Os seus biógrafos relatam que quando se teve de fixar a idade da reforma, ele terá dito: “Quanto a mim, gostaria bem de ter parado aos 65!” Foi assim que essa idade foi tomada como uma referência. Recorde-se que, naquela época, a esperança média de vida para os trabalhadores ainda vivos pouco passava dos ditos 65 anos. Foi necessário esperar por 1945, para que um regime análogo fosse aplicado em França, pelos decretos que criaram a Segurança Social na sequência da Segunda Guerra Mundial.
Se bem que estas medidas sejam primeiramente sociais, elas vão ter importantes repercussões na vivência pessoal dessa fase etária. A passagem à reforma implica, com efeito, toda uma série de consequências que contribuem para mudar bastante radicalmente a vida das pessoas. O fim da vida ativa altera o tempo da pessoa, que deixa de ser ritmado pelo condicionamento do trabalho.
A imagem de si mesmo vê-se, então, afetada, uma vez que o sentimento de utilidade produzido pela atividade profissional desvanece. Por exemplo, a vida no casal conhece uma nova organização com uma presença mais permanente no lar, que, por vezes, pode causar alguns problemas, mas que deve, sobretudo, ser aproveitada para proporcionar uma renovação e um fortalecimento da vida conjugal e familiar. As relações intergeracionais podem sofrer fricções se não se souber adaptar a essa nova situação.
O mesmo se passa com as relações sociais, uma vez que o trabalho é uma fonte incontornável de socialização que desaparece com a reforma. Esta passagem pode induzir, pois, situações de crise, suscetíveis de perturbar o equilíbrio psicológico das pessoas que, em alguns casos, pode implicar a intervenção do psicólogo. Um sentimento que deve ser acautelado é o de uma certa inutilidade que pode apoquentar a vivência do aposentado, pelo menos nos seus primeiros tempos. Com efeito, o trabalho exerce-se mais frequentemente num contexto de relações sociais, pois não são muitas as profissões que permitem trabalhar sozinho e de um modo independente.
A relação com os outros pode ser mais ou menos bem vivida, mas é necessária com os colegas ou, então, com os clientes nas profissões de serviços ou comerciais. O fim da vida ativa priva a pessoa, de forma súbita e radical, do conjunto dessas relações sociais. Neste contexto, tanto o reformado como aqueles que com ele vivem têm que, não só preparar essa situação, mas, sobretudo, criar novos hábitos de ocupação do tempo e novas relações sociais que sejam capazes de proporcionar um adequado equilíbrio psicológico em todos eles. A pessoa reformada vai ter de se tornar ativa e voluntarista face a essas relações, escolhendo agora mais livremente novas ocupações, tornando-se socialmente útil, tanto no quadro familiar, como, nomeadamente, no quadro associativo ou no voluntariado. Estas novas tarefas vão evitar o isolamento pessoal e a possibilidade de se contraírem certos vícios ou até maleitas (como é o caso da depressão) que o excesso de tempos livres ociosos pode facilmente originar.
A situação de reformado nos casais deve ser aproveitada para uma reorganização e renovação da vida no lar. A vivência familiar é, muitas vezes, afetada pelo trabalho profissional, nomeadamente devido à distância geográfica em que ele é exercido ou à dessincronização de horários entre os membros da mesma família. Então, os casais podem fruir da situação de reformados, encarando-a como uma oportunidade de renascimento que lhes irá permitir, finalmente, viver mais horas juntos e ter até atividades comuns.
Autor: Artur Gonçalves Fernandes