A desconfiança ou a repugnância que a alguns suscitou a rápida angariação de uma quantia significativa de dinheiro para recuperar a catedral de Notre-Dame, destruída por um incêndio há poucas semanas, não deixa de ilustrar um certo desdém pelo património histórico, como se a memória colectiva não justificasse investimento e a sua preservação não fosse fonte de benefícios públicos, materiais e imateriais, facilmente identificáveis. É certo que o dinheiro poderá ser usado de um modo mais útil consoante for o interesse de cada proponente ou beneficiário, mas não deixa de ser estranho que entre os que criticam que ele se aplique num empreendimento cultural surjam os mesmos que deploram o escasso investimento na cultura e nos seus ofícios.
O que se gastará na recuperação patrimonial servirá, desde logo, para pagar o salário de trabalhadores, muitos deles artesãos altamente especializados, o que não pode ser desdenhado, mesmo pelos que não pretendem perceber para que serve um monumento ou para que serve a memória. Não é, aliás, por acaso que abundantes historiadores têm lamentado a destruição do passado, considerando-a como uma característica assaz perniciosa para a vida em comum, que fica condenada a instalar-se numa espécie de presente contínuo, que oculta raízes e sonega horizontes. O problema é generalizado e não é de agora.
Um ilustre político e intelectual bracarense, Manuel Monteiro, publicava na Primavera de há setenta anos, num número da revista Viagemdedicado a Braga e ao seu distrito, cerca de uma dezena de páginas sobre “o que de essencial Braga ainda conserva artisticamente do seu esplendor passado”, referindo que “as minguadas sobrevivências mais avultam apesar da opulência que foi destruída ou desbaratada e mais se impõem ao culto de todos os bracarenses que não têm, como deviam ter, uma das cidades de arte da Europa”. O texto “Braga na arte” deplora as barbaridades e gaba o que de qualidade subsistiu.
Entre os que trilharam idêntico caminho que incluía a denúncia e a tentativa de impedir destruições patrimoniais e o estudo e a divulgação do que subsiste, esteve o Senhor Luís Costa. Foi uma das primeiras pessoas que conheci a mais empenhadamente defender a memória da cidade e da região, particularmente no âmbito da Associação para a Defesa, Estudo e Divulgação do Património Cultural e Natural (ASPA). Era uma fonte de conhecimentos inesgotável que partilhava com entusiasmo e generosidade. Quando o jornal Públicofoi fundado e eu fui o seu correspondente em Braga, a ele sempre recorri para obter informações ou esclarecimentos sobre os mais variados assuntos relacionados com o município e a sua História. Mesmo que por vezes lhe tenha dado algum trabalho, sempre pude beneficiar da sua disponibilidade, que se oferecia sempre como uma privilegiada oportunidade para escutar episódios interessantíssimos, ainda que, num ou noutro caso, depois de devidamente salvaguardado que não seriam susceptíveis de irem parar às páginas do jornal.
Além de prontamente ajudar os que, como eu, lhe solicitavam alguma explicação, também escreveu abundantes textos jornalísticos e deixa publicados vários livros que merecem releitura atenta. Na memória de muitos, ficarão as fascinantes visitas guiadas que fazia para divulgar a cidade a quem quer que o solicitasse: alunos e professores, turistas ou participantes em alguma iniciativa realizada em Braga, por exemplo. De diversos modos, cumpriu amavelmente uma espécie de missão, que consistiu em partilhar tudo o que sabia sobre Braga, de que foi sempre um dos mais apaixonados estudiosos.
Destaque
Entre os que trilharam idêntico caminho que incluía a denúncia e a tentativa de impedir destruições patrimoniais e o estudo e a divulgação do que subsiste, esteve o Senhor Luís Costa.
Autor: Eduardo Jorge Madureira Lopes