O interlocutor parou, olhou-o com altivez de cima para baixo, e respondeu: “Não, meu amigo, não é manco... Vivemos num mundo de aldrabões e, como diz o ditado, para “aldrabão, aldrabão e meio”. Esse negociante – que tem a mania que é espertalhão – começou por me pedir um preço exorbitante. Então, à socapa, piquei o cavalo numa pata com um prego pequeno que levava entre mãos. Começou a mancar e o preço desceu... É preciso não se ser ingénuo no mundo em que vivemos...”.
O nosso bom homem, sentiu-se na obrigação de informar o vendedor, explicando-lhe a malícia do seu último cliente. Não se inquietou. “Meu caro amigo, respondeu-lhe com calma. Vivemos num mundo de aldrabões e, como diz o ditado, “para aldrabão, aldrabão e meio”. O meu comprador é um papalvo e não entende nada de cavalos. Picou a pata errada. Eu percebi o que ele estava a fazer... O cavalo é, de facto, manco, mas da outra pata...”.
Perplexo, voltou para junto do novo dono do animal em questão, com uma pena aumentada e em nada diminuída pelo abatimento que o vendedor tinha feito à pileca que despachara. Interpelou-o de novo. “Meu bom amigo, o cavalo que comprou, afinal, sempre é manco, acaba de me confessar o vendedor. Mas da pata que o senhor não picou... Ou seja, picou a pata sã, não a aleijada”.
Muito lívido, com cara de indignado, recompôs-se a pouco e pouco do choque recebido. Mais sereno, e voltando à atitude altiva, observou: “Que poderei dizer-lhe?... “Para aldrabão, aldrabão e meio”.! Malandro! Desonesto!... Imagine a minha situação, se eu não tivesse tido a precaução de fechar o negócio que fiz com notas falsas...”. E desapareceu, entre a multidão, levando à trela a sua compra...
É impossível a honestidade, com esta atitude perante as relações humanas. E a verdade é que ela encontra adeptos entre muito boa gente, na suposição de que tudo é relativo e não devemos criar ilusões incautas quanto à qualidade do nosso comportamento.
Autor: Pe. Rui Rosas da Silva
