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Os criados de maus amos

Dizem lá: – Ama os teus amos;

São pais e Deus, a teu lado. –

Mas, de Deus, sou criatura;

Dos meus amos, sou criado!

 

Levanto-me ao romper de alva,

Antes, às vezes, e a medo:

Que me não ralhem da aurora

Não ter luzido mais cedo.

 

Sempre é de mais o meu pão,

De mais a sombra e o borralho…

Não sou gente, não sou alma:

Sou pés e mãos, – sou trabalho!

 

Ó mãe que Deus me levou!

Peço-te, de mãos erguidas:

Deita um sorriso, cá abaixo,

– Mas que seja às escondidas…

2. O espírito de serviço e a vontade de servir deveriam ser uma constante na vida de cada um de nós.

Deus é o grande servidor, e a prática do serviço foi um grande testemunho que, durante a sua vida na terra, Jesus nos deu.

Serve-se manipulando o ouro como se serve cavando a terra. Serve-se tecendo panos de cozinha ou bordando toalhas de altar.

Não há serviços indignos mas pode haver serviços exercidos de forma indigna.

Todo aquele que procura ser útil nada mais faz senão servir.

3. Por muito dotados que sejamos, todos precisamos de alguém, e esse alguém é um ser humano como nós. É uma pessoa. É, como nós, uma criatura de Deus, vocacionada para viver como sua filha.

Quem serve, por mais modesto que seja o serviço prestado, tem a sua dignidade, que em todas as circunstâncias deve ser reconhecida e respeitada.

Quem serve tem as suas limitações, como as tem quem, de qualquer forma, é servido. Também pode ter noites mal dormidas. Também pode sofrer de dores de dentes. Também tem as suas preocupações.

Por isso mesmo, quem serve tem o direito à compreensão de quem é servido. Também precisa de uns momentos de atenção, de uma palavra de estímulo, de um gesto de amizade.

4. Dói-me verificar a forma como, às vezes, os de cima tratam os de baixo. A arrogância e a sobranceria com que lhes falam. As manifestações de menosprezo. As exigências injustificadas e descabidas que lhes fazem. A facilidade com que os responsabilizam por culpas que, na realidade, não têm.

5. Faz falta quem sirva. Ai de nós, se deixam de nos prestar serviços essenciais de que carecemos.

Faz falta saber servir. No momento próprio. Com perfeição.

Mas também faz falta saber ser servido. Reconhecer o trabalho dos outros. Agradecer a sua disponibilidade e o seu cuidado.

E a paga, traduzida em euros, não dispensa quem foi servido de manifestar a sua gratidão a quem o serve.

A humildade é uma virtude a ser praticada por todos: por quem serve e por quem é servido.

 

6. Se é verdade que, olhando para trás, muito se andou, não deixa de ser verdade que, no que toca a relações humanas, em certos casos ainda há muito a caminhar.

Há espíritos emproados que precisam de descer à realidade e de tomar consciência de que todos somos iguais e de que uma mão lava a outra. A interdependência é uma realidade de que urge nos apercebamos. E o facto de se ter uma grande conta bancária ou ocupar um cargo que na escala de valores dos homens – a de Deus é muito diferente – se considera elevado não confere a ninguém o direito de explorar os outros, de abusar dos outros, de ser indelicado para com os outros.

 

Autor: Silva Araújo
DM

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16 fevereiro 2017