Muitas pessoas referem dores de cabeça ao fim-de-semana.
Deram-nos o fim de semana para descansar. Aos fins de semana sentimo-nos portanto obrigados a descansar. Claro! Quase todos concordariam que se o vizinho que fosse trabalhar para o escritório ao domingo, ou o operário que fosse para a fábrica nas horas vagas – quase todos concordariam, repito que ambos não estariam muito «normais». Portanto para sermos”normais” é seremos obrigados a descansar, obrigados a distrair, obrigados a arejar.
Parece-me que nos repetem que temos a liberdade de escolher como ocupar os nossos tempos livres. A publicidade manda-nos ao cinema, ao teatro, ver museus, ir à opera, ir apanhar ar ao campo e à praia.
A utilização de tantos e tão variados divertimentos ao nosso dispor obriga-nos a escolher, ao menos, um deles. Pelo nosso gosto pessoal?
Bem, coloca-se a questão do dinheiro que podemos gastar com o lazer. Até andar a pé custa solas aos sapatos e os sapatos têm preço. Claro, que podemos escolher. Podemos escolher não ir! Não vamos!
Problema é que na 2.ª feira vamos dizer o quê, aos amigos e conhecidos? Afinal temos o precioso tempo livre. Aproveitamos? Vamos ou não fomos?
Dizem-nos então que o ar do campo dá viço, que não é poluído? Embora, para o campo! Ou então para a beira-mar.
No carro, no autocarro, no comboio. É duro chegar ao campo ou à praia. Bichas no carro, empurrões no autocarro. Não sei porque é que visualizo, logo a seguir, um cházinho morno, uma bica em pé, num balcão rasca, um olhar de saloio ao hotel de cinco estrelas quando as biqueiras dos sapatos enfiam na pastelaria popular e barulhenta. Coisas de minha imaginação!
–Pai, posso comer outro bolo?
–Mãe, ao intervalo dás-me um chocolate?
–Apetecia-me umas papas de sarrabulho e uns rojões!!
Pelos olhos passam números e a máquina calculadora soma despesas mentalmente.
Já fui, já vim. Tenho a impressão de ter sido atirado para a frente. No campo está frio, na beira-mar estava vento. O filme não era dos que eu gosto, mas era o que havia no cinema do meu bairro. As montras do centro comercial estavam cheias dos meus desejos e ficaram-me os olhos naquele vestido, naquele brinquedo, naquela motorizada, Ficaram-me lá os olhos!
Será por isso que me dói a cabeça?
Onde está a minha liberdade?A liberdade de escolher.
Com tantos conselhos que me dão será que eu tenho tempo para pensar no que é que eu realmente gosto? Do que é que eu gosto? Do que é que eu gosto?
Stop! Quem é que eu sou? De onde vim? Para onde vou?
*«O Ócio neurótico» de Román Gubern
Autor: Beatriz Lamas Oliveira