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O restauro

Sete foram os inquéritos levados a efeito por Joana Marques Vidal e, por isso, classificada de excelente: foi assim no desporto, na alta finança, na política. Foram estes “sete pecados mortais” que os tribunais dirão da sua gravidade. Não nos interessa a questão de recondução ou não recondução, se houve ou não conotação política na sua substituição.

O que verdadeiramente nos interessa, porque diretamente nos diz respeito, é a porta aberta que a ex-procuradora geral da república deixou em todos os leigos nestas questões: a justiça é cega e por isso não vê colarinhos brancos ou de cor.

E esta porta aberta obriga uma continuação sem medos ou recuos, sem pressões ou influências políticas, apenas altaneira e ciente da sua independência que deve continuar a ser apanágio de magistrados ou juízes de direito.

Marques Vidal restaura a exaurida confiança dos portugueses na justiça para todos. E chega ao povo esta sensação. Este legado não é de somenos, antes avulta como uma restauração que nos dá esperança de amparo perante a lei e seus guardiões.

Todos sentimos que, num estado de direito, a justiça é o património da existência duma sociedade moralmente estruturada e é, acima de tudo, o regaço onde nos deitamos sossegados por sabermos que acima da justiça não há nada nem ninguém que a submeta.

Marques Vidal fez isto, e por isso lhe agradecemos principalmente numa época em que Portugal se via cada vez mais avassalado pela corrupção ao mais alto nível e os de baixo olhavam para o cimo da pirâmide e viam-na encoberta pela imunidade e encobrimento dos poderosos. Nem a democracia, nem a liberdade de imprensa falada, escrita ou televisiva, nem as reivindicações de rua ou sindicais conseguiram chegar tão longe neste restauro.

Foi feito sem ruído, a não ser dos atingidos que todos dizem ter a sua consciência tranquila, sem alardes de vingança pessoal ou perseguição partidária, apenas no silêncio do seu gabinete e atenta a denúncias anónimas ou veiculadas pela comunicação social, mandou investigar, inquirir e depois atuar em consonância com a gravidade das provas.

Não inventou casos, não fez inventonas de coisíssima nenhuma, fez o que lhe competia, na serenidade que lhe dá o desempenho das funções em que foi investida há seis anos.

Deveria ser reconduzida quem assim tão bem se portou? Quem aceita recompensa por desempenho cumprido vende-se tardiamente, mas deixa-se comprar. Isso é o que poderia prefigurar uma recondução. A saída limpa é a mais valiosa medalha póstuma.


Autor: Paulo Fafe
DM

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1 outubro 2018