As autárquicas mexem com muitos candidatos pertencentes a partidos políticos e com aqueles que se dizem independentes. E estes, ao que consta, são muitos e começam a assustar os partidos políticos. Mas quem são estes independentes? Há os desiludidos, aqueles que perderam a ilusão sobre os políticos, em geral; os enraivecidos que pertenciam a um partido e agora foram preteridos; os ex-autarcas que sonham voltar ao lugar onde já foram poder e, por último, há um número residual que pensa salvar o mundo com uma gestão honesta e transparente. O aparecimento de independentes nas próximas eleições autárquicas pode determinar esta coisa singular: ter os partidos que os apoiar, em vez de ser eles a pedirem apoio aos partidos. Esta inversão já se deu no Porto com Rui Moreira e pode vir a dar-se em outras autarquias. Com independentes como o do Porto, estaremos em vésperas de ressuscitar os “homens bons” dos princípios dos concelhos? Da bondade dos homens bons não sei, mas sei que os independentes encarnam um sentimento geral de descrédito popular contra os partidos políticos. E porquê este descrédito se a democracia se faz com os partidos? Porque os partidos põem os seus interesses partidários em detrimento dos interesses das populações; começam por prometer o que não podem e acabam por não fazer o que prometem. Há um evidente descrédito viral nos políticos porque o que era credo passou a rédito, isto é, a população vê na política uma barrigada para alguns. Se voltássemos aos tempos dos homens bons, readquiria-se a jóia de família que há muito está no fundo da gaveta, isto é, a credibilidade nos homens da governança. Voltávamos à génese do poder para os voluntários em vez do poder dos mercenários. Esta refundação não se pode aplicar aos políticos de hoje. Ninguém lhes pode exigir que governem de graça. Foi tempo em que as famílias se arruinavam por causa da política. Voltemos aos nossos tempos e verificamos que os ditos independentes também não são assim tão independentes como se anunciam; estão também dependentes de muitas coisas: ambições, rivalidades, revanchismos, desforras e interesses pessoais; tornam- se, deste jeito, dependentes dos seus desejos. São igualmente dependentes só que de outros interesses. Na verdade não há intenções puras; até daquelas que prodigalizam afetos pessoais, espera-se sempre um retorno. Caso contrário serão chamados de ingratos. Quando aparece um candidato envolto em propaganda independente, pergunto-me sempre a que interesses se sujeita. São mais honestos os candidatos partidários porque se apresentam sem disfarce de independentes. Têm cor e bandeira. Têm interesses pessoais e de grupo. Conhecemos-lhes o jeito, a inclinação e a reverência. Se alguém vota neles e depois se espanta com a sua governação, ou é ingénuo ou anda a dormir na forma. Eles pertencem a um partido e a ele se sujeita. Quem é mandado não é mandante. Quem é criado é moço de recados. Mas apesar dessa sujeição ou dependência, basta que tenham o bom senso de agradar aos eleitores para que o partido os recomende para a próxima eleição. Se não, não. Há, então, candidatos que são dependentes partidários e os outros dependentes. Poderemos pensar que um dia possamos vir a ter candidatos totalmente independentes? Sim, quando o robô substituir o homem e mesmo assim só quando o robô se programar a si mesmo. Não há neutralidade no ser humano. Nem a razão é completamente independente. Nada está na razão que não tenha passado pela emoção. Todo o ato humano é um reflexo dessas sensações.
Autor: Paulo Fafe