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País de altos e baixos

Apenas intervaladas de dois dias, mais duas tragédias aconteceram no país; e a lembrar que, se temos sido perseguidos pelo infortúnio, muito mais devíamos fazer para o controlar e evitar. A primeira tragédia ocorreu, há alguns dias, na freguesia de Fermentões, concelho se Sabrosa e região de Trás-os-Montes, atingindo uma família de cinco membros (duas crianças e três adultos); e todos perderam a vida, intoxicados por monóxido de carbono, segundo os resultados preliminares das autópsias. Esta família que trabalhava numa quinta agrícola do Douro deslocava-se, aos fins-de-semana, para Fermentões a fim de executar obras de reconstrução no seu casebre, casa não se lhe podia chamar, que desejava habitar definitivamente quando pronta; e, como não tinha eletricidade, recorria a um gerador como único recurso para conseguir energia e, obviamente, as mínimas condições de habitabilidade; e seria o fumo do gerador que esteve na origem do trágico acontecimento. A segunda tragédia ocorreu na estrada nacional 255 que liga Borba a Vila Viçosa, no Alentejo; e esta foi provocada por uma derrocada desta estrada, numa zona de pedreiras e concretamente numa pedreira com cerca de 90 metros de profundidade dos quais 40 cobertos de água. Esta derrocada engoliu uma escavadora que operava no local juntamente com dois trabalhadores e duas viaturas que, no momento, ali passavam e transportavam algumas pessoas. Sabe-se que, pelo menos há quatro anos, esta estrada foi considerada perigosa e, como tal, se tinha construído uma variante para retirar o tráfego desta estrada nacional; todavia, muitos automobilistas e camionistas continuavam frequentemente a utilizá-la. Pois bem, em ambas as situações estão presentes fenómenos de negligência, inércia, desatenção e menosprezo do poder locais e, sobretudo, do poder central que devem controlar, corrigir, fiscalizar e penalizar a atividade pública; mas que, permanentemente se esquecem destes seus deveres e, mais grave, do país real em prol da conquista e manutenção do poder a todo o custo, construindo um mundo cor de rosa que tentam impingir ao povo. Por exemplo, enquanto a família de Trás-os-Montes habitava um casebre sem as condições básicas de habitabilidade, o governo oferece 110 milhões de euros para que a Web Summit fique em Lisboa durante uma década; e igualmente faz da tecnologia bandeira que agita para o exterior, como marca da sua mundividência. E como esta acidentada família, milhares de outras vivem no limiar da pobreza e da sobrevivência e em sérios riscos de infortúnios e tragédias; e que devem servir de permanente alerta a governantes e políticos quase sempre afastados e esquecidos destas realidades em que parte do país vive mergulhada. O caso da tragédia provocada pela derrocada na estrada de Borba - Vila Viçosa aponta para falta de rigor, competência e empenho na gestão da coisa pública, tal como aconteceu, por exemplo, com os incêndios de Pedrógão Grande que vitimaram centenas de pessoas; porque se a estrada estava considerada perigosa e ameaçava tragédia, porque não se impediu o seu uso fechando-a ao trânsito? Como igualmente porque se não acautelou o uso das pedreiras que, dado o seu estado de permanente ameaça, se tornaram num evidente e eminente perigo? Pois é, como sempre acontece, só depois da casa roubada é que se colocam trancas na porta; ou seja, só depois das tragédias é que se bate com a mão no peito, se enviam condolências, se chora sobre o leite derramado; e se tomam medidas apresadas e atabalhoadas e, nem sempre, devidamente congruentes, ponderadas e eficazes. E isto com a agravante de que a culpa morre quase sempre solteira; ou mais tristemente e injustamente pende, desgraçadamente, para o lado que é, por natureza sociológica, o lado dos mais fracos, onde a justiça chega, mas nem sempre com o necessário grau de imparcialidade e rigor. Que havemos de fazer, somos assim mesmo e já ao longo de muitos séculos de História: um povo que, apesar de perseguido muitas vezes pelo infortúnio e pela má sorte, pouco ou nada faz para os contrariar e evitar; que é como quem diz: nunca aprende nada com as desgraças ou, quando muito, conforma-se e dorme descansado sobre elas. O que caso é para praguejar: - Porra. vai cá uma nortada! Então, até de hoje a oito.
Autor: Dinis Salgado
DM

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28 novembro 2018