1 – Não é novidade nenhuma que vivemos um período tóxico de «politicamente correcto». Em todas as idades assim foi, mas, nesta e aqui, o seu império tornou-se de tal forma despótico que passou de pensamento habitualmente inóquo a pensamento tóxico – tóxico como tudo o que é demasia, excesso, desmesura. Como todo o remédio que, por abuso, se torna veneno.
2 – Cá entre nós está na moda ideológica (as ideologias têm tanto de moda quanto a alta costura), atribuir aos animais irracionais dignidade semelhante à da pessoa humana. Por outras palavras: pôr no mesmo plano racionais e irracionais – o que, só por si, é uma evidente irracionalidade.
3 – Enquanto aos racionais se negam (ou, no mínimo, se negligenciam) direitos elementares como o direito à vida, à saúde, à justiça, ao bem-estar, à dignidade, aos irracionais vão-se atribuindo (ou inventando?) direitos. Direitos de uma nova espécie, até aqui desconhecida: direitos sem deveres.
4 – Assim como não há moedas de uma só face (uma impossibilidade lógica), também não há direitos de uma só face – têm sempre uma outra, chamada dever.
Quando eu vou à livraria comprar um livro, ao meu direito de o adquirir corresponde o meu dever de o pagar; inversamente, ao direito do livreiro de o cobrar corresponde o dever de o entregar. Ao dever dos Pais de educarem, cuidarem e amarem os filhos, corresponde o direito de por eles serem obedecidos, respeitados e amados. Os exemplos – materiais ou morais – podem estender-se ao infinito.
Até o Monsieur de La Palisse percebe isto.
Simples? Elementar? Primário? Com certeza. Mas ignorado pelo último grito do politicamente correcto.
5 – Não sendo os irracionais passíveis de deveres (precisamente porque são irracionais), também não serão nunca sujeitos de direitos – por mais que a lei diga o contrário. Porque se a lei disser que os triângulos passam a ter quatro lados, eles continuarão, na realidade, a ter três. Até ao fim dos séculos.
6 – Quando os racionais pretendem, por artifícios legais ou outros, dar dignidade racional aos irracionais, não são estes que se racionalizam. São aqueles que perdem a racionalidade. E a razão.
Nota: por decisão do autor este texto não obedece ao impropriamente chamado acordo ortográfico.
Autor: M. Moura Pacheco