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Já não bastava a palavra «pessoa» remontar ao grego «prósopon», que significa «máscara».
Tal é a acepção que lhe dá Homero na «Odisseia».
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O curioso é que, ainda hoje, os intervenientes numa peça de teatro são denominados «personagens».
Neste caso, o latim «persona» sinalizaria o facto de o actor fazer «soar», através de uma abertura na máscara à volta da boca, o som da personagem que representava.
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À partida, já é difícil mostrar plenamente o que se é e permitir ver cabalmente o que somos.
Agora, temos de usar «máscara» em cima de «máscara», o que exponencia as dificuldades de nos darmos a conhecer.
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É um fenómeno estranho, mas a que nos vamos habituando. A máscara é o que mais nos pode proteger e proteger os outros.
Os tempos de pandemia são uma «escola», onde temos de aprender uma espécie de mundo virado ao avesso.
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Também nunca pensamos que o distanciamento fosse uma via, uma protecção, uma prova de amor.
Somos tributários de uma cultura da proximidade. E a proximidade não é para descartar.
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Há muitas formas de exercer a proximidade sem estar fisicamente perto.
É claro que custa — dói mesmo muito — não poder cumprimentar, estender a mão, abraçar.
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Nesta altura, o distanciamento pode ajudar a poupar-nos a vida. Trata-se de um passo atrás, para que — um dia, querendo Deus — a proximidade possa voltar reforçada, em autenticidade e festa.
Nesta fase, dizem-nos para não «baixarmos a guarda». Qualquer deslize pode ser fatal. E até algum medo — que nunca é boa companhia — pode servir de alerta para que não cometamos uma imprudência perigosa.
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Nunca pensamos vir a aprender o que nos têm ensinado. Eis um «mundo novo», não muito «admirável», mas real e sem direito a contraditório.
É claro que não é agradável ter de medir distâncias e colocarmo-nos suficientemente longe. É, porém, a vida — o primeiro e maior dom de Deus — que está em causa.
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Temos de viver em sentido contrário para — é esta a nossa esperança — voltarmos a celebrar o que sempre mais prezamos e estimamos.
Dizem que não iremos mais voltar ao «normal». O que vínhamos fazendo não era de todo exemplar. Mas continha muitas virtualidades que não podem ser «arrumadas».
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Agora, temos de «salvar a vida». E depois havemos de celebrar a alegria de viver: de estar, de abraçar, de visitar. Deus quer fazer algo novo connosco (cf. Is 43, 19), sem desconfianças, sem confinamentos e distâncias.
Demos, por agora, este «passo atrás», este passo suspenso. O melhor está para vir. Quem sabe se mais perto do que imaginamos?
Autor: Pe. João António Pinheiro Teixeira