A segunda leitura deste Domingo (XXVIII do Tempo Comum, Ano B) afirma textualmente que “a Palavra de Deus é viva, eficaz e mais afiada que uma espada de dois gumes; penetra até à divisão da alma e do corpo, das articulações e das medulas, e discerne os sentimentos e intenções do coração” (Hb 4, 12). Trata-se de um elogio da Palavra de Deus, sublinhando a sua eficácia e capacidade de discernimento, num dos textos bíblicos que melhor diz as suas propriedades, efeitos e alcance.
No sentido de reforçar e tornar mais compreensível a afirmação, é nosso propósito apresentar alguns textos bíblicos e documentos da Igreja que nos falam da dimensão viva e eficaz desta Palavra que transforma vidas e suscita acontecimentos. Tratando-se de uma Palavra que atua na criação e na história, em ordem à salvação, a Sagrada Escritura que documenta a sua eficácia, como se deduz do texto supracitado e dos que, a seguir, se apresentam.
- A Palavra de Deus é viva e geradora de vida, possui força criadora, como se pode ver em Gn 1, 3 (“Deus disse: ‘Faça-se a luz’. E a luz foi feita”) e em Jo 6, 63 (“as palavras que vos disse são espírito e vida”).
- Como tal, possui uma enorme força transformadora e dinamizadora: “Assim como a chuva e a neve descem do céu e não voltam mais para lá, senão depois de empapar a terra, de a fecundar e fazer germinar, para que dê semente ao semeador e pão para comer, o mesmo sucede à palavra que sai da minha boca: não voltará para mim vazia, sem ter realizado a minha vontade e sem cumprir a sua missão” (Is 55, 10-11).
- Além disso, a Palavra de Deus possui um alcance pedagógico notável e incontornável: “Desde a infância conheces a Sagrada Escritura que te pode instruir, em ordem à salvação pela fé em Cristo Jesus. De facto, toda a Escritura é inspirada por Deus e adequada para ensinar, refutar, corrigir e educar na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e esteja preparado para toda a obra boa” (2 Tm 3, 15-17).
- Por último, a Palavra de Deus, que “não pode ser acorrentada” (2 Tm 2, 9), possui uma força libertadora e salvífica, como se deduz de Rm 1, 16 (“Não me envergonho do Evangelho, pois ele é poder de Deus para a salvação de todo o crente”) e de Tg 1, 21 (“Rejeitai toda a imundície e todo o vestígio de malícia e recebei com mansidão a Palavra em vós semeada, a qual pode salvar as vossas almas”).
Os documentos da Igreja também sublinham estes dois atributos da Palavra de Deus: viva e eficaz.
- “Esta é a força própria e singular da Sagrada Escritura, inspirada pelo Espírito Santo, que dá autoridade ao orador sagrado (...) e lhe confere eloquência robusta e convincente. De facto, quem no seu discurso tem a força espiritual da Palavra de Deus, não fala só com palavras, mas também com força, com o Espírito Santo, com plenitude” (Leão XIII, Providentissimus Deus, in Enchiridion Biblicum, 87).
- “A Página Sagrada, redigida por inspiração do Espírito de Deus, (...) dotada de poder divino, tem força em si; adornada de beleza sublime, por si resplandece e brilha. Basta que o intérprete a explique íntegra e exatamente, para virem a lume os tesouros da sabedoria e prudência que encerra” (Pio XII, Divino afflante Spiritu, in EB, 553).
- “Nos Livros Sagrados, o Pai que está nos céus vem amorosamente ao encontro dos seus filhos e conversa com eles; e tão grande é a força e a virtude da Palavra de Deus, que ela se torna a força e o vigor da Igreja e fortaleza da fé para os seus filhos, alimento da alma, fonte pura e perene de vida espiritual! Por isso, excelentemente convém à Sagrada Escritura estas palavras: ‘A palavra de Deus é viva, eficaz’ (Hb 4, 12) e ‘tem o poder de construir o edifício e de vos conceder parte na herança com todos os santificados’ (At 20, 32; cfr. 1 Ts 2, 13)” (Concílio Ecuménico Vaticano II, Dei Verbum, nº 21).
Mais do que peça de museu ou monumento literário, a Sagrada Escritura, expressão escrita da Palavra de Deus, é um testemunho de fé, promovido pelo Espírito, no momento da sua redação e leitura. Como diz Armindo Vaz, “a sua eficácia é testemunhada na vida de uma comunidade crente que se submete à sua fecundidade” (Palavra viva, Escritura poderosa, p. 97), depois de a aceitar como palavra fundadora e normativa.
Autor: P. João Alberto Correia