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O perigo de se “brincar às independências”

1.Persiste o perigo do descabido separatismo catalão). Já em 4-11-2014, no artigo “Muitas Catalunhas e muitas Escócias”, reprovava eu aqui, nas páginas do DM, as propostas traiçoeiras contra dois países da minha alta consideração, a Espanha e a Grã-Bretanha. Propostas essas que consistiam na inaudita separação de partes fundamentais dos seus 2 povos e territórios históricos: a Catalunha e a Escócia. Mais recentemente, e no mesmo sentido, recorde-se a metódica argumentação expendida no nosso recente trabalho “Catalunha e a lição dos feixes da Roma antiga”, de 19-9-2017. Entretanto, a situação evoluiu: o Governo de Espanha suspendeu (art.º 155 da Constituição) a Autonomia da Catalunha e demitiu o seu governo, o qual neste momento chama a tribunal por sedição (traição) e desvio de fundos. O ex-presidente Puigdemont fugiu para a Bélgica, negou a legitimidade e a “isenção” dos tribunais espanhóis neste caso, recorreu das acusações e mantém-se em liberdade (se não regressar a Espanha, claro). E na Catalunha, finalmente, aconteceram manifestações também, mas daquela metade do povo a quem nem passa pela cabeça separar-se do resto de Espanha. 2. As empresas fogem e a divisão entre catalães instala-se). Achavam alguns catalães que contribuiam em excesso para o orçamento do Estado espanhol e que queriam ficar mais ricos. Porém, até ao momento, nem a CE nem qualquer país reconheceu a já declarada pseudo-independência; e as grandes empresas (e os bancos) trataram foi de tirar as suas sedes para fora da Catalunha, prevenindo anunciados desastres financeiros. Até porque uma Catalunha separada de Espanha ficaria fora do Euro e teria de criar uma moeda nova, a qual ficaria com a cotação de algum “dólar tibetano” ou “libra catanguesa”. Por outro lado, a divisão dentro das famílias e o ódio nascente entre antigos amigos já lembra o que aconteceu por décadas no Portugal sequente a Abril de 74… 3. Em Espanha só há uma Nação, a espanhola). Há uma Nação e muitas regiões (muitas delas com as suas “comunidades” ou “povos”, razoavelmente diferenciáveis uns dos outros, do ponto de vista cultural e às vezes linguístico, apenas isso). Até há poucos anos atrás, ninguém com cultura falava de uma “nação catalã”. É que não se pode pertencer a duas nações ao mesmo tempo, no caso, a catalã e a espanhola. 4. Que têm os catalães a mais que os bascos ou os galegos?). Se a Espanha “deixasse fugir” a Catalunha, que legitimidade teria para segurar a Galiza (tão ligada aliás ao Norte de Portugal…); ou o “País Basco” (Euskadi, Navarra e La Rioja); ou as distantes Canárias (lá junto ao sul de Marrocos). Os bascos, p. ex., andaram por décadas em dura luta armada, chegando ao desplante de, em 1973, assassinar à bomba o 1.º ministro espanhol Carrero Blanco, numa explosão que atirou o seu carro para cima de prédios de andares… Depois daquelas regiões, decerto fugiriam as Baleares; ou os Valencianos (parecidos com os catalães); ou os Murcianos; ou os Aragoneses; ou os Andaluzes (que lá para o extremo-sul voltavam decerto a convidar os Mouros a invadir-nos, como foi em 711…). O Estado espanhol desapareceria como a poeira. 5. E então, por essa Europa fora…). Portugal arriscava perder Açores, Madeira e Algarve; e decerto o Porto, de Aveiro para norte ia separar-se de Lisboa. A Bélgica dividia-se entre Flandres (germânica) e Valónia (francófona). A França perdia (e bem) a Córsega para a Itália. A Itália perdia o Trentino-Alto Ádige para a Áustria. A Suíça partia-se em quatro. A Alemanha recuperava a Holanda, Flandres, Áustria e parte da Suíça (perdidas todas em 1648, no fim da Guerra dos 30 anos). A Transilvânia romena podia regressar à Hungria. A Bósnia (como devia) seria partilhada por Sérbia e Croácia. A Escócia e Gales despediam-se da Inglaterra. A Suécia perdia a Lapónia. A Alsácia e parte da Lorena regressavam à sua duvidosa “pátria” trans-renana. E por aí fora. Eis a “caixinha de Pandora” catalã… 6. O 5.º Beatle e o visigodo pensativo). Uma parelha bem engraçada formam contudo Carles Puigdemont (cujo apelido quer dizer “pico, ou alto do monte”) e o seu “vice” Oriol (ou Aurélio) Junqueras. O 1.º tem uma densa franja que lembra os Beatles, no seu início. O 2.º, alto, gordo, barbudo, vagamente estrábico e sempre a olhar para o ar, lembra algum esquecido filósofo visigodo. Recordemos, aliás que foi no tempo dos Godos que a costa até Marselha (a Septimania) continuou por décadas, “espanhola”. 7. “Una, grande y libre”). Os Pirineus são, desde a Pré-História, a indiscutida fronteira natural da Espanha. Dadas as afinidades linguísticas com o provençal (o velho idioma do sul de França), logo uma separação da Catalunha iria gerar ambições aos franceses sobre território espanhol (já aconteceu várias vezes…). Daí que aquela bela inscrição “una, grande, libre” no emblema da águia negra da bandeira franquista possa (e deva) ser aqui relembrada a pessoas com menos reflexão e cultura geral… Assim, num hipotético referendo sobre a separação da Catalunha, têm de ter voto todos os interessados, i. e., todos os espanhóis.
Autor: Eduardo Tomás Alves
DM

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14 novembro 2017