«As lâmpadas economizadoras de energia causam cancro». Portanto, para Trump há que explorar ao máximo a extração de petróleo do xisto nos EUA. Para isso, Trump nomeou para secretário de Estado Rex Tillerson (ex-CEO da ExxonMobil). Qualquer dia poderá impedir a vacinação, fazendo regredir muitas décadas a saúde pública, porque, diz: «as vacinas causam autismo».
Para Trump não há factos nem verdades, mas sim os factos dele e as verdades dele, o que alguns chamam “factos alternativos” e “pós-verdade”. Quando há funcionários mais instruídos e honestos que resistem, são demitidos de imediato. Algumas agências federais, que lidam com questões ambientais, ou, mais geralmente, de ciência e tecnologia, estão já a ser amordaçadas ao verem-se impedidas de publicar documentos sobre o clima sem autorização superior.
E as contradições de Trump continuam: sete Estados do país já aprovaram leis que permitem a produção e venda de Cannabis, droga que dizem para fins medicinais, mas que causa viciação grave, na afirmação de Walter Osswald, catedrático de Farmacologia e Terapêutica da Faculdade de Medicina da U.P. Ao mesmo tempo, Trump cria um muro entre os EUA e o México para impedir a entrada de mexicanos com ou sem drogas. A irracionalidade da atual Casa Branca pode ter efeitos globais catastróficos. Na Europa, berço antigo da filosofia e da ciência, também a razão está a perder-se.
O negacionismo não é novo e à volta dele estão interesses materiais de grandes multinacionais (as companhias petrolíferas têm pago rios de dinheiro a cientistas com cartaz para negarem o efeito de estufa dos gases produzidos na queima de combustíveis; as produtoras de tabaco têm pago outro tanto a médicos de topo para negarem que fumar provoca cancro; etc., etc.). Estão de volta idealismos ou ideias fixas extremistas: os neo-nazis dizem que o Holocausto é um “mito” e um político iraniano de topo disse o mesmo há cerca de um ano. Note-se que também neste caso os negacionistas precisam da colaboração dos meios de comunicação social: Os soviéticos ocuparam o campo de concentração de Auschwitz em janeiro de 1945. O Pravda (“A Verdade” em russo) só em 1 de fevereiro apresentou Auschwitz pela boca de um “prisioneiro”.
E o principal repórter oficial do Pravda, o judeu Boris Palevol, assegurava que a principal forma de matar os judeus nesse campo era descargas elétricas. Repare-se nas “técnicas” usadas na URSS para difundir a sua “verdade”, já contida no nome do jornal único para todo o território: escolhe-se um judeu para apresentar o campo de concentração onde foram mortos milhões de judeus e escolhe-se um “repórter” judeu para noticiar como se matava em Auschwitz. Estas eram também as técnicas usadas por Joseph Goebbels, ministro da propaganda nazi para justificar todas as ações do Hitler. Hoje, Trump e o seu grupo tentam, mas não conseguem fazer coisa semelhante com a imprensa dos EUA. Por isso, todos os dias Trump vomita fogo sobre ela.
E não tardará em criar uma imprensa própria para difundir as suas “verdades alternativas”. O egocentrismo boçal e alucinado de Trump não lhe permite perceber a diferença entre a realidade dos factos e os “factos alternativos” em que assenta a sua visão da América e do mundo. Nós, na Europa e no mundo, não nos podemos render à cegueira negacionista dos que rasuram as proclamações extremistas, xenófobas e autoritárias de Trump. Há um filme visionário de Stanley Kubrick, em que a demência de um cientista influente no poder americano precipita o mundo numa guerra termonuclear (com Trump a carregar nos códigos secretos poderá desencadeá-la?).
Destruindo os acordos que Obama fez com muita paciência, Trump faz ao Irão e à China, ambos possuindo a bomba atómica, ameaças que não se sabe o que irão trazer. Ironicamente, deixa agora entrar pessoas vindas da Arábia Saudita, de onde vieram os terroristas do 11 de setembro, quando proíbe de entrarem as que vêm de outros sete países muçulmanos. Trump já se apresentou como um cruzado do “Brexit” e da desconstrução da União Europeia, identificando-se com as posições eurocéticas e o extremismo da direita na Europa.
Sim, na Europa pairam ameaças de desordem, caos e desagregação. Em França, onde o candidato da direita e provável vencedor das próximas presidenciais, François Fillon, faz gala das suas simpatias putinistas, cortejado pelos movimentos populistas e da extrema direita, como a Frente Nacional – que tem recebido ajuda financeira de Moscovo – Putin capitalizando. O impensável há um ano pode vir a acontecer: Le Pen ganhar em França, Geert Wilders ganhar na Holanda e o partido xenófobo AfD alcançar um grande resultado nas eleições alemãs. Sem um mandato político pessoal, Theresa May agarrou-se ao resultado do referendo e anda há seis meses a repetir que o “Brexit” significa “Brexit”. Para impedir a imigração, quer sair do mercado único. E em relação aos trabalhadores estrangeiros no Reino Unido já se usam insultos xenófobos.
Em Portugal, até agora as “trumpalhadas” só têm tido o efeito de facilitar as exigências utópicas do PCP e BE a rabo do PS: «mais e maiores salários e menos horas de trabalho» (só para os que eles consideram “trabalhadores”. Os empresários não são trabalhadores. Os docentes universitários não são trabalhadores, só os do Ensino B+S, acorrentados à FENPROF).
Autor: Júlio Barreiros Martins