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O povo guardião da democracia

De todos os males que afligem os regimes políticos, a corrupção figura no grupo dos piores; e, mormente, pelos malefícios que provoca ao regular e normal funcionamento das instituições, minando-lhes a credibilidade, a confiança e a isenção. Então, por estranho que pareça, a Democracia não escapa a esta maleita social mesmo tendo na sua génese a liberdade, a igualdade e a fraternidade; o que só se justifica pelos desvios a que a natureza humana está sujeita por ausência de caráter, ética e moral e se repercute na ação política e governativa. Na ordem psicológica e moral, a corrupção revela um estado patológico e desconexo da consciência que leva o sujeito livre a exercer o mal e a injustiça; e, deste modo, ele claramente se opõe à ordem da perfeição, da transparência e da graça. Como ilícito que é, a corrupção tem, segundo o Código Penal, uma dupla face: por um lado, o crime do corrompido e, por outro lado, o crime do corruptor; e, assim sendo, se pretende subtrair a função pública à venalidade, promover o rigor das instituições do Estado e criar uma ordem de contramotivação para o mau uso dos deveres fundamentais exercidos pelos cidadãos. Pois bem, integrando o nosso país a cabeça do pelotão dos países mais corruptos do mundo, é tempo de exigir respostas e soluções para esta vergonhosa situação; sobretudo, concluir, fundadamente, como foi possível, em tão curto espaço de tempo, aqui chegarmos e vermos diariamente a hidra a multiplicar as suas sete cabeças sem que surja um Hércules que a abata. Não é difícil ao comum dos mortais, minimamente atentos, independentes e a pensar pela sua própria cabeça, responsabilizar o poder político pela ausência de meios e vontade para combater o flagelo; e, então, quando o fenómeno da corrupção tanto se vulgarizou e generalizou, afetando as estruturas governativas, políticas e económicas do país, caso é para pormos em causa a razão de ser e estar do 25 de Abril de 1974. Assim sendo, somos levados a pensar e concluir que já ninguém pode confiar em ninguém, perdidos que vão sendo os valores da ética, da moral e da justiça social; e, quando tal acontece, apenas nos resta o recurso à violência e à força nas ruas para banir do nosso meio essa praga hedionda da corrupção que assenta no favorecimento ilegítimo, na criminalidade ligada à influência pública e na confusão entre interesses privados e interesses públicos. Mas, em Democracia, será lícito o recurso à violência e à força nas ruas? Penso que não, pois o papel de garante do normal funcionamento das instituições, nestas circunstâncias, cabe às Forças Armadas; só que as Forças Armadas, entregando ao povo o direito de escolher e decidir do seu destino, não se reveem já no dever patriótico de pegar em armas em defesa da liberdade e da justiça social. Então, não há mesmo nada a fazer? Há, claro que há. Por exemplo, entendo que o Presidente da República como Comandante Supremo das Forças Armadas e garante do regular funcionamento das instituições democráticas, pode ativar os meios necessários para reposição da legalidade e normalidade democráticas; todavia, se mesmo assim tal não for possível, perante a ameaça do totalitarismo e da repressão, as Forças Armadas devem colocar-se ao lado do povo para defesa dos princípios fundamentais da Constituição e, consequentemente da Democracia. Agora, não podendo a corrupção ser uma inevitalidade do nosso sistema político e não nos podendo nós conformar com a descrença e desconfiança que se vai instalando no sistema político, governativo e económico, só o povo tem consigo a única arma – o voto – que, em paz, pode inverter esta escabrosa situação, nem que seja o recurso ao voto branco que tem sempre a leitura do protesto, da contestação e do desprezo; e que, assim, ele se investe e revê no papel legítimo de guardião de Democracia. E isto para evitar que as ruas se transformem no palco da contestação e do repúdio, quando já esgotados estão os meios legais de repor a normalidade; e, neste particular, a nossa história está repleta de exemplos, nobres exemplos, em que o povo teve de sair à rua para lutar pelos seus direitos e defender a honra da Pátria. Então, até de hoje a oito.
Autor: Dinis Salgado
DM

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23 maio 2018