insegurança e a desordem andavam de mãos dadas e muitos portugueses mais endinheirados, uns por razões políticas, outros apenas por medo, não hesitaram em partir para o exílio no Brasil, Espanha e outras paragens, tamanho era o caos e a incerteza.
Esta situação catastrófica, que visava a implementação de um regime totalitário de esquerda, só veio a terminar em 25 de novembro de 1975, por ação dos militares moderados onde se destacaram, entre outros, Ramalho Eanes e Jaime Neves, apoiados pelas forças políticas à direita do PCP, incluindo o PS de Mário Soares, o PSD de Sá Carneiro e o CDS de Freitas do Amaral. Foi um momento determinante que pôs fim à revolução e iniciou a normalização democrática do país que hoje desfrutamos.
O que seria Portugal no presente sem estes desvarios? O que seria este país se tivesse conseguido uma transição pacífica da ditadura para a democracia, à semelhança da nossa vizinha Espanha?
Nesta brevíssima síntese, realço o papel de Vasco Gonçalves como timoneiro de uma revolução que pretendia instaurar em Portugal um regime totalitário de esquerda e em que Mário Soares assumiu um papel fulcral na defesa da liberdade e na implementação de um regime democrático de estilo ocidental.
A marca do primeiro-ministro dos governos provisórios já está plasmada na História de Portugal como um homem que tentou substituir uma velha ditadura por uma outra de sinal contrário, mas não menos feroz e redutora de todos os direitos humanos.
Não merece mais nada e junto-me a quantos mostraram a sua indignação à ideia de o homenagear e não posso deixar de lamentar o equívoco cometido por Carlos Moedas.
Para que o tempo não apague a memória, recomendo às gerações mais novas que se informem do que foi o PREC, também conhecido por “gonçalvismo”.
Hoje, mais do que em tempo algum, é fácil e rápido obter informação sobre aquele e outros momentos negros da nossa história coletiva. À semelhança duma boa vacina, o seu conhecimento desenvolverá anticorpos suficientes para combater qualquer forma de populismo que atente contra a liberdade e a democracia. No seu recente livro autobiográfico “Cebola Crua com Sal e Broa” – Da infância para o mundo”, Miguel Sousa Tavares recorda esses tempos difíceis com rigor e clarividência.
Para que o tempo não apague a memória que leve ao desleixo de descurar a defesa da liberdade e da democracia, é preciso revisitar o passado.
Autor: J. M. Gonçalves de Oliveira